Artigo 1

Evidenciação de instrumentos financeiros derivativos: uma análise das empresas de construção civil listadas na B3

 

Disclosure of derivatives: an analysis of civil construction companies listed on B3

 

 

Thiago Antonio Cavalcanti Bizinco dos Santos1e Carla Renata Silva Leitão2

1 Universidade Federal Rural de Pernambuco, Brasil, Mestrando em Controladoria, e-mail: thiagosantos21@gmail.com

2 Universidade Federal Rural de Pernambuco, Brasil, Doutorado em Administração, e-mail: carlaleitao_ufrpe@yahoo.com.br

 

Recebido em: 16/07/2022 - Revisado em: 10/08/2022 - Aprovado em: 21/09/2022 - Disponível em: 01/10/2022

Resumo

As normas contábeis estão em constante atualização, objetivando promover maior qualidade às informações contábeis das companhias e proporcionando aos seus usuários maior confiabilidade em suas demonstrações. O objetivo do artigo é verificar se as empresas do segmento de Construção Civil listadas na B3 estão evidenciando os instrumentos financeiros derivativos de acordo com a CPC 40 (R1). Apesar do tema derivativos já ter sido objeto de outras pesquisas empíricas, não obstante ainda requer atenção, tendo em vista a importância desses instrumentos financeiros no cenário econômico e o crescimento da utilização pelas empresas. Para o desenvolvimento deste artigo, a metodologia utilizada envolveu uma pesquisa de natureza descritiva e exploratória, com abordagem qualitativa e documental, sendo utilizada a técnica de análise de conteúdo para a análise dos dados. Os resultados apontaram que algumas empresas estudadas ainda estão aquém daquilo considerado como ideal em termos de evidenciação. Todavia, de maneira geral, as empresas buscaram cumprir as exigências constantes no CPC 40 (R1), apresentando uma média de 67,19% de aderência completa ao referido pronunciamento contábil. Observou-se também uma unanimidade quanto ao uso do derivativo swap por parte das empresas analisadas. Assim, os resultados desta pesquisa convergiram com pontos argumentados na fundamentação teórica e com resultados apresentados em estudos anteriores sobre o tema.

Palavras-chave: Derivativos; Evidenciação Contábil; Construção Civil.

 

 

Abstract

Accounting standards are constantly being updated, to promote greater quality in companies’ accounting information and provide its users with greater reliability in their statements. The article aims to verify if the companies in the Civil Construction segment listed on B3 are performing the disclosure of derivatives in accordance with CPC 40 (R1). Although the topic of derivatives has already been the subject of other empirical research, it still requires attention, given the importance of these financial instruments in the economic scenario and the growth in their use by companies. For the development of this article, the methodology used involved a research of a descriptive and exploratory nature, with a qualitative and documental approach, using the technique of content analysis for data analysis. The results revealed that some companies studied are still below what is considered ideal in terms of disclosure. However, in general, the companies sought to comply with the requirements contained in CPC 40 (R1), presenting an average of 67.19% of complete adherence to the aforementioned accounting pronouncement. There was also unanimity regarding the use of the swap derivative by the analyzed companies. Thus, the results of this research converged with points argued in the theoretical foundation and with results presented in previous studies on the subject.

Keywords: Derivatives; Accounting Disclosure; Civil Construction.

 

1. INTRODUÇÃO

Os instrumentos financeiros têm adquirido grande destaque nas abordagens teóricas e normativas da contabilidade nas últimas décadas. De acordo com Batista e Mário (2012), em virtude do processo de globalização, das conexões entre os mercados financeiros, do surgimento dos modelos de precificação de ativos e do crescimento tecnológico das indústrias, os instrumentos financeiros passaram a ter maior relevância tanto para as empresas quanto para investidores, credores e outros agentes de mercado.

O impacto dos instrumentos financeiros no mercado é destacado por Moreira e lima (2003), quando estes afirmam que o mercado financeiro global passou por um significante desenvolvimento devido ao aumento do uso de novos instrumentos financeiros, especialmente os derivativos, os quais promoveram diversas mudanças. Por causa do alto volume de ativos e passivos financeiros e dos riscos inerentes a estes, as empresas buscam meios para mitigar prováveis impactos resultantes desses riscos, e para isso utilizam-se da estratégia de contratação de instrumentos financeiros derivativos (BATISTA e MÁRIO, 2012).

