Artigo 2

1 Universidade Positivo, Brasil, Mestrado em Ciências Sociais , e-mail: paula.boarin@outlook.com

2 Universidade Positivo, Brasil, Doutorado em Administração, e-mail: mromdias@hotmail.com

3 Universidade Estácio de Sá, Brasil, Doutorado em Administração, e-mail: aline8barbosa@gmail.com

4 Universidade Fundação Getúlio Vargas, Brasil, Mestrado em Administração, e-mail: caio.silva@fgv.br

 

Recebido em: 01/10/2020 - Revisado em: 15/11/2021 - Aprovado em: 03/06/2022 - Disponível em: 01/07/2022

Resumo

O objetivo principal deste estudo foi analisar as principais barreiras, motivadores e facilitadores para a internacionalização de mulheres pesquisadoras. Para atingir este objetivo, utilizou-se análise de conteúdo com base em abordagem qualitativa, por meio de entrevistas com roteiro semiestruturado. Foram entrevistadas quinze pesquisadoras que em sua maioria atuam em instituições de ensino superior no Brasil, escolhidas por vivenciarem o fenômeno da internacionalização em suas carreiras. Como principais resultados, destacam-se: (i) as barreiras com o exercício da maternidade, da responsabilização social pela família e dos estereótipos na academia; (ii) os facilitadores como os movimentos sociais, o apoio institucional e familiar e a rede de mentores; (iii) os motivadores como o crescimento e desenvolvimento pessoal e intelectual, os benefícios para terceiros, as oportunidades de carreira e as pressões institucionais. Como contribuição teórica esta pesquisa contribui para ampliar a discussão sobre a internacionalização de pesquisadoras brasileiras no contexto do Brasil. Como contribuição empírica auxilia instituições de ensino ao apresentar um cenário atual que possibilita a compreensão das redes que impedem o melhor aproveitamento das mulheres na academia. Por fim, apresenta-se uma contribuição às mulheres pesquisadoras, para que possam atuar de forma mais consciente em seu campo.

Palavras-chave: Internacionalização do Ensino Superior. Educação Internacional. Estratégias de Internacionalização de Pesquisadoras.

 

 

Abstract

The main objective of this study was to analyze the main barriers, motivators and facilitators for the internationalization of women researchers. To achieve this objective, content analysis was used based on a qualitative approach, through interviews with a semi-structured script. Fifteen researchers were interviewed, most of whom work in higher education institutions in Brazil, chosen for experiencing the phenomenon of internationalization in their careers. As main results, the following stand out: (i) barriers with the exercise of motherhood, social responsibility for the family and stereotypes in the academy; (ii) facilitators such as social movements, institutional and family support and the mentor network; (iii) motivators such as personal and intellectual growth and development, benefits for third parties, career opportunities and institutional pressures. As a theoretical contribution, this research contributes to broaden the discussion on the internationalization of Brazilian researchers in the context of Brazil. As an empirical contribution, it helps educational institutions by presenting a current scenario that makes it possible to understand the networks that prevent the best use of women in the academy. Finally, a contribution is made to women researchers, so that they can act more consciously in their field.

Keywords: Internationalization of Higher Education. International Education. Internationalization Strategies for Researchers.

 

1. Introdução

 

Este trabalho trata como objeto de estudo entender as principais barreiras, motivadores e facilitadores para a internacionalização de mulheres pesquisadoras que atuam em Instituições de Ensino Superior (IESs). Notou-se a importância desta temática quando foram observados os números que refletem a participação da mulher nos mais diversos aspectos profissionais. Percebe-se que no mercado de trabalho tradicional as mulheres possuem considerável representatividade, sendo 44% de acordo com o estudo da Talenses (2018); porém, em cargos de liderança, este número reduz para 18%. Neste sentido, notou-se que tal movimento e tendência também se repete na carreira acadêmica.

No Brasil, avanços significativos da participação das mulheres na academia puderam ser observados nos últimos anos. Conforme uma investigação da Unesco (2015) as mulheres representam 53% dos alunos de bacharelado e mestrado no Brasil. Mesmo quando se apresentam dados mundiais, os números mantem-se desiguais, é o que demonstra estudo realizado pela UNESCO (2016), somente 28% das mulheres acadêmicas atingem o status de ser uma pesquisadora.

Trazer a discussão de gênero para junto do debate sobre a internacionalização é preciso, uma vez que a globalização está mudando o mundo da internacionalização, e a internacionalização está mudando o mundo da educação (KNIGHT, 2004). Knight, autora que trata com recorrência da temática sobre internacionalização acadêmica em um de seus artigos, afirma que a internacionalização da academia promove mudanças e contribuições para a sociedade, extrapolando os bancos escolares. Ainda para Knight (2004), é possível que a internacionalização traga avanços nas áreas sociais, culturais e econômicas. Pode-se afirmar que essa discussão sobre a internacionalização da mulher na academia tem potencial de promover reflexões, debates e respostas que contribuam para transformar o campo científico e promover maior equidade de gênero.

