Administração financeira aplicada em empresa de médio porte do setor de agronegócio por meio da gestão de projeto
Financial management applied in a medium-sized company in the agribusiness sector
through project management
Roberto Rodrigues1
1 Universidade Presbiteriana Mackenzie, Brasil, Doutorando em Administração, e-mail: roberto@rrlifeconsultoria.com.br
Recebido em: 06/11/2021 - Revisado em: 16/12/2021 - Aprovado em: 22/12/2021 - Disponível em: 01/01/2022
Resumo
Em decorrência das especificidades do setor de agronegócio, essa pesquisa teve como objetivo principal analisar o quanto a gestão de projetos pode auxiliar nos processos voltados à administração financeira de uma empresa de médio porte no setor de agronegócio. O método utilizado foi estudo de caso único, e a principal técnica de coleta de dados foi observação participante. Dados empíricos evidenciam que a adoção da prática de gestão de projeto aliada à administração financeira pode favorecer os resultados organizacionais, sobretudo financeiros. Fatores como cultura, crença, formação profissional e acadêmica, ao lado de regras estabelecidas pela empresa tendem a influenciar na aplicabilidade da gestão de projeto e nos indicadores financeiros. Todavia, fatores de resistência, trazidos em parte pelo desconhecimento acerca do projeto e pelo perfil profissional inadequado podem comprometer ou retardar a aplicabilidade da gestão do projeto. Paralelamente, aspectos de infraestrutura, aparato tecnológico e a integração das áreas envolvidas também são relevantes e podem representar um diferencial, tanto para a prática, como para o resultado do projeto. Esse estudo torna-se de relevante contribuição, pois as implicações gerenciais vão desde a possibilidade de eleger meios e processos para a implementação ou melhoria das práticas voltadas à mitigação e gestão dos riscos corporativos, sobretudo financeiro; enquanto as implicações acadêmicas vão desde a provocação e estímulos a novas pesquisas no setor de agronegócio, e nele, a gestão financeira, gestão de projetos e gestão de riscos corporativos.
Palavras-chave: Agronegócio, Administração Financeira e Gestão de Projetos.
Abstract
Due to the specificities of the agribusiness sector, this research aimed to analyze how project management can help in the processes aimed at the financial administration of a medium-sized company in the agribusiness sector. The method used was a single case study, and the main data collection technique was participant observation. Empirical data show that the adoption of project management practice combined with financial administration can favor organizational results, especially financial ones. Factors such as culture, belief, professional and academic training, along with rules established by the company tend to influence the applicability of project management and financial indicators. However, resistance factors, brought about in part by lack of knowledge about the project and inadequate professional profile, can compromise or delay the applicability of project management. At the same time, aspects of infrastructure, technological apparatus and the integration of the areas involved are also relevant and can represent a differential, both for the practice and for the result of the project. This study is of relevant contribution, as the managerial implications range from the possibility of electing means and processes for the implementation or improvement of practices aimed at mitigating and managing corporate risks, especially financial; while the academic implications range from provocation and encouragement to new research in the agribusiness sector, and within it, financial management, project management and corporate risk management.
Keywords: Agribusiness, Financial Administration and Project Management.
1. CONTEXTO DA REALIDADE INVESTIGADA
O mundo corporativo é movido a desafios e superações, e nele, as mudanças provocadas pela influência da globalização, pela internet das coisas e pelo avanço tecnológico (PORTER & HELPELLMANN; 2014); mas também as questões político-econômico-financeiras, ao lado dos aspectos comportamentais, estratégicos, operacionais e socioambientais são, evolutivamente, considerados fatores críticos de sucesso para as empresas.
Nota-se ainda constante evolução, a qual tem favorecido ou até mesmo provocado a competitividade entre as empresas, bem como o uso correto e contínuo da criatividade e inovação, como forma de superação aos desafios organizacionais (MEGIDO; 2003).
