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Práticas de governança e desenvolvimento dos mercados acionários

 

Governance practices and development level of stock markets

 

Antônio André Cunha Callado1 e Adilson Celestino de Lima2

1 Universidade Federal de Pernambuco, Brasil, Doutorado em Administração, e-mail: andrecallado@yahoo.com.br

2 Universidade Federal de Pernambuco, Brasil, Doutorado em Administração, e-mail: celestinolima@yahoo.com.br

 

Recebido em: 02/02/2018 - Revisado em: 15/03/2018 - Aprovado em: 05/04/2018 - Disponível em: 01/07/2018

Resumo

Governança pode ser definida como um conjunto de mecanismos ou sistemas legais e institucionais voltados para o monitoramento das ações realizadas por parte dos gestores e/ou acionistas controladores com relação aos interesses de acionistas minoritários. O objetivo deste artigo foi investigar aspectos inerentes às práticas de governança em mercados acionários internacionais em busca de características que possuam distinções estatisticamente significativas a partir de seus respectivos níveis de desenvolvimento. Para a realização do estudo, foram investigados 6 mecanismos de proteção aos acionistas, 4 instrumentos institucionais de proteção aos credores e 5 características financeiras operacionais referentes a 48 mercados. Os resultados revelam evidências significativas em seis aspectos, dois oriundos de cada um dos grupos testados, não se podendo assumir a diferença para os demais aspectos testados, destacando entre estes últimos a concentração de mercado e o número de ações negociadas, duas características das clássicas esperadas de um mercado acionário desenvolvido.

Palavras chaves: Mercados acionários. Nível de Desenvolvimento. Finanças.

Abstract

Governance can be defined as a set of mechanisms as well as legal and institutional systems aimed at monitoring the actions taken by managers and / or controlling shareholders with respect to the interests of minority shareholders. The aim of this paper was to investigate aspects of the governance practices in international equity markets in search features that have statistically significant distinctions from their respective levels of development. For the study, 6 protection mechanisms to shareholders, 4 institutional instruments for the protection of creditors and 5 operational financial characteristics pertaining to 48 markets were investigated. The results show significant evidence, two coming from each of the test groups not being able to take the difference for the other tested aspects, highlighting between them market concentration and the number of shares traded, two characteristics of the classical expected of a developed stock market.

Keywords: Stock markets. Development level. Finance.

1. INTRODUÇÃO

 

O conceito de governança corporativa apresentado por Sheifer e Vishny (1997) enfatiza os aspectos financeiros. Eles definem governança corporativa como o conjunto de mecanismos pelos quais os provedores de recursos seriam assegurados para obter o retorno esperado de seus investimentos. Governança é um conjunto de mecanismos que protegem os investidores de serem expropriados, seja por gestores ou acionistas controladores (La Porta et al., 2000). A governança corporativa é caracterizada por Siffert Filho (1998) no que diz respeito aos sistemas de monitorização estabelecidos pelos acionistas controladores de uma empresa, ou corporação particular, para que os gestores tomem decisões sobre a alocação de recursos de acordo com o interesse dos acionistas. A Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico apresenta uma definição bastante abrangente acerca de governança (OCDE, 1999), na quale la é apresentada como um sistema pelo qual as empresas são dirigidas e controladas.

De acordo com Lethbridge (1997), a estrutura de governança especifica a atribuição de direitos e responsabilidades entre os diferentes participantes, tais como diretores e acionistas, bem como de outros stakeholders, como também detalha regras e procedimentos para a tomada de decisão sobre diversos assuntos, não só fornecendo um quadro que ilustra como os objetivos da empresa são definidos, mas também os meios para atingir esses objetivos e o monitoramento do desempenho.

O Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC) afirma que governança é o sistema pelo qual as sociedades são dirigidas e monitoradas, envolvendo os relacionamentos entre acionistas, conselho de administração, diretoria, auditoria independente e conselho fiscal (IBGC, 2004) e que as boas práticas de governança corporativa têm a intenção de aumentar o valor da sociedade, facilitar seu acesso ao capital e contribuir para a sua perenidade.

Em geral, o termo governança é utilizado para descrever as questões relacionadas com o poder de controle e direção de uma empresa, bem como as diferentes formas pelas quais as ações e atividades importantes para as empresas. No mercado de capitais, as dimensões de governança abrangem aspectos associados à transparência, igualdade de tratamento dos acionistas e prestação de contas.