A partir de análises iniciais sobre a temática, verificou-se que homens e mulheres ainda não competem em igualdade por um espaço na carreira acadêmica internacional. Wolfinger (2007), traz o conceito de Leak Pipeline (tubo de vazamento), no qual ele aponta que as divergências de escolaridade entre homens e mulheres e seus cargos perante a academia vão aumentando conforme avançam o nível hierárquico. Um exemplo deste argumento está no Higher Education Authority (2018): na Irlanda, 50% dos bancos universitários são compostos por mulheres, porém somente 24% tornam-se professoras, isso porque, segundo (WOLFINGER, 2007, p.1), “a famílias e os filhos são os responsáveis pelas taxas mais baixas de mulheres ocuparem posição como professora titular”.

Ainda segundo Wolfinger (2007), a carreira acadêmica pode exigir que o profissional saia em busca de recolocação e receba a demanda de mudança de cidade, estado ou até mesmo de país. Assim, a vida familiar pode conflitar com essa demanda. Neste sentido, o mercado entende que mulheres com filho e marido não têm essa flexibilidade, uma vez que a realocação parece ser mais complexa para as mulheres do que para os homens.

Para aprofundar nestas questões, este estudo tem o objetivo de analisar quais são os principais motivadores, barreiras e facilitadores da internacionalização da carreira acadêmica da mulher pesquisadora. Visando atingir o objetivo proposto para este trabalho, desenvolveu-se um estudo qualitativo com base na revisão de literatura sobre Internacionalização da Educação Superior, Internacionalização do Pesquisador, e sobre as principais barreiras, motivadores e facilitadores da mulher pesquisadora.

Por fim, um apoio às mulheres pesquisadoras, foco dessa pesquisa, é apresentando a elas uma perspectiva do tema oriunda de pares iguais e, em seguida, entregando valor para que elas possam atuar de forma mais consciente em seu campo. Porque, muito embora se observe o crescimento e o maior acesso das mulheres às atividades acadêmicas científicas (KELLER, 2006), as chances de sucesso e reconhecimento na carreira ainda são reduzidas (PRADO; FLEITH, 2012). Além disso, busca-se elucidar as possíveis barreiras enfrentadas e possibilitar o aumento do conhecimento dos fatores que podem facilitar seu curso acadêmico em um cenário internacional.

 

 

2. A Internacionalização de Pesquisadores

 

No cenário internacional vale destacar que a internacionalização de pesquisadores é ainda pouco estudada. A literatura acerca da temática aborda temas como a internacionalização do ensino (GAZZONI et al., 2018); da educação (BORGES et al., 2018), internacionalização das Instituições de Ensino Superior (FAORO et al., 2015), mas ainda não há efetivamente estudos que abordem o pesquisador como unidade de análise (ROMANI-DIAS, 2018). Ainda que a internacionalização não seja um novo fenômeno, é muito discutido desde o final do século XX.

De acordo com Diniz et al. (2019) há uma carência de diferentes vieses de análises que abordem a questão de identificação de estruturas institucionais e de comportamentos individuais dos pesquisadores, visando esclarecer o perfil de professores a partir das intervenções das IESs em que atuam. Nota-se que há na academia publicações de estudos empíricos que abordam assuntos relacionados à internacionalização da pesquisa (DINIZ et al., 2019), instituições de ensino superior (DELGADO-MARQUEZ et al., 2011), razões da internacionalização (SEEBER et al., 2016), rankings acadêmicos (FRANÇA; CALDERON, 2018), internacionalização home office (BEELEN; JONES, 2015). No entanto não foram encontrados estudos que abordassem com particularidade sobre a internacionalização de pesquisadores em tempo integral e sobre a carreira acadêmica da mulher pesquisadora.

Para Rostan et al. (2014) o pesquisador é o principal agente do processo de internacionalização das IESs, uma vez que são estes pesquisadores que mantém vínculo com as redes de contato, visando unificar os esforços para alcançar os objetivos estabelecidos, além de complementar suas potencialidades e ter participação nas interações. Além disso, vale notar que a formação das redes e conexões estratégicas podem ser visualizadas pelas instituições como formas de impulsionar a internacionalização das pesquisas com vistas a favorecer diferentes alvos como mobilidade acadêmica, iniciativa de pesquisa e educação colaborativa (KNIGHT, 2007). Além disso, por meio desta rede, os pesquisadores têm a possibilidade de ter participação ativa em congressos, grupos de pesquisas, conselhos editoriais, bancas de mestrado e doutorado, acesso a instituições estrangeiras como professor visitante, além das publicações em journals internacionais (DEWEY; DUFF, 2009; ROMANI-DIAS, 2018).

Neste sentido, nota-se que o pesquisador acadêmico representa para as instituições de ensino um instrumento que pode contribuir para a vivência e persistência na qualidade institucional no processo de internacionalização (FAORO et al., 2015). E ainda, Postiglione e Altbach (2013) apontam que os pesquisadores acadêmicos são peças fundamentais para a estratégia de internacionalização das instituições de ensino uma vez que são professores envolvidos em pesquisas colaborativas em parceria com pesquisados estrangeiros, além de receber estudantes internacionais em sala de aula, realizam publicações em periódicos internacionais.

Sendo assim, a presente pesquisa está centralizada no processo de internacionalização (RAMOS, 2018), uma vez que a mobilidade acadêmica é percebida como um dispositivo que colabora com a pesquisa e com a estruturação das redes. Em complemento, Fiorin (2007) afirma que a internacionalização é a inserção universal que aponta a participação de uma pátria na produção científica mundial.

