Governança colaborativa de consórcios públicos intermunicipais: o caso de consórcios públicos catarinenses
Collaborative governance of intermunicipal public consortiums: the case of
Santa Catarina public consortiums
Tiago Roberto Lopes das Neves1, Fabricia Silva da Rosa2 e Valdirene Gasparetto3
1 Universidade Federal de Santa Catarina, Brasil, Mestrado em Contabilidade, e-mail: tiago.nvs@hotmail.com
2 Universidade Federal de Santa Catarina, Brasil, Doutorado em Contabilidade, e-mail: fabriciasrosa@hotmail.com
3 Universidade Federal de Santa Catarina, Brasil, Doutorado em Engenharia de Produção, e-mail:
Recebido em: 20/11/2019 - Revisado em: 07/06/2020 - Aprovado em: 25/06/2020 - Disponível em: 01/10/2020
Resumo
Os consórcios públicos intermunicipais configuram-se como uma das formas possíveis de colaboração entre municípios. No Brasil, houve um crescimento expressivo na quantidade e diversidade a partir da legislação que tratou das normas gerais de contratação de consórcios públicos, em 2005. Diante disso, a estrutura de governança colaborativa atua como um mecanismo para a melhoria da coordenação, eficiência, democracia e estabilidade dessas colaborações, assim, este estudo teve como objetivo verificar o nível de divulgação de aspectos relacionados à governança colaborativa de consórcios públicos intermunicipais. Para tanto, foram analisados os consórcios públicos de saneamento existentes em Santa Catarina, no ano de 2019, por meio de um estudo de caso. Os dados foram coletados nos sítios eletrônicos e nos portais de transparência dos respectivos consórcios, e, posteriormente, analisados com base no modelo desenvolvido por Spicer (2017), adaptado a presente pesquisa, com a avaliação dos critérios em duas dimensões: acesso público e responsabilização. Os resultados apontam que os consórcios estudados não divulgam a totalidade dos critérios de governança colaborativa em ambas as dimensões, com média de divulgação de 50,9%, e disponibilização de apenas uma parcela das informações aos usuários dos serviços e cidadãos. Conclui-se que a divulgação pode ser melhorada de modo a fornecer informações mais transparentes, e que permitam melhor avaliação da tomada de decisões, maior clareza de responsabilização e fortalecimento da governança colaborativa.
Palavras-chave: Governança colaborativa; consórcios públicos; colaboração intermunicipal; administração pública.
Abstract:
Intermunicipal public consortiums is set up as one of the possible ways of collaboration between local governments. In Brazil, there was a significant growth in quantity and diversity starting with the legislation that dealt with general norms about hiring public consortiums in 2005. Given this, the collaborative governance structure acts as a mechanism to improve coordination, efficiency, democracy and stability of these collaborations, therefore, the objective of this study is to verify the disclosure level of aspects related to collaborative governance of intermunicipal public consortiums. To make it possible, the public sanitation consortiums existing in Santa Catarina was analyzed, in 2019, through a case study. The data was collected by websites and transparency portals of the respective consortiums and, subsequently, analyzed based on the model developed by Spicer (2017), adapted to this research, with an evaluation of criteria in two-dimensions: public access and accountability. The results indicates that the studied consortiums does not disclose the totality of criteria from collaborative governance in both dimensions, with an average disclosure of 50.9% making only a portion of the information available to service users and citizens. Concludes that disclosure can be improved in way to offer transparent information that allows better evaluation of decision making, greater accountability and strengthening collaborative governance.
Keywords: Collaborative governance; public consortiums; intermunicipal collaboration; public administration.
1. INTRODUÇÃO
Nas últimas décadas, as práticas de gestão no setor público têm passado por uma reavaliação em vários países, e a colaboração ocupa cada vez mais espaço tanto na prática quanto na pesquisa (BARRETTA; BUSCO, 2011). Por essa razão, o interesse no papel que esses arranjos colaborativos podem desempenhar na implementação de políticas e na prestação de serviços públicos tem aumentado (ELSTON; MACCARTHAIGH; VERHOEST, 2018).
O crescimento da pesquisa sobre colaboração ocorreu conforme as organizações públicas foram estabelecendo relacionamentos para situações complexas, como alternativas à tradicional hierarquia centralizada e como meio de garantir a entrega dos serviços públicos e melhorar a eficiência (PARK; KRAUSE; FEIOCK, 2018). A colaboração no setor público visa atender a necessidades de políticas complexas e transversais que não são atendidas de maneira individual (ELSTON; MACCARTHAIGH; VERHOEST, 2018), e os governos locais (municípios) costumam ser mais vulneráveis à limitação de recursos e às necessidades cada vez mais complexas e heterogêneas da população, o que contribui para que ocorra a atuação coletiva (PARK; KRAUSE; FEIOCK, 2018).
No Brasil, as relações intergovernamentais têm sido objeto de estudo pelos pesquisadores de maneira ampla e aprofundada desde a promulgação da Constituição Federal de 1988 e do movimento de reforma do Estado, especialmente no contexto da descentralização das políticas públicas (RIBEIRO et al., 2018)especially at the local level. The federal government has been using information and communication technologies (ICT. A descentralização proporcionou maior autonomia e responsabilidade aos governos locais, dessa forma, a cooperação intermunicipal se delimitou como uma alternativa para a resolução de problemas comuns de determinada região (PEREIRA; BELCHIOR, 2016). Não existe um modelo único de colaboração, assim, os entes federativos organizam-se sob vários arranjos para o compartilhamento de recursos, responsabilidades e decisões (EVANGELISTA, 2004).