Nesse sentido, alguma das questões bastante discutidas e estudadas no ambiente corporativo, bem como no âmbito acadêmico são os aspectos relacionados à forma de gerir os negócios, e, se essa gestão é desempenhada de maneira integrada, pois, para alguns autores o que se observava até a pouco tempo nas empresas é uma interface e não uma integração (HYPOLITO; PAMPLONA, 1999). Porém, há estudos contemplando e considerando algumas premissas fundamentais para o desempenho empresarial, integrando diversos fatores, como: a comunicação, recursos financeiros, tempo, setores, pessoas, objetivos e outros (OLIVEIRA, 1992), (QUEIROZ, 2006) e (MULLER, 2014), quando afirmam que na gestão empresarial moderna, não é mais suficiente gerenciar a empresa como um objetivo específico, pois é preciso gerenciar o negócio da empresa, envolvendo fatores, influências, recursos (físicos, financeiros e humanos) e variáveis externas e internas.
As empresas são consideradas organismos vivos, dinâmicos e carecem de constantes observações: correções de rotas, incitações estratégicas, retrações mercadológicas, adoção de novas condutas e de novos recursos e assim por diante. Com tanto dinamismo e desafios, organizar-se de forma a adotar um modelo de negócio que permita realizar suas atividades e cumprir com seus objetivos de maneira eficaz torna-se de fato elementar e decisivo. Nessa linha de raciocínio cada desafio é posto como um projeto específico.
Interessantemente, mesmo observando que o termo “projeto” é bastante utilizado - não somente em negócios corporativos, mas também na vida pessoal – todavia, verifica-se que a consecução e a gestão sobre o mesmo não são tarefas simples.
Ciente disso, insta comentar sobre o setor econômico do Agronegócio ou Agribusiness, o qual é desenvolvido essencialmente sob a forma de projetos, entretanto, com maior evidência na área agrícola (preparação do solo, escolha de variedades e sementes, plantio, manutenção, colheita e comercialização). Também pelas características de atividades desempenhadas ciclicamente nos seus subsetores ou segmentos (agropecuária, agricultura, suinocultura, horticultura, e outras atividades), as quais consomem tempo, recursos materiais, recursos financeiros, recursos tecnológicos, recursos humanos, planejamento, estabelecimento de parcerias e outros aparatos.
No setor agro os resultados alcançados beneficiam a economia brasileira em patamares consideráveis, pois contribuem com grande parte da riqueza gerada no país: seja através do produto interno bruto – PIB (cerca de 25%), da balança comercial – BC (acima de 40%) e na geração de empregos diretos e indiretos (cerca de 20 milhões de postos de trabalho nos últimos anos), como revela o MAPA (2018).
Além dos positivos resultados que nos apresenta o setor de agronegócio, alguns axiomas o distinguem dos demais setores econômicos brasileiros: como a sazonalidade operacional, os estágios cíclicos produtivos, as ações de curto prazo visando cumprir com demandas de médio e longo prazos; exigindo, portanto, diferentes formas de gestão.
Assim, em consonância com essas revelações acerca do tema em epígrafe, torna-se interessante analisar o quanto a gestão de projetos pode interferir e auxiliar nos processos voltados à administração financeira de uma empresa de médio porte no setor de agronegócio.
2. EMBASAMENTO CIENTÍFICO
O referencial teórico desta pesquisa foi constituído com base no estudo exploratório em três dimensões: Agronegócio, Administração (Financeira) e Gestão de Projetos.
O primeiro eixo teórico consiste em apresentar um breve panorama sobre o setor foco do trabalho, o Agronegócio. Já no segundo eixo teórico foram trazidos alguns aspectos relacionados aos conceitos e aplicabilidade da Administração Financeira; consolidando o trabalho no terceiro eixo teórico da pesquisa com a temática Gestão de Projetos.
Setor Agronegócio ou Agribusiness:
O termo “agribusiness” deriva dessa constatação feita por eles (GOLDBERG & DAVIS, 1957), os quais afirmaram que o agronegócio é “o conjunto de todas as operações e transações envolvidas desde a fabricação dos insumos agropecuários, das operações de produção nas unidades agropecuárias, até o processamento e distribuição e consumo dos produtos agropecuários ‘in natura’ ou industrializados.
Já BATALHA (2002) dizia que o agronegócio ou agribusiness é o conjunto de negócios relacionados à agricultura dentro do ponto de vista econômico.