As operações com derivativos servem para gerenciar os riscos aceitos pelas organizações no momento da contratação de diversas operações, e, ao geri-los, as empresas repassam os riscos para outros que estejam dispostos a assumi-los e administrá-los, por meio da contratação de operações de derivativos (CASTRO NETO et al., 2004).

A utilização de derivativos cresceu exponencialmente e, por consequência, a evolução de sua contabilização. Esse fenômeno atraiu atenção significativa de pesquisadores, reguladores e usuários das demonstrações financeiras (CAMPBELL, MAULER e PIERCE, 2019).

Inicialmente as operações com derivativos estavam presentes somente em instituições financeiras, contudo muitas empresas os incorporaram aos seus negócios, tornando-os parte integrante do processo de gestão dos negócios. O aumento de sua utilização trouxe um grande desafio e um problema para a contabilidade: como evidenciá-los? A teoria até então existente não possuía orientações suficientes para inseri-los nos procedimentos de disclosure. Assim, inicialmente, os profissionais da área contábil e financeira, consideraram que as operações com derivativos deveriam ser tratadas como off-balance sheet (MOREIRA e LIMA, 2003).

Desta forma, embora as informações não precisassem ser reconhecidas em balanço, eram apresentadas fora dele e abrangiam informações de valor justo, que também estavam disponíveis para alguns dos instrumentos financeiros, como investimentos (HASSAN, PERCY e STEWART, 2006). Os derivativos apresentavam diversos problemas para a contabilidade quanto à sua identificação, mensuração, acumulação e evidenciação (LOPES e LIMA, 2001). Por isso, os itens relativos aos instrumentos derivativos eram desconsiderados do balanço, deixando os usuários da informação contábil sem o conhecimento do nível de risco que a instituição financeira estava assumindo (AMARAL, 2003).

Sabe-se que o grande objetivo da contabilidade é o de fornecer informações úteis para a tomada de decisão. (MOROZINI e MOROZINI, 2014). No entanto, demonstrar as alterações do patrimônio e gerar informações tornaram-se tarefas mais complexas, devido principalmente ao desenvolvimento e volatilidade do sistema financeiro e ao aprimoramento e dificuldade das transações econômicas; os instrumentos financeiros derivativos, em especial, desenvolveram-se com grande rapidez e criaram complicações quanto ao seu reconhecimento e mensuração para a Contabilidade (DARÓS e BORBA, 2005).

Com o intuito de melhorar a divulgação dos riscos relacionados aos instrumentos financeiros, especialmente no caso dos derivativos, a International Accounting Standards Board – IASB emitiu a IFRS 7- Instrumentos Financeiros (BIRT, RANKIN e SONG, 2013). Neste contexto, a adoção das normas internacionais, representadas pelas International Financial Reporting Standards – IFRS, refletidas nas normas nacionais, vem como forma de padronizar essas informações, considerando que a confusa dinâmica do mundo dos negócios, a utilização intensiva de instrumentos derivativos por organizações expostas aos riscos contratuais, a eles implícitos, tornou-se uma prática importante de gestão de riscos corporativos (PEREIRA et al., 2017).

A contabilidade, enquanto ciência que investiga o patrimônio, propõe condutas para o tratamento dos instrumentos financeiros derivativos. Essas condutas podem ser seguidas através da observação da aplicabilidade e utilização por parte das empresas brasileiras das Instruções CVM 235/95, CVM 475/08, Deliberação CVM 550/08, e o Pronunciamento Contábil NBC TC40 (R3) (BATISTA e MÁRIO, 2012).

Em seus estudos, Castro Neto et al. (2004) afirmaram que as empresas brasileiras até então se baseavam na instrução normativa CVM 235/95 para evidenciar em notas explicativas os instrumentos financeiros derivativos, ressaltando, porém, que tal instrução se refere somente a instrumentos financeiros. Pois, no Brasil não havia nenhuma instrução que normatizasse as negociações com derivativos.