 

 

2.1. Motivadores, Barreiras e Facilitadores da Internacionalização da Mulher Pesquisadora

O que motiva um estudante a buscar a internacionalização? Em primeiro momento, parecer existir o estímulo que parte como exigência da própria instituição de origem. Miura (2009), em sua pesquisa sobre o processo de internacionalização, constatou o forte desejo de internacionalizar existente também na instituição brasileira e por vezes o estímulo parte das instituições.

De acordo com Miura (2009), os movimentos de globalização forçam as instituições de ensino a buscarem a internacionalização para manter seu valor e aderência a este novo mundo. Tal desejo afeta, por consequência, o estudante. De acordo com Huan (2014), a medida em que a produção de conhecimento se torna uma empresa global e não nacional, as nações devem buscar garantir que as instituições e pesquisadores sejam líderes nessa “indústria globalizada”. Existe uma relação íntima de influência na internacionalização com três variáveis: mercado, instituição de ensino e pesquisador.

O estudo de Nilsson e Ripmeester (2016) aponta que estudar no exterior pode enriquecer as perspectivas da carreira profissional, uma vez que estudar fora do seu país dará ao pesquisador a possibilidade de vivenciar uma experiência de aprendizado na prática. Outro fator interessante é que a habilidade linguística e de comunicação, a experiência cultural e a ampliação de horizontes são motivadores para que o pesquisador busque vencer as barreiras da internacionalização. Um fator de motivação acadêmica também pode ser encontrado entre os pesquisadores que objetivam alcançar um nível elevado de educação de qualidade e alto padrão (MIN et al, 2012). No mesmo sentido, Romani-Dias et al. (2017) obteve em seu estudo a capitação dos motivadores similares representados por melhoria na qualidade da pesquisa; reconhecimento pessoal e institucional; geração de novas oportunidades profissionais; aprendizado devido a internacionalização.

Jung (2014), Vabo (2014) e Huang (2014), em contextos mais amplos, analisando as novas gerações de pesquisadores que tiveram carreira internacionalizadas, concluíram de forma semelhante. Os motivadores similares para a busca pela internacionalização seriam o desejo de obter novas experiências, a ampliação do repertório cultural e a intenção de aumentar a dimensão internacional do ensino e da pesquisa. Ao somar a essa perspectiva a visão da mulher pesquisadora, Arthur et al. (2007) destacou entre os motivadores, a oportunidade e compreensão de uma nova cultura, a melhoria na comunicação com a comunidade internacional e amplitude de visão de mundo. Para os autores, as mulheres também se motivam para a internacionalização por acreditarem que isso trará maior credibilidade e valorização perante a comunidade acadêmica, podendo acarretar crescimento profissional.

Quanto às barreiras para a internacionalização observou-se que elas podem ser compreendidas como fatores intrínsecos e extrínsecos à mulher no contexto acadêmicos. Como barreiras intrínsecas (compreendidas como sendo fatores internos) pode-se citar o medo, a saudade de casa, o estresse, a ansiedade (KWON, 2009). Já como barreiras extrínsecas (compreendidas como sendo fatores externos) observa-se possíveis dificuldades, tais como: a adaptação alimentar no país de destino e condições climáticas (BAKLASHOVA; KAZAKOV, 2016); os problemas relacionados à finanças, questões sobre moradia, trabalho e segurança como um todo (BRADLEY, 2000).

As condições acadêmicas excluem, em seu início, as mulheres que trabalham meio período ou aquelas que dispõem de menos tempo à dedicação acadêmica, como pontuaram Lalande; Crozier et. al (2000); Rostan e Hohle (2014). Para os autores, existe em torno das mais diversas profissões, especialmente em relação à academia, um estereótipo de que o trabalhador adequado é aquele que é casado com a sua profissão. Ou seja, que tem sua dedicação total ao trabalho. Como constatado por Nunes e Casaca (2015), em estudo sobre profissionais expatriadas, espera-se de alguém que deseja carreira internacional, o estereótipo do gestor masculino, isento de responsabilidades familiares e que está totalmente disponível para a vida empresarial e os desafios da mobilidade.

De acordo com Rostan e Hohle (2014), as barreiras de gênero são principalmente visíveis quando há necessidade de dedicação à pesquisa por longos períodos. Assim, torna-se mais viável a internacionalização para mulheres jovens e solteiras. Ainda sobre as questões de estereótipos nesta trajetória, para Teixeira (2014) existe um perfil considerado mais poderoso na academia: é aquele do homem, branco e heterossexual. Logo, todos os demais tipos são suscetíveis a serem prejudicados por causa da não adequação a este padrão desejado.

Ward (2014) e Armenti (2004), apresentaram o quão opressor pode ser para mulher lidar com as pressões sociais de ser mãe e de ser acadêmica, na tentativa de atender demandas típicas da carreira de pesquisadora – por vezes sufocantes e exaustivas – tendo que lidar com muitas pressões internas e externas. A mulher é constantemente pressionada para produzir academicamente e sente-se muito culpada por não exercer a maternidade em sua plenitude (ELLEMERS, 2004; LALANDE; CROZIER et al. 2000).