Para CALLADO (2006), o agronegócio é um conjunto de empresas que produzem insumos agrícolas, as propriedades rurais, as empresas de processamento e toda a distribuição.
Atualmente o agronegócio é considerado o setor que mais tem impactado positivamente nos resultados do Brasil, o qual - em função da magnitude deste setor – tornou o país em um dos maiores players mundiais em produção de alimentos e outros derivados agropecuários. Ainda é denotado diversos indicadores positivos e favoráveis à economia, advindos de atividades relacionadas a serviços, tecnologia e pesquisa no âmbito socioeconômico brasileiro.
Administração:
Basicamente tudo na vida moderna é administração. Na maioria dos ambientes em que vivemos, as coisas estão organizadas de acordo com princípios administrativos. Os trabalhos realizados por duas ou mais pessoas, que tenham graus de poder diferentes em relação à sua execução, contém elementos de administração (RAYMUNDO, 1992).
Conforme SOUZA ET AL (1988) “a administração é uma ciência e também uma arte. Ciência porque possui um referencial teórico próprio, passível de ser tratado pelo método científico. E arte porque inclui, na resolução dos problemas que surgem na condução das organizações, habilidade, sensibilidade e intuição”.
As funções administrativas são responsáveis por avaliar os cenários, integrar, direcionar os esforços dos indivíduos e unificar os interesses coletivos e individuais; tudo isso a fim de alcançar as metas pretendidas pela organização.
Henri Fayol deu início às funções básicas da administração, denominada POCCC - planejar, organizar, coordenar, comandar e controlar. Essas funções também foram defendidas por Frederick Taylor, Henry Ford e Max Weber. Evolutivamente, Peter Drucker – considerado o pai da administração moderna - sintetizou as definições das funções da administração, de forma a adotar a sigla PODC – planejar, organizar, dirigir e controlar. Henry Mintzberg contrapôs essas definições, por acreditar que seria necessário atribuir papeis processuais e funções de comando nas empresas.
A conceituação da administração voltada aos processos agropecuários revela ser o ramo da economia rural que estuda a organização e administração de uma empresa agrícola, visando o uso mais eficiente dos recursos para obter resultados compensadores e contínuos (HOFFMANN et al 1989), e ainda, segundo esse outro autor é um ramo da ciência administrativa que estuda os processos racionais das decisões e ações administrativas em organizações rurais (ANDRADE, 2001).
Administração Financeira:
O sucesso ou fracasso empresarial pode estar relacionado a vários fatores, e é praticamente impossível, ao mesmo insensato afirmar que, aquilo que pratica hoje é garantia de que funcionará adequadamente amanhã. O dinamismo do meio organizacional e empresarial – dado a influência de vários fatores externos e internos – praticamente não possibilita afirmar ou garantir o sucesso, ao mesmo de forma perene.
Existem inúmeras reflexões acerca da administração ou gestão financeira nas empresas. Dentre elas, alguns conceitos consideram a vitalidade dos negócios empresariais quando relacionados a equilíbrio financeiro, qualidade de vida e perenidade de resultados, os quais devem ocorrer através da busca e engajamento pela continuidade das organizações - não somente da lucratividade - mas, também, salientando a ideia de que pessoas eficientes constroem uma empresa eficaz (MIRANDA, AVELINO e TAKAMATSU, 2016).
CALLADO E CALLADO (1999) já traziam uma reflexão bastante assertiva quanto à gestão financeira – ainda que bastante focada em custos, sobretudo no setor agronegócio, de forma que eles argumentavam que a eficácia do setor - sob o ponto de vista de rantabilidade e competitividade - necessitava direcionar a administração para a obtenção de informações relevantes: contábeis, financeiras, processos administrativos e de produção.
BERK E DEMARZO (2010) questionam os motivos pelos quais se deve estudar as finanças empresariais, de forma que eles também respondem à própria indagação quando relatam que é essencial compreender o porquê e como são tomadas as decisões financeiras nas empresas.