Nesse sentido, Batista e Mário (2012) acrescentam que até 2008 não havia no Brasil nenhuma norma contábil para regulamentar o tema. Observando-se, a partir de 2011, a existência de três normas: CPC 38, tratando sobre a definição de ativos e passivos financeiros e dos instrumentos de patrimônio; o CPC 39, disciplinando sobre as formas das categorias de ativos e passivos financeiros, de seu reconhecimento contábil e mensuração, como também de hedge accounting; e o CPC 40, com o objetivo de regular as divulgações exigidas para esse tipo de operação na tentativa de atender às necessidades do mercado global.

Em junho de 2012, através do Termo de Aprovação, a Coordenadoria Técnica do Comitê de Pronunciamentos Contábeis (CPC) publicou a aprovação de alterações no CPC 40, passando a ser CPC 40 (R1) – Instrumentos Financeiros: Evidenciação. De acordo com este CPC, seu objetivo é exigir que as organizações divulguem em suas demonstrações contábeis informações que possibilitem os usuários avaliar a significância do instrumento financeiro tanto para a posição patrimonial e financeira quanto para o desempenho da entidade, bem como a natureza e a extensão dos riscos resultantes de instrumentos financeiros a que a entidade está exposta e como a entidade administra esses riscos.

Neste contexto, surge a importância de se estudar a evidenciação de instrumentos financeiros derivativos nas empresas listadas, na B3, a bolsa de valores brasileira. Dentre as várias empresas dos diversos segmentos relacionados na Brasil, Bolsa, Balcão – B3, bolsa brasileira, há 28 empresas do subsetor de Construção Civil, segmento incorporações (B3, 2022).

De acordo com Teixeira e Carvalho (2005, p. 23), “a indústria da construção é uma atividade econômica que complementa a base produtiva e exerce forte impacto na sustentação do desenvolvimento econômico-social”. Além disso, a construção civil está difundida em todo o território nacional, concentrando a maior parte das empresas nas regiões Sul e Sudeste; sua importância pode ser observada através de sua participação no desenvolvimento do produto nacional e na geração de empregos diretos e indiretos. Além disso, a extensa e complexa cadeia produtiva do setor opera intensa alavancagem econômica nos demais setores fornecedores de insumos, atuando como importante gerador de crescimento destes. (TEIXEIRA e CARVALHO, 2005).

Tendo em vista a importância do tema ora exposto e da relevância do referido setor para a economia brasileira, o objetivo do artigo é verificar se as empresas do segmento de Construção Civil listadas na B3 estão evidenciando os instrumentos financeiros derivativos de acordo com a CPC 40 (R1). Com esse objetivo atribuído, o estudo pretende contribuir para a compreensão das práticas de evidenciação contábil dos derivativos, especificamente no contexto do mercado de capitais de países emergentes.

 

2. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

2.1. Instrumentos Financeiros Derivativos

De acordo com a Instrução Normativa 235/95 CVM, art. 2º, instrumento financeiro é todo contrato que origina um ativo financeiro em uma entidade e um passivo financeiro ou título representativo do patrimônio em outra entidade. Segundo a referida Instrução Normativa, são considerados ativos financeiros: disponibilidades, direitos contratuais recebíveis em moeda ou em instrumentos financeiros de outra entidade, direitos contratuais de troca de resultados financeiros (swaps) ou instrumentos financeiros e títulos representativos de participação no patrimônio de outra entidade. Já os passivos financeiros são as obrigações contratuais de pagamento de determinada importância em moeda ou em instrumentos financeiros e troca de resultados financeiros ou instrumentos financeiros.

Já um derivativo financeiro é um contrato entre duas ou mais partes cujo valor deriva do valor de um instrumento subjacente, que normalmente muda de valor após alterações em uma variável de mercado subjacente, como uma taxa (por exemplo: juros ou câmbio) ou um preço (por exemplo: ações ou commodities). Consequentemente, os derivativos fornecem uma maneira para as empresas protegerem suas exposições a riscos indesejáveis, pois permitem que as empresas firmem contratos cujo valor se mova na direção oposta dos riscos financeiros existentes das empresas. Por exemplo, uma empresa pode se proteger contra aumento dos preços das commodities, firmando um contrato para comprar essa mercadoria a um preço especificado em uma data futura específica. O valor deste contrato se move junto com o preço da commodity, compensando o risco associado ao aumento dos preços destas (CAMPBELL, MAULER e PIERCE, 2019).