Do ponto de vista da proteção jurídica oferecida, principalmente para os investidores, Shleifer e Vishny (1997) afirmam que Estados Unidos, Alemanha, Japão e Reino Unido têm os melhores sistemas de do mundo e que, nos países que têm mercados menos desenvolvidos, os mecanismos de governança tendem a serem mais frágeis devido à estrutura gerencial das empresas que são negociados publicamente, bem como não possuírem normas específicas que possam vir a fornecer uma proteção eficaz para acionistas minoritários. Vale ressaltar que, ao longo dos últimos anos, práticas de governança têm sido investigadas com o foco em empresas que possuem ações negociadas publicamente. Alguns estudos têm tentado identificar os fatores determinantes da governança entre as empresas, bem com a influência que a qualidade dessas práticas sobre o desempenho (KLAPPLER E LOVE: 2002; CARVALHAL-DA-SIVA E LEAL, 2005; PRETO, JANG, E KIM, 2003; SILVEIRA, 2004).

Klapper e Love (2002) utilizaram uma classificação proposta pelo Credit Lyonnais Securities Asia (CLSA) para obter o índice de governança de 14 países em desenvolvimento e encontrou uma relação positiva e significativa entre o desempenho dos países e governança corporativa. Srour (2002) analisaram os períodos em que os mercados de ações sofram consequências de crises financeiras internacionais, tais como a crise asiática, e o ataque de 11 de Setembro. Os resultados indicaram que as ações de empresas que aplicaram práticas de governança corporativa foram mais bem apreciada. Preto, Jang e Kim (2003) também encontraram evidências de que indicam a presença de relações significativas entre as melhores práticas de governança corporativa e melhores avaliações em bolsa de valores coreana através do desenvolvimento de um índice de governança corporativa através do uso de questões objetivas como uma proxy para avaliar a governança. Os resultados mostraram uma relação de causalidade significativa, onde um aumento de 10 pontos no índice deve promover um aumento de 19,4 por cento sobre o valor das empresas testadas.

Alguns estudos considerando o mercado acionário brasileiro têm sido conduzidos para examinar a relação entre práticas de governança e desempenho corporativo. Carvalhal-da-Silva e Leal (2005) investigaram os efeitos da qualidade das práticas de governança corporativa sobre o valor das empresas brasileiras de capital aberto listadas na BM&FBovespa em 1998, 2000 e 2002. Usando um índice de governança corporativa, os resultados indicaram uma relação positiva significativa entre o valor de mercado e a qualidade das práticas de governança corporativa.

Ao considerar que o status de desenvolvimento e as características estruturais dos diversos mercados acionários são diferentes entre si e que podem estar relacionadas a distintos níveis de eficiência, a identificação de aspectos que sejam capazes de ilustrar estas diferenças pode prover uma contribuição significativa para aprimorar as abordagens metodológicas de investigação empírica sobre a HEM.

Outro aspecto relevante a ser considerado sobre o status de desenvolvimento dos diversos mercados acionários. Pouca (ou quase nenhuma) atenção tem sido dada à análise das semelhanças e diferenças estruturais dos diversos mercados acionários existentes ao redor do mundo, embora eles não sejam iguais entre si (não têm o mesmo número de participantes, não movimentam o mesmo volume de recursos financeiros, não possuem o mesmo número de ações negociadas, não possuem custos de transação de mesmo patamar, etc). Enquanto alguns possuem o status de mercados acionários desenvolvidos, outros ainda são considerados como mercados não desenvolvidos. Tais investigações têm se concentrado nos mercados acionários desenvolvidos. Evidências empíricas referentes à análise da eficiência de mercados acionários não desenvolvidos ainda são encontradas em menor quantidade. Referências sobre as características inerentes aos mercados acionários não desenvolvidos podem ser encontradas em Muradoglu, Taskin e Bigan (2000), Wong, Cheung e Wu (2000) e Verma (2005). Para estes autores, o comportamento dos retornos nos mercados não desenvolvidos tende a ser diferente em comparação aos mercados desenvolvidos, uma vez que eles são menos organizados e possuidores de um menor número de participantes.