HIGGINS (2014), no entanto, relata que em nenhum lugar a análise financeira é mais importante do que no âmbito das empresas, independentemente do ramo ou porte das organizações; pois caso aqueles que administram os negócios possuam essa capacidade analítica, eles podem diagnosticar os males de suas empresas, além de prescrever as correções e antecipar as consequências financeiras.
SCHUSTER e FRIEDRICH (2017) concluem que, para as necessidades de melhorias na gestão financeira, sobretudo, pois cerca de 75% das empresas com problemas organizacionais apresentam como maior dificuldade a gestão financeira.
Já no setor de agronegócio, HOFER et al (2006) comenta que devido as incertezas provocadas pela volatilidade do dólar (câmbio) e pela variabilidade climática - os quais afetam diretamente o produtor rural e obviamente influencia os demais elos da cadeia de negócios deste setor – as empresas precisam partir da premissa de que é necessário encontrar meios que favoreçam a redução de custos, evitar desperdícios, melhorar o controle e planejamento das atividades e possibilitar a geração de informações precisas e oportunas.
Essa reflexão quanto a administração financeira e o reflexo nos resultados corporativos, principalmente no setor de agronegócio, torna-se ainda mais consistente e relevante, considerando o envolvimento de todos os elos na empresa (pessoas, processos, objetivos). Tanto que, esse autor afirma que não importa o tamanho do investimento ou o nível de tecnologia se não houver pessoas capazes de utilizá-los em benefício da organização (DOS SANTOS; CODA; MAZZALI, 2010).
Gestão de Projetos:
Projeto é toda atividade, que de forma única e com prazo e escopo definidos, deve ser conduzido por pessoas, possuindo necessariamente um início e um fim, com vista a atingir os resultados estabelecidos; definição pactuada por MENEZES (2001).
Torna-se curioso mencionar que, apesar de a gestão de projetos ser considerada uma ferramenta de grande auxílio na condução de negócios, mas nem sempre as metas são alcançadas (JUNIOR e PLONSKI, 2011).
Segundo CLELAND (1994) as organizações precisam conviver - de forma incansável - a realidade incontestável quanto às inúmeras mudanças provocadas pela tecnologia, pelas evoluções em produtos e processos, bem como pelos ciclos de vida de serviços cada vez menos duradouros.
A variação dos resultados, obtidos através do mecanismo utilizando a abordagem de gestão de projetos podem ser classificados sob duas formas: predominantes ou tradicionais e adaptativas. Se por um lado a abordagem tradicional refere-se à execução de projetos em cenários considerados estáveis e previsíveis; já na abordagem adaptativa os projetos são considerados distintos e que a gestão de cada um é adaptada para reduzir as diferenças entre eles. Essa posição é defendida e ainda mais aprofundada por (JUNIOR e PLONSKI, 2011 apud WILLIAMS, 2005; MAYLOR, 2001).
Refletindo a esse respeito, cabe considerar dois pontos importantes nessa pesquisa: que no mundo corporativo cada empresa é única, pois possui particularidades e algumas regras próprias, como (visão, missão e valores), ou pelo menos deveria possuir; e que no de setor agronegócio as atividades operacionais por sua natureza e especificidades são consideradas projetos isolados - isso porquê essas atividades necessitam renovar a cada ano (com cenários, recursos, parceiros, pessoas, processos) – verificando assim que a abordagem adaptativa poderia ser a mais adequada.
Na busca por identificar procedimentos aplicáveis em projetos voltados à empresas do setor de agronegócio, alguns pontos trazidos nos estudos de (SHENHAR e DVIR, 2007) se apresentam verossímeis, pois eles interagem em vários tópicos, perfazendo-se no ciclo de vida de um projeto. Essa constatação se dá à medida em que pode ser verificado, sobre as empresas do setor agronegócio, já que as atividades operacionais desenvolvidas consistem na interface com fornecedores e parceiros, aquisição de sementes, aquisição de insumos, plantios, colheitas, estocagem, operações de barter ou trocas, operações de travamento de preços, vendas e transações comerciais, industrialização, gestão de pessoas, processos, gestão financeira, operações, entre outras atividades.
Assim, considera-se que, para todas as atividades acima citadas há pontos de congruência com alguns dos tópicos apresentados no quadro 01.