Para Ellemers et al. (2004); Wolf-Wendel e Ward (2006) e Hogan et al. (2010), a obrigação social atribuída à mulher quanto aos cuidados dos filhos e da família pode ser um fator relevante para a queda de oportunidades da pesquisadora mulher. Esse fator também contribui para a estereotipação da mulher na carreira acadêmica. Para Hogan et al. (2010) e Ellemers et al. (2004), as mulheres podem parecer menos interessantes para os alunos, pois estes acreditam que esta mulher terá menos tempo para se dedicar à pesquisa justamente por causa das suas múltiplas obrigações familiares, mesmo que esse não seja o cenário em que esta mulher esteja inserida.

Este julgamento enfrentado pelas pesquisadoras tem o potencial de afastar mulheres talentosas das carreiras docentes em instituições de nível superior. Isso acontece por causa da suposição implícita de que os papéis de acadêmica e mãe são incompatíveis com esta trajetória (WOLF-WENDEL e WARD, 2006). Importante ressaltar que a este processo não se cria somente com a participação dos homens. Ellemers et al. (2004) demonstraram em sua pesquisa que mulheres mais sêniores na carreira acadêmica são mais atuantes no julgamento das novas mulheres entrantes na carreira acadêmica. Talvez, devido às dificuldades vividas na construção da carreira acadêmica, essas pesquisadoras se identificam com características masculinas, podendo, por vezes, oprimir colegas do mesmo gênero.

A obrigação histórica do cuidado do lar, da família e dos membros idosos parece ser a origem de uma série de outras barreiras que podem prejudicar a carreira da mulher internacionalmente. Clark e Hill (2010), defendem categoricamente que mulheres são menos bem-sucedidas na academia por causa da jornada dupla ou tripla exercida em casa e na sociedade (acadêmica, esposa e mãe). Ellemers et al. (2004), demonstrou em sua pesquisa que, mulheres acadêmicas dedicam mais horas às tarefas domésticas que os homens acadêmicos. Na mesma direção, a pesquisa do IBGE (2018) apresenta resultados que revelam que as mulheres trabalham 18,1 horas por semana em afazeres domésticos e no cuidado de pessoas. Tais números correspondem a quase o dobro da média masculina: eles se dedicam somente 10,5 horas às mesmas atividades.

Intimamente ligada à família, para Arthur et al. (2007), está a tentativa das mulheres em conciliar as propostas de internacionalização a fim de atender as demandas familiares podendo, inclusive, restringir os seus destinos a locais mais próximos e mais favoráveis à mobilidade. Outro fator importante é apontado na pesquisa por Lalande; Crozier et al. (2000), que afirmam existir um hábito repetitivo em algumas mulheres de colocar as necessidades dos outros, especialmente as da família, à frente das próprias necessidades. Revelando uma questão comportamental importante das mulheres nas escolhas diárias feitas por elas.

Nesse sentido, entende-se que cada vez mais a preocupação com as barreiras e motivadores se desdobram em novas necessidades de compreensão para ao avanço no conhecimento sobre os desafios que as mulheres enfrentam na área acadêmica. Diante das possíveis barreiras enfrentadas pela mulher, buscou-se elencar o que pode facilitar sua emancipação social, sua experiência acadêmica e a internacionalização de sua carreira.

 

3. Metodologia

Com abordagem qualitativa, verificou-se um conjunto de estudos sobre a internacionalização da mulher pesquisadora no ensino superior, buscou-se realizar a triangulação de dados para aumentar a cientificidade da investigação proposta. Para tal, realizou-se uma revisão de literatura seguida de uma série de entrevistas em profundidade. Quinze (15) entrevistas foram levantadas a partir de roteiro semiestruturado elaborado com base na revisão de literatura sobre a Internacionalização de Pesquisadores, tendo a mulher no contexto acadêmico como unidade de análise, e foram realizadas durante o primeiro semestre de 2019, sendo realizadas de modo presencial, via telefone e por Skype, com duração média de aproximadamente 60 minutos. O conteúdo das entrevistas foi gravado com o consentimento dos participantes, protegido o anonimato, e então foram transcritos na íntegra para posterior análise.

Para chegar aos entrevistados utilizou-se inicialmente rede direta composta por acadêmicos de algumas das principais IESs do país. Em uma segunda etapa foram entrevistados outros participantes, por meio do método Snowball de seleção de amostras, seguindo os preceitos de Martin e Eisenhardt (2010). Para convidar as pesquisadoras a participarem do estudo, utilizou-se o correio eletrônico e após o aceite dos participantes um novo e-mail foi enviado para a definição do cronograma de entrevistas.