Os consórcios públicos configuram-se como uma das formas possíveis de colaboração (BRITO, 2018). Surgem como uma forma de solução de modo colegiado, em um novo arranjo institucional para a gestão municipal, e como instrumento de planejamento regional para uma possível solução de problemas comuns na gestão de atividades específicas (IBGE, 2015).
Houve um crescimento expressivo na quantidade e diversidade dos consórcios públicos a partir da promulgação da legislação que tratou das normas gerais de contratação de consórcios públicos, a Lei nº 11.107, de 2005 (GRIN; ABRUCIO, 2017). Na última pesquisa disponibilizada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), cerca de 3.691 (66,3%) municípios brasileiros possuíam consórcio público com pelo menos um parceiro, além disso, desse total, 96,7% se constituem de consórcio intermunicipal (cooperação horizontal) (IBGE, 2015).
Um dos desafios desses relacionamentos colaborativos é a criação de mecanismos para a melhoria da coordenação, incluindo clareza de papeis e responsabilidades, canais de comunicação e estruturas de monitoramento (THOMSON; PERRY; MILLER, 2007). Outro problema levantado é a necessidade da criação de regras e normas que se apliquem tanto à parceria quanto aos seus integrantes. Assim, seus desenhos levantam questões sobre poder, autoridade, legitimidade e responsabilidade nos espaços colaborativos (SKELCHER; MATHUR; SMITH, 2005).
Verifica-se, assim, que os arranjos colaborativos intermunicipais precisam ser estruturados de forma a garantir a eficiência, democracia e estabilidade (SILVA; TELES; FERREIRA, 2018), tendo em vista que os municípios se desfazem das linhas tradicionais de autoridade e responsabilidade, o que pode gerar incertezas sobre a clareza da origem dos serviços, a capacidade da avaliação de desempenho, a cadeia de responsabilização, a transparência e a prestação de contas (SPICER, 2017).
Nesse sentido, a estrutura de governança colaborativa pode se tornar o ponto principal dos consórcios públicos intermunicipais, evitando custos elevados de formulação de políticas contrárias, restabelecendo a racionalidade para a administração pública e ampliando a participação democrática (ANSELL; GASH, 2008). O alto grau de interdependência entre as partes interessadas e a crescente complexidade das questões públicas fazem com que a governança colaborativa seja vista para além de uma nova forma de gestão pública, mas também como uma rede flexível de governança pública (CHOI; ROBERTSON, 2014).
Tendo em vista esse cenário, aliado ao fato de que mesmo com um crescente aumento dos estudos sobre consórcios a partir da década de 1990, as pesquisas ainda são escassas, o que demonstra a necessidade de mais investigações nos mais variados contextos em que são realizados (FILIPPIM; ABRUCIO, 2016). Ademais, pesquisadores apontam a necessidade de realização de mais estudos em pequenos municípios como uma lacuna a ser preenchida pela literatura dessa área (GIACOMINI; SANCINO; SIMONETTO, 2018), além de possíveis testes de estruturas integradas de governança colaborativa (RAMADASS; SAMBASIVAN; XAVIER, 2018).
Com base neste contexto, o presente trabalho tem como objetivo verificar o nível de divulgação de aspectos relacionados à governança colaborativa de consórcios públicos intermunicipais, por meio do estudo do caso de consórcios localizados no estado de Santa Catarina. Para tanto, o artigo está estruturado em mais 4 seções além desta introdutória. A seção 2 aborda os aspectos teóricos acerca dos temas colaboração e cooperação intermunicipal, governança colaborativa e consórcios públicos. A seção seguinte descreve o delineamento metodológico da pesquisa. Na quarta seção analisam-se os resultados da pesquisa e, por fim, a seção final expõe as considerações finais, com a conclusão, as limitações da pesquisa e as sugestões para trabalhos futuros.
2. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA
2.1 Colaboração e Coperação Intermunicipal
A escassez de recursos, o avanço das mudanças tecnológicas e a crescente interdependência organizacional são alguns dos fatores que explicam as novas formas de relacionamentos no setor público, assim, as colaborações se desenham como os processos em que as organizações passam a interagir umas com as outras para criar novas estruturas organizacionais e sociais (THOMSON; PERRY; MILLER, 2007). Esses espaços colaborativos são delineados como os domínios políticos e espaciais nos quais os mais variados atores se unem pela construção e implementação de políticas públicas e prestação de serviços (SKELCHER; MATHUR; SMITH, 2005).
Os problemas políticos contemporâneos transbordam os limites das fronteiras entre as organizações do setor público, desafiando as capacidades individuais dos governos locais (PARK; KRAUSE; FEIOCK, 2018). A crise fiscal iniciada em 2008 aumentou a necessidade dos governos locais em diversos países remodelarem seus serviços, de modo a reduzir seus custos e consequentemente melhorar a eficiência (GIACOMINI; SANCINO; SIMONETTO, 2018).
A colaboração implica em uma alteração no processo rígido de tomada de decisão hierárquica, exigindo a participação dos atores no processo de governança e um certo grau de confiança nas competências individuais (PARK; KRAUSE; FEIOCK, 2018). Não existe um consenso quanto a definição e enquadramento de colaboração no setor público. Os estudiosos da área tendem a elaborar definições e medidas tendo por base objetivos específicos, reconhecendo, na maioria dos casos, sua multiplicidade (AMSLER; O’LEARY, 2017)public management and administration scholars have crossed disciplinary boundaries to build a body of scholarship on collaboration for public good, services, and values. The paper aims to discuss these issues. Design/methodology/approach Public management and administration researchers need to integrate the scholarship on collaboration through systems thinking. How do we define collaboration? How do we distinguish among the categories of collaborative public management (CPM.