Quadro 01. Modelo teórico do estudo.
Fonte: adaptado de SHENHAR & DVIR (2007)
Essa tabela revela que um projeto pode e até deve ser aplicado em empresas de portes e particularidades distintas, inclusive em diversos setores da economia, como no agronegócio. Aliás, KERZNER (2017) afirma que a gestão de projetos atualmente é vista tanto como um processo de gestão de projetos como que um processo de negócios.
3. MÉTODO DE DESENVOLVIMENTO
Para o trabalho apresentado foi realizado um uma síntese analítica, de forma prática (por meio de observação participante), junto a uma empresa de médio porte do setor de agronegócios.
TERENCE (2002) apud DRUCKER, (1981) diz que o tamanho não modifica a natureza, os princípios administrativos, tampouco altera os problemas básicos que acometem os administradores de uma empresa de pequeno ou médio portes. Entretanto, afeta a estrutura administrativa, devido a exigência de comportamentos e atitudes diferentes proporcionais ao porte de cada uma. LEONE (1999) explicam que uma das dificuldades em estudar as pequenas e médias empresas baseiam-se na heterogeneidade que existe entre elas. Isto pode ser um dos motivos pelo atraso de estudos voltados aos pequenos negócios e pela dificuldade em propor teorias e conclusões adequadas, concluem.
Todos os dados e informações necessárias foram coletados e tratados junto a equipe de pesquisadores, através de prévia autorização dos elementos pesquisados, junto ao contrato de prestação de serviços realizado por via da empresa de consultoria R. R. Life Consulting & Business, a qual prestou serviços em consultoria organizacional para a empresa pesquisada (Grupo de Revendas Agrícolas no estado de Goiás – GO), possibilitando a coleta de informações bem como a intervenção do trabalho de consultoria, o que permitiu a produção da pesquisa participante.
A presente pesquisa foi constituída pela atuação direta do pesquisador, por se tratar de um profissional atuante em consultoria em apoio organizacional e reestruturação de negócios (para grupos de produtores rurais e empresas no setor agronegócio), na ocasião em que foi aluno e pesquisador do curso Mestrado Profissional em Administração e Gestão de Negócios, pela Fundação Instituto de Administração (FIA), atualmente cursando o Doutorado Profissional em Controladoria e Finanças Empresariais – Universidade Presbiteriana Mackenzie - SP.
Assim, foram analisadas as circunstâncias envolvendo:
* O perfil de administradores;
* O nível de conhecimentos sobre Gestão de Projetos;
* A Gestão Financeira e o nível de execuções e das atividades financeiras;
* Os resultados financeiros observados através dos relatos documentais (primários e secundários) para esse estudo.
Trata-se de um estudo qualitativo, exploratória e descritiva, para a qual foram utilizados alguns princípios do método pesquisa-ação (DEMO, 2001). As técnicas de coleta de dados primários foram através de observação participante, com o intuito de desenvolver o conhecimento e a compreensão como parte da prática (ENGEL, 2000).
Na abordagem utilizada, o acoplamento da pesquisa e ação - na qual os atores implicados participam junto com o pesquisador - objetiva interpretar um determinado fenômeno em que estão inseridos, identificando problemas e experimentando soluções em um contexto real. Entende-se por ‘atores’ qualquer grupo de pessoas com capacidade de ação coletiva dentro do contexto social delimitado pela pesquisa (THIOLLENT, 1997).
Desta forma, esse estudo está voltado ao interesse e benefício nas atividades empresariais e/ou possibilitar a criação e sugestão de ações corretivas e preventivas, ou seja, de alguma forma melhorando o que já existe (APOLINÁRIO, 2012), por meio de entrevistas com executivos (GIL, 2010).
4. SITUAÇÃO PROBLEMA: TIPO DE INTERVENÇÃO E MECANISMOS ADOTADOS
Cenário Encontrado:
O grupo empresarial possuía quatro frentes de negócios (comercialização e distribuição de insumos, defensivos e adubos, UBS-unidade de beneficiamento de sementes, fazendas produtores de sementes e laboratório de agricultura de precisão). Eram 05 sócios compondo a estrutura societária.