A escolha das participantes da pesquisa se deu com base nos critérios estabelecidos por Romani-Dias (2019), e todas atendiam pelo menos um dos 4 critérios estabelecidos pelo autor para a internacionalização da carreira. O modelo P.R.I.D. é a base; as pesquisadoras podem internacionalizar sua carreira perante quatro vertentes: Place (Local); Relashionship (Relacionamento); Impact (Impacto) e Dissemination (Disseminação). O critérios estabelecidos no modelo P.R.I.D. porque apresentam a ampliação de possibilidades para que a mulher pesquisadora internacionalize sua carreira, no sentido de que não necessariamente ela tenha que estar em determinado local de pesquisa para disseminar seus resultados e dialogar com comunidades estrangeiras, mas também, é possível que o seu trabalho tenha impacto na academia mesmo quando ela está “em casa” propagando sua pesquisa por meio do relacionamento construído durante sua trajetória. Esses fatores são importantes para o perfil escolhido por possibilitar novas visões e estratégias para a mulher, já que se pode observar a presença de exigências impostas pela sociedade à figura feminina.

Para chegar até o perfil escolhido utilizou-se os seguintes critérios: (I) ser pesquisadora em tempo integral, (II) cursar ou ter cursado o período no exterior em nível de mestrado, doutorado e pós-doutorado, (III) atuar em Instituições de Ensino no Brasil e (IV) ter publicado fora do país. Vale destacar que quatro participantes concluíram mestrado e/ou doutorado fora do país. Com isso, identificou-se os relatos de pesquisadoras de diferentes áreas sendo: administração, transição tecnológica para sustentabilidade, engenharia, linguística, negócios internacionais, direito internacional, farmacêutica, educação, psicologia, bioquímica. Visando conhecer a trajetória acadêmica das entrevistadas, o roteiro semiestruturado foi adotado como base para conduzir a pesquisa. O objetivo principal foi extrair das participantes além dos principais insights que emergiram da experiência internacional, o conhecimento de suas principais percepções sobre as barreiras, motivadores e facilitadores do processo de internacionalização da mulher no contexto acadêmico.

 

3.1. Coleta dos Dados

Visando alcançar o objetivo proposto para essa pesquisa, um roteiro semiestruturado foi elaborado com elementos que emergiram como resultados da revisão de literatura realizada anteriormente. No intuito de abordar três dimensões importantes para a pesquisa, o roteiro foi estruturado na seguinte lógica: (a) a trajetória acadêmica das entrevistadas; (b) as percepções sobre o significado de internacionalização, bem como se dá a atuação da mulher pesquisadora no âmbito acadêmico (MIURA, 2009; JUNG,2014); (c) especificamente, as principais barreiras, motivadores e facilitadores para a internacionalização da instituição de ensino superior que atua, e quais são os impactos que essas dimensões apresentam no processo de construção da carreira acadêmica feminina. Estas dimensões de barreiras, motivadores e facilitadores, foram definidas à partir da literatura utilizada no referencial teórico, tais como: Linehan e Walsh (1999); Armenti, 2004; Matos (2006); Arthur et al. (2007); Bozeman (2011); Huang (2014); Rostan e Hohle (2014); Jung (2014); Vabo (2014); Stanisçuask (2018), conforme Quadro 1.

O roteiro foi elaborado com foco em duas principais seções: (i) questões espontâneas que possibilitaram à entrevistada liberdade para expressar as percepções sobre os benefícios e as limitações da experiência de estudar em outro país; (ii) questões específicas, que conduziram a participante a fornecer elementos importantes para que o objetivo do presente trabalho fosse alcançado.

 

3.2. Análise dos Dados

 

Após a realização das entrevistas e sua respectiva transcrição, analisou-se os dados que emergiram a partir das experiências relatadas, por meio da técnica de análise de conteúdo. Trata-se de uma técnica de pesquisa que busca trabalhar com a palavra e permite de forma prática e objetiva a produção de inferências do conteúdo da comunicação de um texto replicável ao contexto social (CAREGNATO; MUTTI, 2006).

A proposta de Bardin (2011) foi utilizada seguindo as seguintes etapas: (1) organização do material utilizado com a elaboração de perguntas, das entrevistas, organização das transcrições; (2) exploração do material (codificação dos dados); (3) elaboração de categorias. Seguindo estes passos, mediante as nossas interpretações dos resultados coletados, verificou-se as categorias de análise mais importantes para o estudo, conforme as orientações de Glaser e Strauss (1967). Note-se que esse procedimento permite o estabelecimento da confiabilidade dos resultados (LINCOLN; GUBA, 1985). Destacou-se que houve um critério rigoroso para o controle de como os dados foram coletados, codificados, classificados e analisados, seguindo os preceitos de Miles e Huberman (1994).

Para codificação dos dados foi considerada a metodologia de codificação aberta proposta por Locke (2001), por meio da identificação de conceitos-chave para a análise e, em seguida, verificou-se que a relação entre tais conceitos, formando grupos de categorias e subcategorias de acordo com sua natureza e propriedade (CORBIN; STRAUSS, 2015). Após constatar a consistência dos dados que emergiram dos discursos, identificou-se as categorias que, neste estudo, foram relatadas principalmente a partir das experiências vividas.

Dessa forma, chegou-se aos resultados e à discussão por meio do retorno à literatura sobre os assuntos abordados neste estudo.