Assim, os instrumentos financeiros derivativos se originam das transações de instrumentos primários, e podem ser de compra, venda, emissão, lançamento ou contratação (CARVALHO, 1999). Ou seja, são recursos financeiros cujo preço advém do valor de outros ativos, os quais podem ser commodities (a exemplo do café ou soja, ativos financeiros), ações, ou bolsas de valores, e percentuais de juros (MENEGOTTO, BONES e CRUZ, 2012). Desta forma, podemos entender que todo derivativo é um instrumento financeiro, porém, nem todo instrumento financeiro é um derivativo (CASTRO NETO et al., 2004).

Quanto a sua origem, Menegotto, Bones e Cruz (2012) argumentam que a necessidade de um instrumento financeiro que promovesse proteção contra variações de preços contribuiu para o surgimento das negociações de derivativos, que passaram a ter papel social e econômico, apesar dos contratos de negócios comuns, exigindo que os negociadores desse novo mercado acompanhem o progresso e compreendam essas novas ferramentas financeiras. Já Carvalho (1999) comenta que o surgimento dos derivativos está relacionado à negociação de mercadorias básicas e que alguns autores atribuem sua origem à China antiga, enquanto outros defendem que foi durante a Idade Média, com o aperfeiçoamento do comércio.

Moreira e Lima (2003) acrescentam que o mercado de derivativos, da maneira que conhecemos hoje, surgiu na década de 70, estimulado por situações tais como o acordo de Bretton Woods (1971) e a crise petrolífera causadoras de mudanças nos sistemas financeiros mundiais. Fato é que, apesar de sua origem histórica, o surgimento de derivativos ocorreu visando promover agilidade e maior segurança à negociação de commodities (CARVALHO, 1999).

A entrada de uma entidade no mercado de financeiro de derivativos visando a proteção dos ativos financeiros é denominada hedge; termo inglês que significa guarda, conhecido no mercado financeiro como proteção às oscilações de preço de ativos e passivos. As negociações nesse tipo de operação objetivam mitigar riscos na obtenção de lucros e, para evitar tais oscilações, oferece tipos de mercados derivativos (CASTRO NETO et al., 2004).

Nessa perspectiva, é possível compreender que a intenção de uma organização em utilizar derivativos pode variar entre hedge e especulação, sendo a decisão motivada por um risco existente ou por potencial exposição que pode ou não ser reconhecida contabilmente pela empresa. Sendo importante ressaltar que a capacidade do derivativo de proteger a empresa do risco identificado pode ser imperfeita ou de difícil mensuração (CAMPBELL, MAUTER e PIERCE, 2019).

Não é demais destacar que a escolha dos gestores em utilizar os instrumentos financeiros para fins de hedge não se limita ao interesse de maximização do valor da organização, mas há também motivos e interesses próprios (BARNES, 2001).

Nesse ponto, os riscos aceitos pelas empresas, devido à utilização de derivativos, podem causar volatilidade nos lucros, influenciando negativamente as percepções quanto ao desempenho da empresa. Desta forma, os gestores têm incentivos para utilizar os instrumentos financeiros visando a redução ou compensação desses riscos (HASSAN, PERCY e STEWART, 2006).

Para as organizações e gestores, tão importante quanto conhecer a finalidade do uso de derivativos, é conhecer seus tipos e categorias. Pois, apesar de serem utilizados mais comumente na gestão dos riscos tomados pelas empresas, também possuem características especulativas, e sua identificação dependerá das características da negociação realizada, ou seja, se o contrato de derivativo protege ou aumenta a exposição da empresa (CAMPBELL, MAUTER E PIERCE, 2019).

O Quadro 1, a seguir, apresenta as características básicas dos principais instrumentos derivativos.

Quadro 1 – Tipos de instrumentos derivativos.

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Fonte: Adaptado de Castro Neto et al., (2004) e Menegotto, Bones e Cruz (2012).

Sobre a utilização dos derivativos pelas empresas, Pereira (2017) destaca que saber utilizar instrumentos derivativos com o objetivo de reduzir a exposição a riscos possui igual importância quanto alocar coerentemente os recursos com fins de investimentos.