Muradoglu, Taskin e Bigan (2000) ressaltam que, ao se investigar as características internas dos mercados acionários não desenvolvidos, há uma expectativa de que padrões e aspectos comuns possam ser encontrados e que tais padrões podem ser considerados como fatores condicionantes da eficiência de mercado. Além disso, a literatura não apresenta uma caracterização clara sobre aspectos descritivos internos e externos inerentes ao comportamento das séries históricas dos retornos das ações, nem de suas implicações sobre a eficiência de mercado a partir de sua estrutura. Isto pode ser evidenciado através da universalização do uso dos modelos de precificação concebidos a partir da noção de equilíbrio de mercado. O objetivo deste artigo foi investigar aspectos inerentes às práticas de governança em mercados acionários internacionais em busca de características que possuam distinções estatisticamente significativas a partir de seus respectivos níveis de desenvolvimento.

 

2. REFERENCIAL TEÓRICO

 

A Hipótese da Eficiência de Mercado (HEM) é certamente uma das vertentes investigativas mais relevantes para a moderna teoria das finanças. Sua investigação tem sido impulsionada tanto por suas perspectivas teóricas quanto por suas aplicações práticas. A relevância teórica dos estudos sobre a eficiência de mercado está relacionada ao entendimento do comportamento dos mercados acionários, bem como aos seus desdobramentos gerados a partir da ampliação do escopo de investigação da área de finanças.

No âmbito da HEM, há uma expectativa teórica de que um mercado acionário desenvolvido seja descentralizado, amplo, com elevado número de participantes e que possua um significativo volume de negócios diários, enquanto os mercados acionários não desenvolvidos tendem a possuir características próprias de seu status.

Na literatura podem ser encontradas diversas referências a uma tipologia e a um conjunto de características associadas aos níveis de desenvolvimento dos mercados acionários, a saber: Mercados acionários desenvolvidos; Mercados acionários não desenvolvidos.Os mercados acionários desenvolvidos são apresentados por Gu (2004) como sendo mais eficientes e menos voláteis do que os mercados não desenvolvidos, destacando que a identificação de parâmetros que sinalizem a maneira pela qual um mercado esteja se tornando mais eficiente é um questionamento de relevância significativa como tópico a ser investigado.

Na medida em que um mercado se distancia das características atribuídas aos mercados desenvolvidos, cresce a expectativa de que ele seja menos eficiente. Em Wong, Cheung e Wu (2000) também são encontrados argumentos favoráveis à expectativa de que os mercados acionários não desenvolvidos sejam menos eficientes em comparação aos mercados desenvolvidos.

A influência das estruturas dos mercados acionários desenvolvidos e não desenvolvidos sobre o comportamento dos retornos das ações é apresentada por Kwon, Shin e Bacon (1997) e Muradoglu, Taskin e Bigan (2000) como um elemento relevante a ser considerado, uma vez que, possuindo estruturas diferentes entre si, os movimentos dos preços das ações tendem a apresentar comportamentos diferentes.

As características relacionadas aos mercados acionários desenvolvidos são apresentadas por Chen, Firth e Rui (2001), a saber: Grande porte; Diversificado e com muitos participantes; Bem estabelecido institucionalmente; Bem regulado e fiscalizado; Dispõe de dados suficientes para ser testado. Os mercados acionários da Alemanha, Austrália, Áustria, Bélgica, Canadá, Cingapura, Dinamarca, Espanha, Estados Unidos, Finlândia, França, Inglaterra, Irlanda, Holanda, Hong Kong, Islândia, Itália, Japão, Luxemburgo, Noruega, Nova Zelândia, Suécia e Suíça, por exemplo, são classificados como mercados acionários desenvolvidos (IFC, 2007;Standard & Poor’s, 2008).

As características intrínsecas aos mercados acionários não desenvolvidos são comentadas por Akinkugbe (2005) como fatores relacionados à eficiência. Para este autor, estes mercados acionários tendem a operar de maneira menos eficiente e possuem o seguinte perfil: Possuem um restrito escopo de investidores; São superficiais; Possuem altos custos de transação.