A definição mais alinhada com os objetivos do presente trabalho é a proposta por Thomson et al. (2007), de que a colaboração é um processo de interações mutuamente benéficas, por meio de negociações formais e informais, e com a criação de regras e estruturas compartilhadas que regem esses relacionamentos, muitas vezes apresentada como uma maneira de alocação de recursos de maneira mais eficiente.
Ramadass et al. (2018) destacam também o papel estratégico da colaboração como meio de enfrentar problemas sociais complexos. A colaboração pode aumentar a competitividade econômica e auxiliar a gerenciar externalidades (MEZA et al., 2018), devendo agir de maneira variada como meio de coordenação ou sistema de distribuição em que os recursos públicos possam ser canalizados (SKELCHER; MATHUR; SMITH, 2005).
A gestão pública colaborativa pode ocorrer tanto entre entes do mesmo nível (horizontal), quanto em níveis distintos de governo (vertical) (MCGUIRE, 2006), e permite ainda a possibilidade do envolvimento de outros parceiros, públicos ou privados, de setores distintos, tais como iniciativa privada, organizações não governamentais, conselhos comunitários, dentre outros (SILVA; TELES; FERREIRA, 2018). Em relação especificamente aos governos locais, a cooperação intermunicipal é definida como o cumprimento de tarefas por dois ou mais municípios em conjunto, ou ainda por uma terceira entidade legal, com atendimento simultâneo dos municípios participantes, que atuarão de forma direta ou indireta nessa colaboração (STEINER, 2003).
A cooperação tem sido adotada como um meio de superar os limites dos governos locais e lidar com o desafio de oferecer melhores serviços públicos com recursos financeiros escassos (GIACOMINI; SANCINO; SIMONETTO, 2018). Essas experiências têm evoluído e, em alguns casos, modificam até a forma de estruturação e prestação de serviços públicos (EMERSON; NABATCHI, 2015). Além disso, a participação dos municípios no processo de colaboração também é um meio de lidar com problemas de escalas territoriais, aumentando a capacidade desses governos em fornecer níveis mais adequados de serviços (SILVA; TELES; FERREIRA, 2018). Os arranjos podem se desenhar por meio de compartilhamento de serviços simples até desenhos mais complexos e serviços essenciais para a população, além disso, em alguns casos, pode até ocorrer a contratação de um município para fornecer um serviço a outro (SPICER, 2017).
A cooperação envolve atividades colaborativas com a promessa de redução de custos, melhoria da qualidade dos serviços ou uma ampliação da abrangência do atendimento, além de auxiliar nos desafios enfrentados pelos governos locais como a fragmentação e problemas comuns de recursos (SPICER, 2017). Permite, ainda, que os municípios alcancem economias de escala na prestação de serviços e ainda mantenham o controle e sua identidade local (WARNER, 2006).
Os benefícios gerados pela cooperação incluem a consecução de resultados que seriam inviáveis ou de maior dificuldade se considerados cada governo local de maneira isolada, além disso, proporciona maior potencial de compartilhamento e alavancagem de recursos escassos (EMERSON; NABATCHI; BALOGH, 2012), melhor coordenação de atividades, aumento do capital social, melhor gestão do conhecimento e maior compartilhamento de riscos na experimentação de políticas (EMERSON; NABATCHI, 2015).
Porém, um volume considerado de estudos aponta também para as possíveis consequências negativas geradas pelos arranjos colaborativos, que podem compreender custos e riscos de coordenação e transação (PARK; KRAUSE; FEIOCK, 2018), uma parcela considerável de taxa de insucesso, e casos em que os arranjos são planejados e desenhados com uma boa formulação de políticas, porém, acabam esbarrando na ineficiência, má gestão, e níveis baixos de prestação de contas, responsabilidade e transparência (RAMADASS; SAMBASIVAN; XAVIER, 2018).
Sob o aspecto da governança, o processo de colaboração ou cooperação permite a criação de estruturas de ações coletivas, pautadas em um conjunto de regras de trabalho, compartilhamento de informações e distribuição de custos e benefícios (THOMSON; PERRY; MILLER, 2007). Dessa forma, uma estrutura de governança eficaz pode se desenhar como uma maneira de redução de custos de coordenação e transação (GIACOMINI; SANCINO; SIMONETTO, 2018).
2.2 Governança Colaborativa
A estruturas institucionais passaram a ser cada vez mais complexas e interdependentes, o que refletiu no aumento da demanda por colaboração, aliado a esse cenário, o alto custo da regulação, a necessidade de uma alternativa aos grupos de interesse, e as falhas de accountability do gerencialismo, contribuíram para o desenvolvimento da governança colaborativa (GC) (ANSELL; GASH, 2008). A governança colaborativa pode ser vista como um conceito integrador que abrange literaturas de diversas áreas de estudo como colaboração, parcerias, redes, terceirização, governança democrática, engajamento, construção de consenso, dentre outros (MORSE, 2011), ou ainda, como uma rede flexível da nova governança pública (CHOI; ROBERTSON, 2014).
Emerson et al. (2012) a define como processos e estruturas de tomada de decisões e gestão de políticas públicas que envolvem as pessoas de forma construtiva através dos limites dos órgãos públicos, níveis de governo e / ou das esferas pública, privada e cívica para realizar um propósito público que de outra forma não poderia ser realizado.