As decisões eram tomadas de forma isolada, não havendo uma necessária discussão e mitigação de certos riscos e avaliação dos custos dos projetos, os quais impactavam profundamente nos negócios e resultados. As diferenças de cultura e crenças eram nítidas e o controle organizacional limitado, devido ao baixo conhecimento sobre os elementos elencados, impactando nos processos decisórios.
Em razão disso, os resultados financeiros apresentavam-se em patamares medianos, mas as vezes com prejuízo em alguma das unidades de negócios, bem como médio aproveitamento do potencial real das atividades para obtenção de melhores resultados.
As estratégias de negócios, sobretudo as decisões financeiras eram geralmente conduzidas por um ou outro elemento da sociedade, não havendo consultas aos demais, tampouco as observações de mitigação quanto a análise e impacto financeiro nos resultados da unidade de negócio e do grupo econômico.
Os problemas eram percebidos pelos pares e subordinados, os quais não se envolviam na forma possível e necessária, por não acreditarem que seriam valorizados além dos próprios salários recebidos.
Perfis Comportamentais dos Administradores:
Todos possuíam graduação em agronomia, entretanto, não tinham muito conhecimento e domínio acerca dos outros elementos fundamentais à gestão dos projetos (finanças, controladoria, processos, gestão de riscos, tempo, comportamentos, etc.).
Necessidades Organizacionais:
Para o caso analisado sob a forma de participação direta e observação direta na pesquisa, os pontos a serem trabalhados na empresa, através dos elementos pesquisados se apresentaram da seguinte forma:
* Necessidade de implantação de gestão de custos e controladoria (por projetos), devido ao necessário controle dos custos (fatores críticos no setor), bem como se proteger da volatilidade do câmbio (dólar) e quanto ao correto uso de recursos financeiros (bancos e fornecedores);
* Ampliação do nível de gestão financeira;
* Capacitação e treinamentos dos gestores financeiros e de controladoria;
* Mensuração de riscos atinentes as atividades financeiras;
* Melhoria no relacionamento com parceiros financeiros;
* Criação de padrões de operações em detrimento as estratégias estabelecidas;
* Organizações das questões financeiras familiares / profissionais;
* Organização e adoção de práticas de gestão de projetos, ainda que em intensidades primárias.
Intervenções:
As intervenções foram realizadas por etapas, num período de aproximadamente 06 meses:
Quadro 02. Etapas de implantação do Projeto.
Fonte: Elaborado pelo autor.
O quadro 02 apresenta as etapas resumidas do trabalho realizado pela consultoria contratada, todavia liderado pela participação do autor, cujo papel foi de líder do projeto.
Análises e Fases do Relato Técnico:
Para tanto, o trabalho de análise e consolidação das informações foi dividido em etapas, organizadas em fases distintas e complementares:
Quadro 03. Fases e análises do relato técnico
Fonte: Elaborado pelo autor
Ao final, foram discutidos e analisados todos os elementos estudados, bem como os resultados de indicadores de performance como forma de análise para a realização dos negócios empresariais; mas também proposto algumas recomendações necessárias.
Melhorias Observadas após 14 meses de adoção das Práticas de Gestão de Projetos:
* Mais organização e sobre a gestão superior da empresa (administradores);
* Melhorou a qualidade da gestão financeira e por consequências finanças:
a) Índice de alavancagem (endividamento bancário) foi reduzido;
b)Reduziu-se a qualidade do endividamento (taxas de juros bancárias);
c) Potencializou a forma de negociação com fornecedores, ajustando prazos de compras aos prazos de vendas;
* Houve melhorias no relacionamento com parceiros;
* Contratação de um gestor executivo, para fazer a “ponte” entre a alta gestão e níveis táticos e operacionais;
* Foi possível separar as atividades familiares / profissionais;
* Foi implementado a gestão de custos por projetos;
* Acreditamos também ter melhorado o nível de qualidade de vida dos envolvidos, embora essa afirmação é com base em percepção, não em pesquisa.