Muradoglu, Taskin e Bigan (2000) e Doong, Yang e Wang (2005) apontam o perfil de um mercado acionário não desenvolvido a partir da definição estabelecida pela International Finance Corporation (IFC), que é composto pelas seguintes características: Significativa influência da ação do governo sobre a atividade econômica; Mercados acionários estabelecidos há pouco tempo; Mercados pequenos que não possuem investidores em grande quantidade; Baixo volume financeiro negociado; Informações contábeis são consideradas como sendo de baixa confiabilidade; Informações referentes às empresas nem sempre são imediatamente disseminadas ou são de boa qualidade; O mercado financeiro possui um escopo de atuação limitado como fonte de financiamento.

Estas características sugerem que o nível de desenvolvimento de um mercado acionário esteja relacionado a aspectos estruturais e operacionais deste mesmo mercado. Um dos principais aspectos se refere às limitações das bases de dados de mercados não desenvolvidos. Mercados que possuem limitado grupo de investidores e são superficiais talvez não sejam capazes de prover séries de dados suficientes para serem testados. Os mercados acionários da África do Sul, Arábia Saudita, Argentina, Bahrain, Brasil, Chile, China, Colômbia, Coréia do Sul, Egito, Emirados Árabes, Eslováquia, Filipinas, Grécia, Hungria, Índia, Indonésia, Israel, Jordânia, Kuwait, Malásia, Marrocos, México, Nigéria, Oman, Paquistão, Peru, Polônia, Portugal, Qatar, República Tcheca, Rússia, Srilanka, Tailândia, Taiwan, Turquia, Venezuela e Zimbábue, por exemplo, são classificados como mercados não desenvolvidos (IFC, 2007; Standard & Poor’s, 2008).

Outro fator relevante é o nível dos custos de transação. Se os custos de transação se elevam na medida em que diminui o nível de desenvolvimento de um mercado acionário (principalmente considerando os tributos, as taxas de administração e as taxas de corretagem), as possibilidades de obtenção de ganhos extraordinários a partir de estratégias de investimento também devem diminuir.

Outro aspecto relevante encontrado na literatura a ser considerado consiste na natureza das investigações empíricas conduzidas para investigar a eficiência dos mercados acionários não desenvolvidos. De acordo com Muradoglu, Taskin e Bigan (2000), esta modalidade de investigação tem sido usualmente realizada sob o formato de estudos por países. Predominantemente, estas investigações têm sido operacionalizadas considerando índices das bolsas de valores ou carteiras selecionadas de ações. Robinson (2005) ressalta que as evidências conflitantes sobre a eficiência encontradas em investigações realizadas no âmbito dos mercados acionários não desenvolvidos demonstram que ainda há a necessidade de investigações sobre esta questão.

Atualmente, a literatura ainda não apresenta critérios claros e amplamente aceitos que sejam capazes de distinguir os mercados desenvolvidos dos mercados não desenvolvidos, ou até mesmo que possa tipificar estágios intermediários de desenvolvimento. Este pressuposto é relevante e pode ser o ponto de partida para investigações empíricas direcionadas para comparar as características das séries dos retornos das ações negociadas em mercados acionários desenvolvidos e mercados não desenvolvidos, uma vez que a identificação das características específicas inerentes aos diversos estágios de desenvolvimento dos mercados acionários poderá gerar informações relevantes que auxiliem a compreensão de seu funcionamento.

 

3. PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS

 

Para a operacionalização da pesquisa referente à busca por especificidades inerentes ao status de desenvolvimento dos mercados acionários, primeiramente foi necessário definir o grupo de variáveis a serem analisadas, bem como o elenco de mercados acionários a serem investigadas. Foram analisadas 15 (quinze) variáveis, subdivididas em três grupos distintos, a saber:

Mecanismos de proteção aos acionistas;

Instrumentos institucionais de proteção aos credores;

Características financeiras operacionais dos mercados.