Sua estrutura tem sido aplicada e estudada em vários contextos, influenciada por aspectos políticos, legais, socioeconômicos, ambientais e culturais (EMERSON; NABATCHI; BALOGH, 2012), e uma de suas principais promessas é que o todo se torna maior que a soma das partes, ou seja, um esforço conjunto pode abordar limitações enfrentadas de maneira individual, bem como gerar resultados que seriam difíceis de atingir sozinhos (BROWN; GONG; JING, 2012).
Parcelas significativas de tempo e energia devem ser empregadas pelos participantes da estrutura de GC, dessa forma, seu uso se mostra mais adequado quando as questões são complexas ou as instituições não são capazes de mobilizar os recursos necessários para o atingimento dos objetivos de maneira individual. Outra questão importante é que mesmo com a inclusão de diversas partes interessadas na construção da governança colaborativa, o processo de decisão ainda pode ser dominado pelos atores mais poderosos. Assim, aqueles com mais recursos, informações e legitimidade podem moldar os processos na direção dos seus próprios interesses (CHOI; ROBERTSON, 2014).
Dentro das estruturas de GC, as ações podem ser conduzidas em conjunto por todos os parceiros ou ainda por entidades externas e, nesse sentido, verifica-se a importância de cada participante da colaboração tendo em vista que cada um deles carrega atitudes, valores, interesses e conhecimentos individuais, além das culturas, missões e mandatos das organizações ou constituintes que eles representam (EMERSON; NABATCHI; BALOGH, 2012).
Como benefícios da governança colaborativa pode-se destacar a ampliação da participação democrática, o desenvolvimento de novas formas de aprendizagem e resolução de problemas, a restituição da racionalidade da gestão pública e a construção de relacionamentos mais produtivos (ANSELL; GASH, 2008). Nota-se que a capacidade de governança desses arranjos se traduz na habilidade de coordenação e agregação dos interesses divergentes, da tomada de decisão, e da manutenção do consenso e do apoio dos cidadãos ao longo do tempo (SILVA; TELES; FERREIRA, 2018).
Já os problemas apontados pelos estudiosos dizem respeito à possibilidade de manipulação por atores mais poderosos, falta de compromisso real e desconfiança pelas partes, além de desequilíbrios de poder e recursos (ANSELL; GASH, 2008). Além disso, a estrutura de GC também pode apresentar problemas de principal-agente visto que os novos órgãos de governança assumem a gestão da colaboração, o principal se torna o governo local e o agente o gestor do acordo de cooperação. Assim, se fazem necessários mecanismos de controle, monitoramento e coordenação, de modo a mitigar os possíveis riscos e melhorar o alinhamento entre o principal e o agente (BEL; WARNER, 2015)inter-municipal cooperation has been a relatively understudied reform. We analyse the literature on cost savings under cooperation and find that savings are dependent on (1.
2.3 Consórcios Públicos Intermunicipais
Devido ao reconhecimento da interpendência existente entre os governos, sempre ocorreram iniciativas de ações colaborativas e de coordenação de esforços, tanto entre entes semelhantes quanto distintos (VASCO, 2006). Com a promulgação da Constituição Federal de 1988 e o reconhecimento dos municípios como entes federativos, com transferência de competências e novo modelo de repartição dos recursos, a ideia dos arranjos consorciais passou a ganhar força novamente (PRATES, 2010).
O dispositivo constitucional proporcionou maior autonomia política e fiscal aos governos locais, além da descentralização de recursos financeiros e responsabilidades (RIBEIRO et al., 2018)especially at the local level. The federal government has been using information and communication technologies (ICT. A autonomia dos governos locais compreende a organização administrativa própria, a competência tributária específica, a responsabilidades por determinadas políticas públicas, o poder para editar leis em suas esferas de competência (EVANGELISTA, 2004), e intensificou o interesse por formação de estruturas e processos colaborativos (PEREIRA; MOREIRA, 2016).
Os consórcios públicos são arranjos institucionais de cooperação voluntária, de existência determinada ou perene, constituídos para produção específica de ações e soluções que efetivamente as entidades municipais seriam incapazes de realizar sozinhas (BRITO, 2018). São instrumentos importantes de política pública, desenvolvimento econômico e melhoria na prestação de serviços públicos (PRATES, 2010).
A Lei º 11.107, de 06 de abril de 2005, regulamentada pelo Decreto 6.017/07, é o dispositivo legal que instituiu as normas gerais para a contratação de consórcios públicos. De acordo com o regulamento, os consórcios podem ser instituídos tanto como pessoa jurídica de direito público quanto privado, por meio de um instrumento contratual, com prévia subscrição de protocolo de intenções, e posterior ratificação através de lei.
A referida lei e seu regulamento não foram responsáveis pela instituição dos consórcios, tendo em vista que já estavam previstos na Constituição Federal, mas o seu papel foi o de adaptar a legislação à própria realidade e eliminar dificuldades na sua criação (IBGE, 2015). A partir desse marco legal, os governos locais encontraram maior segurança jurídica para criar e participar dos arranjos cooperativos (FILIPPIM; ABRUCIO, 2016).
A formação do consórcio necessita de definição clara dos interesses e objetivos, articulação política entre os poderes executivos, além do cumprimento das seguintes etapas: i) estabelecimento de um Protocolo de Intenções; ii) ratificação do Protocolo de Intenções; iii) estabelecimento de Estatutos e Regimento Interno; iv) formalização de um Contrato de Rateio e, por fim, o estabelecimento de um Contrato de Programa (PRATES, 2010).