 

4. Resultados e Discussão

Em análise de literatura, encontrou-se, como principais motivadores para a internacionalização a expectativa de crescimento profissional, de benefícios para terceiros, como estudantes, instituição em que atua e sociedade em geral, e desenvolvimento pessoal. Jung (2014); Vabo (2014); Huang (2014) em contextos mais amplos, analisando as novas gerações de pesquisadores que tiveram carreira internacionalizadas, identificaram o desejo de obter novas experiências, a busca por ampliar o repertório cultural, intenção de ter dimensão internacional do ensino e da pesquisa. Ao somar a essa perspectiva a visão da mulher pesquisadora Arthur et al. (2007) destacou entre os motivadores: a oportunidade e compreensão de uma nova cultura, melhoria na comunicação com a comunidade internacional e amplitude de visão de mundo. Esses traços foram confirmados nas entrevistas realizadas.

Verificou-se que há mais estudos que contemplam as dificuldades das mulheres na internacionalização de suas carreiras que em relação aos motivadores e facilitadores. Uma das explicações para esse cenário, seja porque as barreiras comecem até antes da etapa de internacionalização. Há, em um primeiro momento, um descompasso do tempo da academia e do tempo da maternidade. Ponto considerado por Ward (2014) e Staniscuask (2018) sobre o caminho de preparação para a carreira acadêmica (que envolve muitos anos de dedicação) e o relógio biológico para ser mãe soarem ao mesmo tempo. A mulher passa a ser apta a ocupar uma vaga de docente próximo aos 35 anos e as etapas de vida tendem a gerar conflitos na existência e estilo de vida dessa mulher.

Ward (2014); Armenti (2004) apresentaram em suas pesquisas o quão opressor pode ser para mulher lidar com as pressões sociais de ser mãe e de ser acadêmica, na tentativa de atender demandas típicas da carreira de pesquisadora, por vezes sufocantes e exaustivas, tendo que lidar com muita pressão interna e externa. A mulher é constantemente pressionada para produzir academicamente e sente-se muito culpada por não exercer a maternidade em sua plenitude (ELLEMERS, 2004; LALANDE, CROZIER, e DAVEY, 2000).

Temos aqui um destaque para a conciliação de múltiplos papéis, com grande ênfase para a dificuldade em conciliar os múltiplos objetivos pessoais e profissionais:

Eu fui sozinha (para o doutorado sanduíche). Aí por causa disso eu tive que reduzir um pouco o tempo da minha permanência lá. Para Israel fui sozinha, foram quase seis meses. [...] Eu abri mão de muita coisa na minha trajetória, Dia das Mães, aniversário de casamento, muita coisa. Denia

Em análise de literatura, entre os principais facilitadores destacados pelas pesquisadoras estão os relacionados à instituição em que atuam e ao próprio sistema familiar: políticas e estruturas que contribuem para o desenvolvimento da maternidade; assim como o apoio do familiar como contemplam Lalande, Crozier e Davey (2000); Wolf-Wendel e Ward (2006); Clark e Hill (2010); Bozeman e Gaughan, (2011); Ward (2014). Construir uma rede de mentores também parece ser um caminho interessante para potencializar a internacionalização da mulher.

Eu tive sim um mentor. O meu orientador, (nome ocultado), foi meu orientador do mestrado e doutorando. Sempre me apoiou nestas coisas. Agora estamos editando um livro juntos. Ele sempre foi uma pessoa que confiei muito. Sempre me colocou muito pra frente. Marilisia

Contudo, algumas pesquisadoras como Andreia (50), Silvana (55) e Yasmin (65), retrataram que não tiveram essa figura em sua carreira. Possivelmente, pelo fato de a internacionalização estar mais disseminada atualmente e, por consequência, haver um incentivo maior para a configuração deste papel (de mentor), como também pelo fato destas pesquisadoras terem sido pioneiras em seus contextos, como relata Andreia:

Não tive mentores de carreira. Eu acabei sendo pioneira e acabei ajudando muita gente. Em 2009 quando eu comecei no programa mestrado eu passei a ajudar muita gente porque tinha começado minha internacionalização pouco tempo antes. Andreia

Um fator que apareceu como potencial facilitador em algumas entrevistas foi a utilização de bolsas de estudos, que por sua vez são fundamentais para o processo de internacionalização, visto que o investimento para estudar fora do país de origem é alto e pode estar longe do alcance de muitos pesquisadores. Foi o caso de Márcia, que teve uma vivência internacional bastante enriquecida com o auxílio de bolsas de estudos de programas europeus:

Meu processo de internacionalização começou graças a um projeto Europeu que se chama Programa de Formação Permanente e Programa Erasmus. Esse programa oferece a todos os estudantes nas universidades espanholas a oportunidade de fazer um ano de estudos em outra universidade Europeia. Márcia

No Brasil, as condições de concessão de bolsas de estudo e políticas de internacionalização das instituições de ensino parecem para algumas pesquisadoras menos acessíveis. O potencial facilitador pode se converter em barreira. A questão apareceu no discurso das entrevistadas em diversos momentos em sentidos ambíguos: “é um facilitador”; “antigamente havia mais incentivo”.

Tinham bolsas, existia práticas do governo, tinha tanto de investimento para o mestrado quanto para o doutorado. As políticas eram boas dependendo do ano, pois havia cortes de verbas, agora estamos em um processo federal em que estão cortando tudo. Yasmin

Entende-se que tomar uma decisão pela internacionalização a mulher precisa ter consciência de que escolheu essa opção e, por isso, deverá buscar planejamento adequado, especialmente financeiro, para que atingir seus objetivos. Este elemento aparece como achado na pesquisa, pois não foi contemplado com ênfase nos estudos da literatura, não sendo categorizado enquanto facilitador. Contudo, supõe-se que pode ser um reflexo da realidade brasileira.