A relação dos direitos dos acionistas investigados foi a seguinte (LA PORTA; LOPEZ-DE-SILANES: 1998); Permissão do uso de procuração pelo correio para representação (nominal dicotômica); Não bloqueio de ações antes de assembleias (nominal dicotômica); Permissão para uso de representação profissional (nominal dicotômica); Cláusula de proteção à minorias (nominal dicotômica); Direito de subscrever novas ações (nominal dicotômica); Capital requerido para convocar assembleia extraordinária (numérica);

A lista dos instrumentos institucionais de proteção aos credores investigados foram os seguintes (LA PORTA; LOPEZ-DE-SILANES: 1998); Cerceamento do direito à empresa de reter ativos quando em concordata (nominal dicotômica); Senioridade dos credores segurados em caso de falência (nominal dicotômica); Restrições para entrar em concordata (nominal dicotômica); Interventor em caso de concordata (nominal dicotômica);

O conjunto de características financeiras operacionais dos mercados investigadas foram as seguintes (MENDONÇA DE BARROS: 2000): Capitalização bursátil (numérica); Concentração de mercado (numérica); Valor transacionado sobre o PIB (numérica); Turnover (numérica); Número de empresas listadas (numérica).

Com relação aos mercados, foi considerada a seguinte lista (MENDONÇA DE BARROS: 2000): África do Sul, Alemanha, Argentina, Áustria, Bélgica, Brasil, Canadá, Cingapura, Chile, Colômbia, Coréia do Sul, Dinamarca, Egito, Equador, Espanha, Estados Unidos, Filipinas, Finlândia, França, Grécia, Holanda, Hong Kong, Índia, Indonésia, Irlanda, Israel, Itália, Japão, Jordânia, Malásia, México, Nigéria, Noruega, Nova Zelândia, Paquistão, Peru, Portugal, Quênia, Reino Unido, Sri Lanka, Suécia, Suíça, Tailândia, Taiwan, Turquia, Uruguai, Venezuela e Zimbabwe.

As variáveis referentes ao status de desenvolvimento dos mercados aos mecanismos de proteção aos acionistas e os instrumentos institucionais de proteção aos credores (excetuando o último), assumiram característica nominal binária. As demais assumiram a forma numérica contínua.

Dadas as circunstâncias metodológicas acerca das amostras da pesquisa, foram utilizados testes não paramétricos para a realização desta tarefa. Sobre estes testes, Bisquerra, Sarriera e Martinez (2004) apontam que a estatística não-paramétrica é definida como sendo o conjunto de provas que se aplicam sem necessidade de fazer qualquer tipo de suposições sobre as distribuições ou origem das variáveis que estão sendo estudadas. Para testar a significância estatística das distinções das características dos mercados em função de seu status de desenvolvimento, foram utilizadas duas técnicas distintas: A Prova Exata de Fisher; O Teste U de Mann-Whitney. Sobre a prova Exata de Fisher, Levin (1987) destaca que ela permite resolver o problema de significância, quando a amostra não possui distribuição normal das variáveis investigadas, e desta forma, não fornece ao pesquisador os parâmetros paramétricos clássicos, tais como: medidas centrais e de variância. O nível de significância considerado como aceitável foi de 95% (p=0,05). Todos os procedimentos foram realizados através do auxílio do aplicativo estatístico STATISTICA for Windows.

 

4. RESULTADOS

 

Inicialmente foi testada a significância estatística das relações entre o status de desenvolvimento dos mercados acionários e os mecanismos de proteção aos acionistas, bem como os instrumentos institucionais de proteção aos credores que possuem característica binária. Os resultados estão apresentados na tabela 1.

Apenas três das variáveis binárias testadas se mostraram relacionadas ao status de desenvolvimento (representação via correio, senioridade dos credores em caso de falência e a expectativa de intervenção em caso de concordata).

 

Tabela 1 - Significância das relações entre o status de desenvolvimento e as variáveis binárias analisadas.

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Fonte: Elaborado pelos autores

 

Para dar maior visibilidade à características das relações foram utilizadas distribuições conjuntas condicionais de frequência representadas por tabulações cruzadas (crosstabulation). Primeiramente será apresentada a distribuição conjunta referente às relações entre o status de desenvolvimento e a representação acionária via correio na tabela 2.

A partir dos resultados obtidos pode-se observar que, no geral, este instrumento é pouco utilizado. Apenas 17% dos mercados acionários investigados o utiliza. Particularmente, a quase totalidade dos mercados categorizados como não desenvolvidos não permitem a representação via correio, enquanto esta prática é encontrada em aproximadamente um terço dos mercados assumidos como desenvolvidos. Este achado é compatível com a expectativa teórica referente à superior maturidade institucional dos mercados desenvolvidos, em comparação aos mercados não desenvolvidos, desenhada pelo uso de instrumentos formais e regulamentado.