Filippim e Abrucio (2016) destacam as principais características dos consórcios públicos: devem ser regidos pela lei das entidades que cooperam entre si; são pessoas jurídicas que compõem a Administração Pública de todos os consórcios; podem ser formados por entidades federativas de diferentes níveis; podem autorizar a gestão associada de serviços públicos; são pessoas de direito público quando se tornam uma Associação Pública; são pessoas jurídicas de direito privado quando assumem a forma de Associação Civil sem fins econômicos.
Uma de suas premissas é a ideia de união de forças com o fim de atingir os objetivos de forma conjunta, dado que a maioria dos seus membros não teriam condições de atingi-los de maneira isolada, e são desenvolvidos principalmente nas áreas de saúde, educação, serviços públicos, obras públicas, meio ambiente e desenvolvimento urbano (PRATES, 2010).
Nos governos locais, onde a disponibilidade de recursos se mostra mais escassa, o estabelecimento de consórcios torna-se necessário para resolver problemas que estão além de suas capacidades técnicas, gerenciais, materiais ou financeiras (VASCO, 2006). Assim, os municípios passam a compartilhar estruturas, dividir investimentos, custos e recursos, e atuar além das suas próprias fronteiras (PELLIN; DALLABRIDA, 2014).
Brito (2018), ao tratar do assunto, destaca alguns aspectos que devem ser observados e que costumam se tornar os principais problemas na construção desses arranjos: processo de deliberação, uniformidade política, mecanismos de negociação, capacidade de extinguir ou atenuar conflitos, densidade institucional do arranjo, capacidade financeira, dentre outros. Aliado a isso, a ação individualista dos municípios, o baixo capital social e a gestão pública pouco qualificada são outros exemplos de desafios a serem enfrentados na instituição dos consórcios (GRIN; ABRUCIO, 2017).
Em relação à governança colaborativa, está se revela nos consórcios públicos intermunicipais de diversas formas e etapas distintas desde sua criação (ROCHA et al., 2017). Assim, o desenho e a implantação de aspectos relacionados à estrutura de governança torna-se um dos pontos principais desses arranjos (FILIPPIM; ABRUCIO, 2016).
Por fim, destaca-se que a cooperação entre os entes da administração pública tornou-se de extrema importância para a agenda política e de pesquisa. Isso se deve, em parte, à constatação de que os governos locais têm dificuldades em resolver de maneira individual seus problemas de políticas públicas e prestação de serviços, dessa forma, encontram na colaboração uma maneira de resolve-los (ABRUCIO; FILIPPIM; DIEGUEZ, 2013). Assim, uma parcela considerável destas pesquisas, tanto em nível internacional quanto no Brasil, destacam as dificuldades em criar, estruturar e garantir a estabilidade institucional dos consórcios entre os governos locais (ABRUCIO; FILIPPIM; DIEGUEZ, 2013).
3. METODOLOGIA
A presente pesquisa é descritiva quanto aos objetivos, por ser orientada para a descrição de fatos ou dados coletados da realidade de análise (CERVO; BERVIAN; SILVA, 2007). Em relação à abordagem, a pesquisa tem natureza quantitativa e qualitativa, pois quantifica-se a coleta e o tratamento dos dados com a aplicação de técnicas estatísticas (RICHARDSON, 2012), mas também busca-se uma melhor compreensão do fenômeno em seu contexto específico (GRAY, 2012), e, por fim, quanto aos procedimentos, empregou-se a pesquisa bibliográfica para a revisão da literatura, além de pesquisa documental e análise de conteúdo.
A população do trabalho corresponde aos consórcios intermunicipais de saneamento existentes no estado de Santa Catarina no ano de 2019. O número de consórcios foi levantado por meio do Banco de Dados de Consórcios de Saneamento Básico, criado pelo Programa de Pós-Graduação em Urbanismo da Universidade Federal do Rio de Janeiro (PROURB/UFRJ), a partir de convênio firmado com a Fundação Nacional de Saúde (Funasa) e apoiado pela rede de pesquisa do Observatório das Metrópoles e pelo Observatório dos Consórcios Públicos e do Federalismo. O banco possui informações sobre a denominação dos consórcios, ano de criação, entes federativos consorciados, município-sede, contatos, atividades previstas e realizadas, gestão financeira, relação com o Estado, relação com planos municipais de saneamento e documentos oficiais do consórcio. Ademais, os dados são atualizados semestralmente (BORGES; MORAES, 2018).
Foram verificadas 14 entidades no banco de dados, 12 consórcios de saneamento, incluindo áreas de atuação para água, esgoto e resíduos sólidos, e 2 agências reguladoras, as quais foram excluídas da análise por não se enquadrarem no escopo do presente trabalho. Além disso, dos 12 consórcios analisados, o Consórcio Público Intermunicipal Multifinalitário Meio Oeste Contestado (CPIMMOC) foi extinto no final do ano de 2018, e o Consórcio Intermunicipal Serra São Miguel (CSM) não possui sítio eletrônico ou portal da transparência, e por essa razão os dois também foram desconsiderados na análise. Dessa forma, a amostra final totalizou 10 consórcios.
A coleta de dados foi realizada no primeiro semestre de 2019 e dividida em duas etapas. Em um primeiro momento foram acessados os documentos e informações disponibilizados nos sítios eletrônicos e nos portais de transparência dos respectivos consórcios, tais como documentos de constituição, atas de reuniões, relatórios de desempenho, dentre outros. De posse dessas informações, o nível de divulgação de aspectos relacionados à governança colaborativa foi avaliado com base no modelo desenvolvido por Spicer (2017) e adaptado para este trabalho, que compreende dimensões divididas em duas categorias: acesso público e responsabilização. A tabela 1 descreve os itens objeto de análise.