Em sentido contrário à motivação intrínseca, encontrou-se na análise dos dados coletados nas entrevistas um aspecto que chamou a atenção, tornando-se mais um fator de motivação para a internacionalização. É o caso da demanda exigida pelas instituições de ensino a que os profissionais estão vinculados, ou pelas agendas de pesquisa em cada área de atuação, como pontuaram Eliane, Inácia e Silvana. Elas retrataram em suas falas a oriunda da necessidade de se manterem competitivas no “mercado de ensino superior”.

Vale destacar que este aspecto foi identificado no estudo de Miura (2009); quando uma instituição de ensino possui a internacionalização como estratégia de posicionamento, a demanda dada aos professores pode resultar em exigência de experiência internacional para se manter ativo na instituição. Sendo assim, pode-se notar nas falas de Eliane, Inácia e Silvana que este é um aspecto presente na realidade acadêmica brasileira: “Internacionalizar na verdade, é uma necessidade. Na minha área, as melhores publicações e artigos estão fora do país. Vejo como uma questão obrigatória (Eliane)”; “Pensei na concorrência, pensei na carreira, pensei que eu teria mais vantagem competitiva na carreira pública (Inácia)”; “Há muito tempo nós fazemos isso por cobrança acadêmica. Durante a maior parte do tempo nós somos obrigados para ter currículo, para poder aprovar projeto e passar em um concurso (Silvana)”.

Miura (2009) abordou o contexto brasileiro em sua pesquisa; pode-se imaginar que esse fator não tenha sido contemplado em outros estudos, pois refletem critérios e a cultura local, principalmente das universidades públicas – que exigem das concursadas um currículo que possuam publicações e vivências internacionais como um dos critérios de aprovação.

O estereótipo relacionado à gênero ainda afasta mulheres de discussões em áreas mais masculinas, conforme constatado em entrevistas, confirmou-se o receio apontado pela literatura de viajar e se expor a realidades e culturas em que a participação da mulher é ainda muito limitada socialmente (HOGAN et al., 2010).

A cobrança social pela opção não de ter filhos e até mesmo constituir família, assim como a dor do julgamento por ser mãe e esposa deixando sua família e sair em busca da realização profissional destacaram-se como pontos principais. Parece que de fato, é o exercício da maternidade que mais afasta a mulher do exercício de sua carreira e da sua internacionalização enquanto pesquisadora (ELLEMERS, 2004; LALANDE; CROZIER et al. 2000). Verificou-se que a questão da maternidade teve consistente convergência com a literatura, especificamente na conciliação de múltiplos papéis e a dificuldade de fazê-lo em paralelo ao exercício da carreira internacional. Yasmin é um exemplo, teve a oportunidade de internacionalizar com seu marido (também pesquisador) e com os filhos, mesmo podendo ser este um facilitador, ela relatou sentir mais atribuições e responsabilidades pelo exercício e cuidado do lar:

O (nome do marido ocultado) saia de manhã e voltava à tarde; eu tinha que sair e levar as crianças para a escola, depois ia fazer a pesquisa. Saía correndo da pesquisa, buscava as crianças e à noite tinha que trabalhar em casa […]. (Yasmin)

Nota-se que é atribuído à mulher uma grande responsabilidade social, ao invés da divisão dos papéis e responsabilização pela casa e pelos filhos. No caso de Yasmin, embora tenha um companheiro que tenha o mesmo exercício profissional que ela, diferente do esposo, sua função não termina no portão da instituição, mas quando vai para casa a missão de zelar pela casa e pela família continua. Esta barreira afeta o exercício da carreira e da internacionalização. Por existir essa responsabilização social atribuída à mulher da criação dos filhos, existe por consequência um julgamento externo pelo fato de deixarem suas casas em busca de um sonho (mesmo que a realização deste sonho traga benefícios para todos). As falas de Denia e Miriana ilustram esse cenário enfrentado pelas mulheres pesquisadoras: “[...]você sempre será julgada, as pessoas vão dizer que você é “desnaturada”. Vão dizer, “como você tem coragem de deixar a criança. (Denia)

[...] Minha mãe não aceitava que eu fosse e deixasse o meu marido. Como eu tenho dois filhos homens e meu marido[...] Eu acredito que se fosse o homem, seria mais fácil que a família fosse junto. Muitas colegas minhas não foram (para fora do país) porque em termos familiares não conseguiram. Miriana

O relato de Denia e Miriana convergem para o que foi encontrado na literatura por Lalande; Crozier et. al (2000). Para os autores a mulher acadêmica geralmente sofre o julgamento social por não estar totalmente dedicada a família.