 

2.2. Evidenciação de Instrumentos Financeiros

Criados com o intuito de estabelecer preços futuros de ativos e de proteger investidores e produtores de riscos, os derivativos atualmente são títulos amplamente negociados no mercado financeiro mundial e sua complexidade tem levado a contabilidade a entender e reconhecer suas implicações sobre o patrimônio das entidades e, concomitantemente, encontrar formas de evidenciá-los corretamente nas Demonstrações Contábeis (DARÓS e BORBA, 2005).

Nessa perspectiva, o disclosure de informações a respeito das negociações com instrumentos derivativos tem sido objeto de acentuada discussão em nível internacional, e os agentes reguladores têm demonstrado preocupação com a definição dos requisitos mínimos de divulgação (SERRA, LEMOS e MARTINS, 2019), tendo em vista que o disclosure de instrumentos derivativos diminui assimetrias de informações, colabora para a redução dos custos de capital e para a eficácia da disciplina do mercado (SCANNELLA e POLIZZI, 2019).

Nesse sentido, a evidenciação se conecta aos objetivos da Contabilidade, quanto ao assegurar diversidade de informações aos mais variados usuários, uma vez que sua diversidade de apresentações se aliam às Demonstrações Contábeis, favorecendo maior compreensão e qualidade às informações; sendo a qualidade observada pelas expressões: evidenciação adequada (adequate disclosure), evidenciação justa (fair disclosure) e ainda evidenciação plena (full disclosure). Não obstante, embora apresentem significados distintos, não há diferença entre elas (Iudícibus, 2021). Pois “o sentido da evidenciação é que a informação que não for relevante deve ser omitida a fim de tornar as demonstrações contábeis significativas e possíveis de serem entendidas plenamente” (IUDÍCIBUS, 2021, p. 94).

Nisto, Menegotto, Bones e Cruz, (2012) destacam que se os derivativos forem evidenciados corretamente, a entidade não expressará o grau de risco por ela assumido. Para tanto, é essencial que a contabilidade trate uniformemente os derivativos, para assim alcançar o objetivo de prover informações úteis e mais transparentes possíveis. Quando demonstradas de forma adequada e completa, essas informações atenuam a assimetria informacional entre a administração e os usuários internos e externos dos relatórios contábeis (MALAQUIAS e ZAMBRA, 2018).

No que diz respeito aos instrumentos de orientação, Batista e Mário (2012) comentam que desde a década de 90 a CVM exigia, com base na Instrução CVM 235/95, que as empresas de capital aberto publicassem em notas explicativas o valor de mercado, os parâmetros de mensuração, políticas de atuação e controle de negociações nos mercados derivativos e seus riscos.

Entretanto, Lopes e Lima (1998) chamam atenção para o fato dos instrumentos financeiros derivativos possuírem um atributo muito relevante que elevava a preocupação com os problemas naturais de contabilização: o risco offbalance-sheet. Para os autores esta natureza de risco é decorrente do não registro (no exato momento) de tais instrumentos, pela Contabilidade tradicional, nas contas que irão compor o resultado da entidade. Assim, todos os riscos inerentes à operação normal dos instrumentos não eram evidenciados pelo modelo contábil tradicional, ocorrendo apenas em notas explicativas, quando eram. O disclosure do risco assumido pela organização ficava essencialmente limitado à evidenciação, representada pelas notas explicativas, não aparecendo informações a respeito do risco nas demonstrações financeiras (LOPES e LIMA, 1998).

Depreende-se, com base nos autores ora citados, que a contabilidade tinha certa urgência de padrões mínimos que pudesse norteá-la quanto aos procedimentos de evidenciação dos derivativos.

Ambrozini (2014) relata que, visando a regulamentação dos procedimentos contábeis aplicados aos instrumentos financeiros, o Comitê de Pronunciamentos Contábeis (CPC) emitiu, em 2008, o pronunciamento técnico CPC 14, intitulado Instrumentos Financeiros: Reconhecimento, Mensuração e Evidenciação, que vigorou nos anos de 2008 e 2009; surgindo em 2010, os conceitos referentes ao tratamento contábil dos instrumentos financeiros derivativos e não derivativos abrangidos pelos pronunciamentos técnicos CPC 38, CPC 39 e CPC 40 (R1), emitidos pelo CPC em substituição ao CPC 14 (AMBROZINI, 2014).