Tabela 1: Critérios de avaliação de governança colaborativa
Fonte: Spicer (2017), adaptado pelos autores
A análise foi efetuada com a utilização de uma escala variando de 0 a 1, em que o valor 1 é atribuído quando o critério é atendido, 0,5 quando é parcialmente atendido, e 0 se não é atendido. A soma dos valores descreve o nível de divulgação dos critérios de governança colaborativa pelos consórcios públicos objeto do estudo. Conforme apontado por Spicer (2017), a utilização da escala permite maior força de comparação desses arranjos.
4. RESULTADOS E DISCUSSÃO
4.1 Características dos Consórcios Estudados e Nível Geral de Divulgação
Na tabela 2 são apresentados os consórcios públicos intermunicipais analisados na pesquisa.
Tabela 2: Consórcios públicos intermunicipais analisados
Fonte: Dados da pesquisa
Os arranjos colaborativos abrangem quase a totalidade das principais regiões de Santa Catarina, representando cerca de 105 municípios catarinenses. O Consórcio Intermunicipal da Fronteira (CIF) e o Consórcio Intermunicipal Quiriri (CIQ) são os que apresentam os menores números de entes federativos consorciados, com 4 municípios cada. Já o Consórcio Intermunicipal Serra Catarinense (CISAMA) possui o maior número de membros, com o total de 18 municípios.
Todos os consórcios analisados são estruturados em contextos horizontais, ou seja, a colaboração ocorre através de entes de um mesmo nível, os munícipios. Além disso, nenhum deles possui a participação de outros atores externos como organizações não governamentais, conselhos comunitários, ou parceiros da iniciativa privada.
As atividades desenvolvidas pelos consórcios são diversas, nesse sentido foram observados serviços de desenvolvimento de programas de gestão de resíduos sólidos, gestão compartilhada de aterro sanitário, implantação de coleta seletiva, análise de qualidade da água, coleta de materiais com destinação específica como pilhas e baterias, embalagens de agrotóxicos e resíduos de saúde, dentre outros.
Em relação ao meio de disponibilização dos dados, verificou-se que todos os consórcios da amostra possuem sítio eletrônico onde constam principalmente as informações sobre o arranjo colaborativo, áreas de atuação, documentos de constituição, contratos e convênio firmados, além de portal da transparência, no qual via de regra concentram-se as informações sobre execução orçamentária, de pessoal, além de dados obrigatórios conforme requeridos pela Lei de Acesso à Informação, Lei de Responsabilidade Fiscal e outras legislações que regem o setor.
Depreende-se da análise que os consórcios públicos ainda não atendem integralmente a divulgação dos critérios relacionados à governança colaborativa objeto de análise. Conforme o modelo utilizado, foram analisados 11 aspectos, e a pontuação média observada das entidades foi de 5,6 (aproximadamente 50,9%). A tabela 3 descreve algumas estatísticas descritivas dos resultados observados.
Tabela 3: Estatísticas descritivas da divulgação dos aspectos analisados
Fonte: Dados da pesquisa
O arranjo com maior nível de divulgação foi o Consórcio Intermunicipal Quiriri (CIQ), com 9 pontos (superior a 80%), seguido pelo Consórcio Intermunicipal do Médio Vale do Itajaí (CIMVI) e o Consórcio Intermunicipal de Saneamento Ambiental do Meio Oeste de Santa Catarina, ambos com pontuação de 7,5 (aproximadamente 68,2%). No sentido oposto, o Consórcio Intermunicipal de Gestão Ambiental Participativa do Alto Uruguai Catarinense (Lambari) e o Consórcio Intermunicipal do Contestado (COINCO) foram os que apresentaram os piores resultados, com pontuação de 3,5 (31,8%) e 2 (18,2%), respectivamente. A Tabela 4 retrata o nível de divulgação de cada consórcio.
Tabela 4: Nível de divulgação dos consórcios
Fonte: Dados da pesquisa
Verifica-se que nenhum consórcio divulga informações relativas a todos os critérios analisados. O Consórcio Intermunicipal do Contestado (COINCO), que teve a menor pontuação total, também foi o arranjo com menor número de critérios divulgados (apenas 4). Os consórcios com maior pontuação (CIQ e CIMVI), por sua vez, também foram os que tiveram a maior quantidade de critérios divulgados, com 10 aspectos cada.
Conforme descrito na metodologia, a pontuação atribuída ao nível de divulgação varia de 0 a 1 (0: não atendido; 0,5: parcialmente atendido; 1: atendido). As frequências observadas de cada pontuação foram bem próximas. Mesmo com alguns valores discrepantes nos extremos da amostra, verificou-se que, em média, o critério foi totalmente atendido em 3,8 oportunidades, e não atendido ou parcialmente atendido em 3,6 vezes. Além disso, 6 consórcios apresentaram pontuação de pelo menos 50% de divulgação, e nenhuma entidade não pontuou em nenhum critério.
Da análise das dimensões constatou-se que os critérios relacionados aos dados sobre responsabilização apresentaram divulgação média superior aos dados sobre acesso público. Verificou-se, ainda, uma amplitude maior de variação na dimensão acesso público, com percentuais mínimo e máximo superiores aos da divulgação sobre responsabilização. A Tabela 5 expõe essas informações de maneira resumida.
Tabela 5: Nível de divulgação das dimensões
Fonte: Dados da pesquisa
Esses dados apontam uma possível maior preocupação dos consórcios com a divulgação de informações sobre responsabilização. Um dos motivos desse resultado pode estar associado à regulação existente no país, principalmente o normativo que trata da contratação de consórcios públicos (Lei nº 11.107/05), e as Leis nº 12.527/11 e nº 101/00 (Lei de Acesso à Informação e Lei de Responsabilidade Fiscal), tendo em vista que os critérios que impulsionaram esse resultado estão relacionados com as determinações contidas nesses instrumentos legais e que devem ser observadas pelos arranjos intermunicipais.