Maternidade e carreira, podem ser barreiras intransponíveis para a internacionalização (CLARK, HILL, 2010), este fato confirmou-se no relato de algumas das entrevistadas. Contudo, em outros casos encontrou-se planejamento e estratégias envolvendo toda a família no processo como aconteceu com Andreia e Yasmin. Notou-se nestes casos que a maternidade não foi um problema para a internacionalização principalmente das pesquisadoras mais jovens e daquelas cujo companheiro também partilha da mesma profissão ou ainda partilha do desejo profissional de internacionalização: “Não tive problemas, meu marido também tem carreira internacional (executivo de T.I.). Meus filhos já eram grandes, o que mais pesou era o investimento. Fazer revisão do inglês, investir nas viagens (Andreia)”; “Meu marido é do mundo acadêmico, quando o cônjuge é de outra profissão não entende bem, até explicar [...]. Minha filha mais nova foi junto com quatro anos, a logística da família já estava junto com isso, tudo com mesmo foco (Yasmin)”.

Entende-se que para Andreia as barreiras como o investimento financeiro e a habilidade com o idioma (inglês) tiveram mais peso no processo de internacionalização do que a responsabilidade social sobre a manutenção da família e por isso, em suas palavras se pôde notar certa leveza para a realização do processo.

O Quadro 1 trata da síntese da discussão da literatura com os achados da pesquisa.

Quadro 1 – Dimensões da internacionalização

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Fonte: Elaborado pelos autores, com base na pesquisa, (2020).

Nota-se ainda que os apoios institucionais e políticos apontados para a formação de redes de compartilhamento, os financiamentos previstos pelas políticas públicas e institucionais apontados como facilitadores na literatura não emergem no campo empírico visitado, conforme relatado pelas pesquisadoras entrevistadas a concessão de bolsas de estudo, por exemplo, estão bastante reduzidas no contexto brasileiro o que tende a dificultar o processo de internacionalização de muitas outras mulheres que gostariam de avançar neste sentido.

 

5. Considerações Finais

O objetivo deste trabalho foi analisar quais são os principais motivadores, barreiras e facilitadores da internacionalização da carreira acadêmica da mulher pesquisadora. Como principais motivadores identificou-se por meio da literatura que as oportunidades profissionais, desenvolvimento pessoas e benefícios para terceiros foram de encontro com os relatos das entrevistadas. A metodologia permitiu alcançar os objetivos propostos, especialmente o método Snowball de seleção de amostras, seguido pela análise sistemática do conteúdo para categorização dos dados.

Encontrou-se tanto na literatura como no conteúdo das entrevistas aspectos característicos de barreiras para a internacionalização, especialmente quando se fala da discrepância entre os gêneros masculino e feminino em praticamente todas as questões que envolvem a discussão como diferença salarial, ocupação dos cargos de alto escalão, discriminação por ser mulher, por ser jovem e independente. Independentemente da idade escolhida para a internacionalização parece que todas as entrevistadas sofreram em algum nível dificuldades por serem mulheres.

Como principais achados da pesquisa, destacam-se que as dificuldades com o exercício da maternidade, responsabilização social pela família, estereótipos dentro da academia são barreiras para a internacionalização da carreira de mulheres pesquisadoras. Enquanto os facilitadores encontrados são: os movimentos sociais, o apoio institucional e familiar e a rede de mentores. Com relação aos motivadores, percebeu-se: o crescimento, o desenvolvimento pessoal, os benefícios para terceiros, as oportunidades de carreira, as pressões institucionais e as necessidades pessoais/profissionais. Diante do que foi coletado em entrevista, pontos de convergência e divergência, pode-se notar que o caminho se torna um tanto mais difícil para as mulheres que desejam estruturar suas carreiras e conciliar com a sua vida pessoal. Especialmente diante da opção de construir uma família, constatou-se na fala das entrevistadas limitadores, e até mesmo a ideia sobre a necessidade em escolher entre uma carreira e o exercício da vida pessoal.

Como contribuições desta pesquisa, destacam-se a temática, aumentando a profundidade dos dados por meio dos relatos dos entrevistados e trazendo, a partir das perspectivas dos pesquisadores brasileiros, insights sobre o contexto de outros países. A segunda contribuição é dirigida às instituições de ensino, por meio da apresentação de um cenário de dados atuais que possibilitam a compreensão das redes que impedem o melhor aproveitamento das mulheres na academia e possibilitam lidar com causas e problemas. Por fim, verifica-se uma contribuição às mulheres pesquisadoras, para que possam atuar de forma mais consciente em seu campo, e com claro acesso às possíveis barreiras enfrentadas, conhecendo também aqueles fatores que podem facilitar sua carreira acadêmica em um cenário internacional.

Em relação as limitações teóricas, entende-se que devido ao baixo número de estudos realizados anteriormente não possibilitaram a ampliação da revisão teórica acerca das categorias selecionadas verificação neste estudo.

Como oportunidades de estudos futuros sugere-se uma análise aprofundada sobre as percepções das mulheres pesquisadoras sobre a internacionalização em países específicos. Outra oportunidade é a realização de um estudo sobre as percepções das mulheres pesquisadoras ao concluírem a formação no exterior e o retorno ao país de origem (como se dão as relações pessoais e sociais). Outra possibilidade possível para estudos futuros é colocar a perspectiva racial em relação a temática, das 15 entrevistadas nenhuma delas era negra. Por fim, estudos podem investigar as estratégias de internacionalização no ensino superior entre países de diferentes continentes e com um número maior de amostras.

 

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