O Quadro 2, a seguir, apresenta os referidos CPC’s e suas finalidades quanto aos instrumentos financeiros:

 

Quadro 2 – Pronunciamentos que tratam sobre instrumentos financeiros.

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Fonte: Silva (2017, p. 5).

Segundo Sousa e Malacrida (2021), o surgimento do CPC 48 – Instrumentos financeiros, em 2016, ocorreu por causa das mudanças existentes na esfera internacional, apontadas por estudos e experiências do mercado, forçando o Comitê de Pronunciamento Contábil a atualizar as normas nacionais, culminando na divulgação do aludido CPC.

Costa, Leal e Ponte (2017) sustentam que a normatização contábil é um caminho para assegurar que as organizações evidenciem suas informações, mesmo que não tenham motivação específica para isso.

Nesse aspecto, também é importante destacar a importância do CPC 40 (R1), pois com seu surgimento passou a haver regras mais claras e a existência de uma relação mais metódica de condutas de evidenciação (AMBROZINI, 2014).

O CPC 40 (R1), em sua introdução, preocupa-se em destacar a necessidade de maior transparência sobre os riscos relacionados aos instrumentos financeiros, para que seus usuários tenham melhores condições de decisão quanto ao risco e o retorno (COMITÊ DE PRONUNCIAMENTOS CONTÁBEIS, 2012; COSTA, LEAL e PONTE, 2017).

Outro ponto destacado pelo CPC 40 (R1) são os tipos de informações, que devem ser qualitativas e quantitativas, revelando a exposição a riscos devido aos instrumentos financeiros, incluindo informações específicas sobre riscos de crédito, de liquidez e de mercado. Assim, as entidades, quanto às informações qualitativas, divulgarão a exposição ao risco e seu surgimento; os objetivos, políticas e procedimentos de gerenciamento de riscos, formas de mensuração e mudanças ocorridas em relação ao período anterior. Já nas informações quantitativas, encerrado o período contábil, a entidade divulgará uma análise de sensibilidade sobre cada tipo de risco de mercado aos quais está sujeita, exceto se apresentar uma análise de sensibilidade do mesmo modo que a do valor em risco (value-at-risk) para utilização na gestão dos riscos financeiros (COMITÊ DE PRONUNCIAMENTOS CONTÁBEIS, 2012; COSTA, LEAL e PONTE, 2017). O valor em risco (value-at-risk) demonstra correlação entre riscos variáveis, tais como: riscos de taxas de juros e riscos de taxa de câmbio (COMITÊ DE PRONUNCIAMENTOS CONTÁBEIS, 2012).

 

2.3. Estudos anteriores

A evidenciação de instrumentos financeiros derivativos já foi pauta de várias outras pesquisas empíricas. Segundo Machado, Oliveira e Ribeiro Filho (2016), são exemplos de estudos anteriores os estudos de Amaral (2003), Costa Júnior (2003), Darós e Borba (2005), Alves et al. (2008) e Murcia e Santos (2009).

Algumas das características desses estudos são apresentadas no Quadro 3, a seguir:

Quadro 3 – Estudos anteriores e características.

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Fonte: Adaptado de Machado, Oliveira e Ribeiro Filho (2016).

Outros estudos relacionados ao tema, e que reforçam sua importância, são apontados por Pereira et al. (2017). Alguns exemplos desses estudos são as pesquisas de Farhi e Borghi (2009), Mupurunga et al. (2011) e Fernandes, Silva e Macêdo (2012). O Quadro 4, a seguir, apresenta esses estudos.

 

Quadro 4 – Outros estudos relacionados a pesquisa.

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Fonte: Adaptado de Pereira et al. (2017)

 

3. METODOLOGIA

O uso e especificação de métodos aplicados para o desenvolvimento de pesquisas são essenciais, pois conferem cientificidade aos estudos, diferenciando-os de outros tipos de conhecimentos (PEREIRA et al., 2017).

Nesse sentido, para o desenvolvimento deste artigo a metodologia utilizada para levantamento, tratamento e análise dos dados caracterizou-se como uma pesquisa qualitativa, de natureza descritiva e documental.