Os consórcios com maior pontuação na dimensão acesso público foram o Consórcio Intermunicipal Quiriri (CIQ), com 4,5 pontos e divulgação em todos os critérios, e o Consórcio Intermunicipal de Saneamento Ambiental do Meio Oeste de Santa Catarina, com pontuação de 3,5. Já os consórcios com menor pontuação nessa dimensão foram o Consórcio Intermunicipal do Contestado (COINCO), o Consórcio Intermunicipal de Gestão Ambiental Participativa do Alto Uruguai Catarinense (Lambari) e o Consórcio Intermunicipal da Fronteira (CIF), todos com apenas 1 ponto.
Na dimensão responsabilização, a pontuação máxima foi de 4,5 pontos, observada em três consórcios (CISAMA, CIMVI e CIQ), com os dois primeiros pontuando em todos os critérios analisados. O Consórcio Intermunicipal do Contestado (COINCO) também apresentou o pior resultado nessa dimensão, pontuando em dois critérios, mas novamente com o total de 1 ponto.
4.2 Critérios Analisados
Os critérios de avaliação da governança colaborativa utilizados no presente trabalho foram adaptados do modelo desenvolvido por Spicer (2017), sendo utilizadas as duas dimensões em que seria possível verificar o nível de divulgação das informações pelos consórcios estudados. Dos 11 critérios analisados, apenas 4 tiveram nível de divulgação inferior a 50%, e só um deles acima de 80%. A Figura 1 descreve o percentual de divulgação de cada critério.
Gráfico 1: Nível de divulgação dos aspectos analisados
Fonte: Dados da pesquisa
Na dimensão acesso público, foram analisados 5 critérios. O critério A1 refere-se à verificação da divulgação de informações sobre os documentos de constituição e os contratos da cooperação, que incluem os protocolos de intenções, as leis municipais que ratificaram os protocolos, os contratos de rateio e programa, e os estatutos ou regimentos internos. Esse critério foi atendido por todos os consórcios, mas quase a totalidade de forma parcial, apenas 1 deles, o Consórcio Intermunicipal de Saneamento Ambiental do Sul de Santa Catarina (CISAM Sul), divulgou todos os documentos. Os dois documentos menos divulgados foram os contratos de rateio e programa.
Os critérios A2 e A3, também da dimensão acesso público, tratam da divulgação da agenda de reuniões e das atas assembleias, respectivamente. Foram verificados, assim, se os consórcios disponibilizavam em seus sítios eletrônicos a agenda de reuniões, com as convocações para as assembleias, além da divulgação posterior das respectivas atas. A periodicidade das assembleias foi consultada nos estatutos/regimentos internos. Os resultados do critério A1 apontam que apenas 4 consórcios atenderam a este critério (CIMVI, CIGAMVALI, CIQ, e CISAM Meio Oeste). Já o critério A3 foi divulgado por 6 consórcios (CISAMA, CIMVI, CIRSURES, CIQ, CISAM Meio Oeste, e CISAM Sul).
A divulgação dos relatórios de desempenho foi o objeto de análise do critério A4, o qual foi o item mais negligenciado pelos consórcios. Apenas o Consórcio Intermunicipal Quiriri (CIQ) divulgou informações desse critério.
O último critério dessa dimensão, o A5, analisa se os contatos são fornecidos nos respectivos contratos. Verificou-se boa aderência pelos consórcios, em que 6 deles (CIF, CISAMA, CIMVI, Lambari e COINCO) divulgaram as informações de maneira parcial, e 4 deles (CIGAMVALI, CIQ, CISAM Meio Oeste e CISAM Sul) de forma integral, fornecendo no contrato o endereço do município, nome do representante legal, geralmente na figura do prefeito, além de telefone para contato. Apenas o Consórcio Intermunicipal de Resíduos Sólidos Urbanos da Região Sul (CIRSURES) não atendeu a este critério.
Os níveis baixos de divulgação nessa dimensão podem estar associados às mudanças nas linhas de autoridades tradicionais. Nesse sentido, Spicer (2017) ressalta que passam a existir múltiplos pontos de autoridade, o que dificulta a manutenção do relacionamento de prestação de contas e transparência, tendo em vista que os esforços nessa direção são vistos muitas vezes como pontos que eliminam a eficiência da colaboração.
A transparência é um meio de reforçar a prestação de contas e evitar conflitos, pois a divulgação das informações permite o acesso às ações realizadas e aos resultados desses esforços coletivos (TONELLI et al., 2018). Assim, ter procedimentos claros e transparentes permite que os cidadãos se sintam mais confiantes na colaboração, além de proporcionar maior legitimidade ao processo colaborativo (ANSELL; GASH, 2008).
Os governos devem promover a transparência das informações contidas nos normativos críticos que regem o arranjo colaborativo, pois a acessibilidade é um item essencial para a regulação do poder nos espaços colaborativos (QI, 2019). Além disso, a indisponibilidade dos dados compromete a avaliação desses relacionamentos entre os governos, na medida em que impossibilita a avaliação comparativa da prestação dos serviços (SPICER, 2017).