 

Tabela 2 - Distribuição conjunta condicional de frequência do status de desenvolvimento com referente à representação acionária via correio (%).

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Fonte: Elaborado pelos autores

 

Em seguida, foram calculados os valores referentes à distribuição conjunta condicional de frequência do status de desenvolvimento com relação à senioridade dos credores em caso de falência, que estão dispostos na tabela 3.

 

Tabela 3 - Distribuição conjunta condicional de frequência do status de desenvolvimento referente à senioridade dos credores em caso de falência (%).

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Fonte: Elaborado pelos autores

Diferentemente da representação via correio, a senioridade dos credores em caso de falência é um instrumento institucional amplamente utilizado entre os mercados investigados (81%). Entre os mercados desenvolvidos, apenas dois não o utilizam. Por outro lado, quase trinta por cento dos mercados não desenvolvidos analisados não possuem este mecanismo de proteção aos credores. Mais uma vez, o achado é compatível com a expectativa teórica referente à superior maturidade institucional dos mercados desenvolvidos, em comparação aos mercados não desenvolvidos.

Posteriormente, foram calculados os valores referentes à distribuição conjunta condicional de frequência do status de desenvolvimento com relação à presença de interventor em caso de concordata. Eles estão apresentados na tabela 4.

 

Tabela 4 - Distribuição conjunta condicional de frequência do status de desenvolvimento referente à presença de interventor em caso de concordata (%).

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Fonte: Elaborado pelos autores

Para este instrumento, seu uso se mostrou moderado entre os marcados investigados (45% o utiliza), mas desta vez, a maior intensidade de uso foi verificada entre os mercados não desenvolvidos. Este achado também é compatível com a expectativa teórica referente à superior maturidade institucional dos mercados desenvolvidos, uma vez que a necessidade da presença de interventor representa a presença de desconfiança com relação aos mecanismos regulares de fiscalização e acompanhamento das atividades e dos relatórios financeiros divulgados pelas empresas que possuem ações negociadas no mercado.

Finalmente, foi testada a significância estatística das relações entre o status de desenvolvimento dos mercados acionários e as características financeiras operacionais dos mercados, bem como com o capital requerido para convocar uma assembleia extraordinária (variáveis numéricas). Os resultados estão apresentados na tabela 5.

 

Tabela 5 - Significância das relações entre o status de desenvolvimento e as variáveis numéricas analisadas.

2052.png 

Fonte: Elaborado pelos autores

A partir dos resultados obtidos pode-se verificar que apenas duas das variáveis numéricas testadas não se mostraram relacionadas ao status de desenvolvimento (concentração de mercado e o número de empresas listadas). Este achado não é compatível com a expectativa teórica referente ao porte e à diversificação dos mercados desenvolvidos em comparação aos mercados não desenvolvidos.

As diferenças encontradas para o valor bursátil, para o valor transacionado sobre o PIB e para o turnover foram compatíveis com o esperado. Uma vez que existem raros trabalhos voltados para uma análise empírica sobre as diferenças entre mercados acionários desenvolvidos e não desenvolvidos, torna-se difícil estabelecer um referencia comparativo dos resultados encontrados nesta com pesquisas anteriores.

 

5. CONCLUSÕES

 

O objetivo deste artigo foi aspectos inerentes aos mercados acionários em busca de características que possuam distinções estatisticamente significativas a partir de seus respectivos status de desenvolvimento. Para atingir o objetivo proposto, foram utilizadas duas técnicas estatísticas distintas uma vez que foram investigadas variáveis binárias e numéricas. Os resultados obtidos demonstraram que apenas seis das variáveis investigadas (de um total de quatorze) se mostraram relacionadas ao status desenvolvimento dos mercados acionários pesquisados.

Merece destaque a ausência de significância para a concentração de mercado e para o número de empresas listadas (dois aspectos clássicos associados ao grau de desenvolvimento de um mercado acionário). Conforme está apresentado pela literatura, estas características pressupõem a presença de um grande número de ações negociadas de modo que os investidores possam diversificar suas carteiras sem gerar concentração de valores em um grupo restrito de papéis. Os resultados obtidos corroboram a presença de diferença significativa entre mercados acionários que possuem distintos status de desenvolvimento, mas fica clara a necessidade de realização de novos estudos.

 

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