De acordo com Mazucato (2018), o enfoque qualitativo não emprega ferramentas estatísticas como fundamento da análise. Ele é útil quando se busca descrever a complexidade de um problema – não envolvendo manipulação de variáveis ou estudos experimentais. É oposta à abordagem quantitativa já que busca considerar todos os componentes de uma situação e suas interações e influências recíprocas considerando uma visão/perspectiva holística.

Quanto às pesquisas descritivas, Gil (2002) defende que elas têm como objetivo principal descrever as características de determinada população ou fenômeno ou o estabelecimento de relações entre variáveis. São, em conjunto com as exploratórias, habitualmente realizadas por pesquisadores sociais preocupados com a atuação prática. E, geralmente, assumem o formato de levantamento. Já Alyrio (2009) argumenta que esse tipo de pesquisa busca essencialmente enumerar e ordenar dados, não objetivando comprovar ou contestar hipóteses exploratórias, mas proporcionar espaços para novos estudos.

Em relação à pesquisa documental, esta ocorre por meio de documentos, físicos ou eletrônicos, disponíveis em órgãos públicos ou privados, ou com indivíduos (VERGARA, 1990). Para Gil (2002), esse tipo de pesquisa se assemelha à pesquisa bibliográfica, diferenciando apenas a natureza das fontes. Pois, enquanto a bibliográfica baseia-se nas contribuições de vários autores sobre determinado assunto, a pesquisa documental utiliza materiais que não recebem tratamento analítico, ou podem ser reelaborados segundo os objetos de pesquisa. O autor ainda destaca que na pesquisa bibliográfica as fontes são compostas principalmente impressos disponíveis em bibliotecas, já na pesquisa documental, as fontes são muito mais diversificadas e dispersas.

Quanto ao tratamento dos dados, a pesquisa fez uso da técnica de análise de conteúdo, que é um procedimento clássico utilizado para averiguar informações textuais de qualquer origem, desde mídias a dados de entrevistas, com a finalidade de categorizar o conteúdo textual separando as declarações, sentenças ou palavras a um sistema de categorias (FLICK, 2013), esse método “permite a descrição sistemática, objetiva e quantitativa do conteúdo da comunicação” (MARCONI e LAKATOS, 2003, p. 223). Através da técnica de análise de conteúdo foram analisados os dados a partir das demonstrações contábeis e notas explicativas alusivas ao exercício de 2020, disponíveis nos sites de relacionamento com investidores de cada empresa.

O estudo contou com um universo de 28 empresas listadas na B3, do subsetor de Construção Civil, segmento incorporações. Sendo realizados em seguida os levantamentos das demonstrações contábeis e notas explicativas – documentos necessários à análise – para então ser realizada análise prévia da documentação a fim de constatar o número exato de empresas que comporiam o universo efetivo. Foi realizada uma primeira verificação dos documentos a fim de constatar se todas as empresas operavam com instrumentos financeiros derivativos – condição essencial para o estudo. Constatou-se que a maioria das empresas não operava com instrumentos derivativos, sendo identificadas 8 empresas que efetivamente evidenciaram operações com derivativos em 2020. Assim, esse novo quantitativo de 8 empresas foi adotado como universo efetivo da pesquisa. Dessa forma, optou-se por realizar um censo.

Em seguida, foram analisadas as demonstrações financeiras e notas explicativas das respectivas companhias, a fim de confrontar as informações evidenciadas sobre instrumentos financeiros derivativos com as exigências do CPC 40 (R1). Para tanto, foi utilizado um checklist, adaptado de Pereira et al. (2017), o qual relaciona 32 itens visando identificar o nível de aderência das empresas analisadas em seu estudo.

Para a observação de cada item, foram usadas as seguintes classificações: (A) quando o item foi atendido, (AP) quando o item foi atendido parcialmente, (N) quando o item não foi atendido e (NA) quando o item não se aplicava à companhia. Os dados, após coletados, foram tratados de forma a se extrair as frequências.

 

4. RESULTADOS

Após análise prévia das demonstrações financeiras e notas explicativas das empresas listadas acima, foi observado que apenas 08 (oito) empresas mencionavam a utilização de algum tipo de instrumento financeiro derivativo.

Visando preservar a identidade das companhias analisadas, estas foram denominadas com números de 1 a 8. A Tabela 1 apresenta os resultados dos itens verificados para cada empresa, considerando as demonstrações contábeis analisadas.