Dificuldades encontradas:
* Postura defensiva quanto a inovação e mudança;
* Falta de sinergia cultural;
* Médio conhecimento sobre Gestão de projetos;
* Dificuldade quanto ao sistema ERP;
* Dificuldade com prazos e providencias de informações devidamente posicionadas no ERP – input.
5. CONCLUSÃO E CONTRIBUIÇÃO SOCIAL / ACADÊMICA
O objetivo principal desse relato foi identificar se a gestão de projetos pode interferir e auxiliar nos processos voltados à administração financeira de uma empresa de médio porte no setor de agronegócio. O método utilizado foi estudo de caso, e a principal técnica de coleta de dados foi observação participante.
Dados empíricos evidenciam que a cultura, a crença, a formação profissional e acadêmica, ao lado das regras estabelecidas pelas empresas, de forma clara e objetiva, capitaneadas por profissionais administradores - cujas competências exercem influência positiva na qualidade dos serviços e das operações - contribuem para a melhoria dos resultados e pode favorecer os indicadores das empresas por eles lideradas.
Ainda sabendo dos inúmeros problemas e desafios que possam acometer uma empresa ou negócio – independentemente do porte, a aplicabilidade da prática de Gestão de Projetos – pode fazer a diferença, sendo considerada em alguns casos uma questão fundamental e até mesmo um fator crítico de sucesso organizacional.
Integrando o arcabouço de soluções relacionados a gestão de projetos, aplicando-as sistematicamente em fases sucessivas, bem como integrando os fatores críticos ao projeto, como: pessoas, processos, estabelecimento de objetivos e monitoramento dos resultados, verifica-se que é possível reverter uma situação desfavorável.
Fica ainda evidenciado que é possível evitar ocorrências negativas, quando se atua de forma mitigadora, bem como envolvendo o quadro de colaboradores, considerando que o conhecimento desses profissionais poderá representar a tênue razão entre o sucesso e o fracasso do projeto estabelecido.
Em suma, a prática de gestão de projeto, quando utilizada de forma adequada pode auxiliar na melhoria da gestão e dos resultados financeiros, bem como gerar valor e contribuir fortemente para que não haja surpresas desagradáveis, todavia, auxiliar estrategicamente para superá-las caso ocorram.
Contudo, há que observar e considerar os fatores adversos, que por vezes surgem ou podem surgir, como: a baixa integridade profissional, ou o baixo nível de conhecimento profissional e técnico acerca da implantação do pretendido projeto, bem como é necessário considerar o senso de urgência que por vezes é demonstrado pelos gestores, o que poderá comprometer o projeto, se não gerenciado essa particularidade.
O aparato tecnológico disponibilizado pela empresa também é relevante e pode representar um diferencial para o projeto. Através dele, a disponibilidade, a qualidade e acurácia das informações e dos elementos financeiros trabalhados, ao lado dos custos, estoque, ativo circulante, investimentos, depreciações, compromissos de curto, médio e longo prazos (passivos) contribuirão positiva ou negativamente com alguns procedimentos de análise, decisão e implantação.
Por fim, como trazido no enunciado inicial deste relato técnico, a integração no processo empresarial é, de fato, um grande desafio a ser considerado para a implantação de um projeto com pretensões como esse. Isso porque, não é possível implementar um projeto com tais especificidades sem a integração dos componentes necessários, citados nos referenciais desta pesquisa.
Ainda assim, verifica-se nesse estudo relevante contribuição, sendo que, nessa linha de raciocínio, as implicações gerenciais vão desde a possibilidade de eleger meios e processos para a implementação ou melhoria das práticas voltadas à mitigação e gestão dos riscos corporativos, sobretudo financeiro.
Por fim, priorizar esse setor da economia brasileira, que vem se destacando e muito contribuindo com o país, mas em que é observado um reduzido nível de gestão e conhecimento quanto à gestão dos riscos corporativos.
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Revista Capital Científico – Eletrônica (RCCe) Rua: Padre Salvador, 875 – Bairro Santa Cruz CEP: 85015-430 Guarapuava-Paraná-Brasil Campus Santa Cruz – Editora UNICENTRO ISSN 2177-4153 (Online)
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