Na dimensão responsabilização, foram analisados 6 critérios, o primeiro, o R1, refere-se à disponibilização de um relatório anual das atividades desenvolvidas pelos consórcios intermunicipais. Cerca de 40% divulgaram essas informações (CISAMA, CIMVI, CIRSURES, CIQ). Dentre os problemas verificados, observou-se que alguns consórcios dispunham até de local específico na página da internet para disponibilização desses dados, porém, o documento não estava disponível, além disso, verificou-se, também, que alguns arranjos disponibilizavam as informações de maneira descontinuada, compreendendo apenas alguns anos. O Consórcio Intermunicipal de Resíduos Sólidos Urbanos da Região Sul (CIRSURES) se destacou na divulgação desse critério, apresentando informações sobre suas atividades por áreas (resíduos sólidos urbanos, coleta seletiva, operação do aterro técnico), além de relatórios de visitas técnicas e de eventos realizados pela entidade.
Os critérios R2 e R3 foram atendidos por 7 consórcios. O primeiro refere-se à disponibilização do orçamento anual, já o segundo diz respeito à divulgação da prestação de contas sobre a execução orçamentária anual. Ambos foram atendidos por 7 consórcios, mas o R3 apresentou um maior número de arranjos com cumprimento parcial. Nestes critérios também foram observados problemas de descontinuidade, com alguns anos descobertos, ou ainda documentos de difícil compreensão, como a disponibilização de balanços ou documentos contábeis de períodos incompletos ou com informações ausentes.
A disponibilização de informações sobre quem representa cada município, critério R4, foi o item com maior nível de divulgação. 9 consórcios atenderam a esse critério, e apenas um deles de forma parcial (COINCO). A informação foi divulgada pelas entidades consorciadas diretamente nos regimentos internos ou contratos, além de constar também em alguns dos próprios sítios eletrônicos.
O critério R5 analisou se a parceria evidencia quem é responsável pela prestação dos serviços. A grande maioria dos consórcios verificados divulga as informações de maneira parcial, o que acarretou a diminuição da pontuação do critério, que ficou abaixo dos 50% de aderência. A não divulgação dos contratos de programa ou a falta de clareza das informações contribuíram para o resultado observado.
Por fim, por meio do critério R6 verificou-se se os consórcios intermunicipais disponibilizam um canal de reclamações para cidadãos ou usuários do serviço. Esse critério foi atendido por todos os consórcios analisados, porém, conforme observado no critério A1, apenas o Consórcio Intermunicipal de Saneamento Ambiental do Sul de Santa Catarina atendeu integralmente esse item. A entidade mencionada disponibiliza em seu portal eletrônico canal específico de ouvidoria. Os outros consórcios disponibilizam apenas telefone ou contato geral, por essa razão, o critério foi considerado parcialmente atendido.
A não divulgação dos dados referentes a essa dimensão impossibilita que as partes interessadas conheçam as responsabilidades de cada membro do arranjo colaborativo. Qi (2019), ao tratar desse assunto, afirma que a transparência e acessibilidade desses aspectos relacionados à governança colaborativa viabilizam o conhecimento das regras aplicadas a cada participante e do desempenho da colaboração.
Outra constatação é a de que as cadeias tradicionais de responsabilização são alteradas nesses arranjos, o que pode ocasionar uma lacuna na prestação de contas e transparência. Dessa forma, um dos grandes desafios passa a ser garantir a responsabilidade e manter a capacidade de inovação e eficiência na prestação dos serviços (SPICER, 2017).
Tem-se, a partir do que foi exposto, que as informações precisam estar acessíveis para que os cidadãos e usuários dos serviços possam responsabilizar os governos. Segundo Tonelli et al. (2018) isso ocasionaria um reforço na confiança, além de oportunizar maiores benefícios do processo de colaboração.
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Este trabalho investigou o nível de divulgação de aspectos relacionados à governança colaborativa de consórcios públicos intermunicipais, por meio do estudo de consórcios públicos de saneamento localizados no estado de Santa Catarina.
Os resultados apontam que os arranjos cooperativos investigados ainda não divulgam a totalidade dos critérios analisados. A média de divulgação foi de 50,9%, com a identificação de algumas preocupações nas informações evidenciadas pelos consórcios.
Na dimensão de acesso público, verificou-se que apenas uma parcela dos dados está prontamente disponível aos cidadãos. Documentos importantes do arranjo cooperativo, como o protocolo de intenções, estatutos, contratos de rateio e programa, na maioria dos casos analisados, são apresentados de maneira incompleta. Além disso, informações sobre a agenda de reuniões ou convocações para as assembleias e suas respectivas atas também não estão sendo divulgadas por uma parte considerável dos consórcios da amostra.
Já a dimensão que trata de informações sobre responsabilização apresentou uma divulgação média um pouco superior, porém também com alguns problemas, como a não divulgação dos relatórios das atividades desenvolvidas pelos consórcios, quem é responsável pela efetiva prestação dos serviços, ou até mesmo a disponibilização de um canal direto de reclamações para os usuários desses serviços.
Conclui-se assim que a divulgação poderia ser melhorada para fornecer aos usuários do serviço e aos cidadãos informações mais transparentes, tendo em vista que o acesso a esses dados permitiria uma melhor avaliação das decisões dos municípios consorciados, maior clareza da cadeia de responsabilização, e fortalecimento dos aspectos relacionados à governança colaborativa.
Acerca das limitações do trabalho, registra-se o próprio recorte da amostra, posto que o setor escolhido pode ter peculiaridades que tenham alguma influência no resultado e que não foram considerados em virtude do desenho metodológico, ademais, os resultados não permitem generalização. Para trabalhos futuros, sugere-se um estudo de caso com os membros dos consórcios públicos, com a análise de outras dimensões tratadas pela literatura, como governança interna e conduta dos membros, além do estudo de amostras diversas.
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