Tabela 1 – Evidenciação dos Instrumentos Financeiros Derivativos.

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continua.......

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Legenda: (A) Atendido, (AP) Atendido parcialmente, (N) Não atendido e (NA) Não se aplica.

Fonte: Dados da pesquisa

Com base nos dados apresentados na Tabela 1 foi possível realizar o seguinte levantamento apresentado na Tabela 2, a qual apresenta o comportamento das empresas no tocante ao atendimento dos itens do CPC 40 (R1).

Tabela 2 – Evidenciação por empresa

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Fonte: Dados da pesquisa

Ao se observar a Tabela 2, nota-se que nenhuma das companhias atendeu a todos os itens do referido pronunciamento contábil, mesmo considerando que alguns deles não eram aplicáveis (NA), dadas as peculiaridades das operações. Contudo, quando considerados os demais itens de avaliação (A, AP e N) observou-se que a média de itens atendidos correspondeu a 67,19%; 3,13% foram atendidos parcialmente e 14,06% não foram atendidos. Esses dados demonstram que do total de informações que deveriam ser divulgadas, apenas parte delas foram evidenciadas. Sendo a EMP-6 a companhia com maior aderência e a EMP-3 de menor aderência ao CPC 40 (R1).

Outro ponto identificado pela pesquisa foi que todas as empresas estudadas apresentaram em suas demonstrações financeiras e notas explicativas apenas a modalidade swap como operações com instrumentos derivativos, e não tinham como objetivo a especulação, mas a proteção contra riscos econômicos, sobretudo em relação ao fluxo de caixa; não sendo observadas negociações com os demais instrumentos derivativos: contrato a termo, contrato futuro e opções. A Tabela 3 demonstra esse resultado.

 

Tabela 3 – Tipos de derivativos negociados pelas empresas

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Fonte: Dados da pesquisa

Esses achados remetem ao que Darós e Borba (2005), Batista e Mário (2012), Pereira (2017), Campbell, Mauter e Pierce, (2019), mencionados no referencial teórico desse estudo, os quais apontaram sobre a finalidade da utilização dos instrumentos financeiros derivativos, que estes poderiam ser utilizados para fins especulativos ou de proteção contra riscos econômicos e financeiros. No caso das empresas pesquisadas, elas optaram apenas por se proteger dos riscos.

 

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS

O artigo buscou verificar se as empresas do segmento de Construção Civil listadas na B3 estavam evidenciando os instrumentos financeiros derivativos de acordo com a CPC 40 (R1). Observou-se que a média de itens do referido CPC atendidos totalmente correspondeu a 67,19%.

Embora a evidenciação de instrumentos financeiros derivativos seja obrigatória e haja constantes avanços técnicos, no que diz respeito aos estudos e atualizações das normas e pronunciamentos contábeis, os resultados revelaram que a evidenciação de informações sobre a utilização de instrumentos derivativos das empresas estudadas não está totalmente aderente ao CPC 40 (R1), sendo compreendido que esta ocorreu apenas sobre o que foi entendido como relevante e possível de pleno entendimento aos usuários dos relatórios.

Também foi possível constatar que a utilização dos derivativos por parte das companhias objetivou a proteção contra riscos econômicos, principalmente quanto ao fluxo de caixa, sendo swap a modalidade de instrumento derivativo predominante.

Os resultados da pesquisa convergiram com outros desfechos obtidos em estudos anteriores sobre o tema, no que diz respeito à baixa aderência das empresas ao CPC 40 (R1), à finalidade da utilização de instrumentos financeiros derivativos como proteção ao risco assumido, e à qualidade do disclosure, no tocante à divulgação das informações tidas como de maior relevância.

Por fim, recomenda-se que futuramente sejam realizados estudos sobre a temática no intuito de averiguar se houve melhora da aderência das empresas aos e pronunciamentos contábeis, especialmente em relação à evidenciação dos instrumentos financeiros derivativos, objeto deste estudo.

 

REFERÊNCIAS

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Revista Capital Científico – Eletrônica (RCCe) Rua: Padre Salvador, 875 – Bairro Santa Cruz CEP: 85015-430  Guarapuava-Paraná-Brasil Campus Santa Cruz – Editora UNICENTRO ISSN  2177-4153 (Online)

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