Artigo 4

O que os liderados esperam da liderança? Um estudo com

professores da educação básica

 

 

What do followers expect from leadership? A study with basic education teachers

 

Roseane Netto Vinte1, Antônio Moreira de Carvalho Neto2,

e Daniela Martins Diniz3

 

1 Pontifícia Universidade Católica de Minas, Brasil, Mestranda em Administraçãoo, e-mail: roseanevinte@gmail.com

2 Pontifícia Universidade Católica de Minas, Brasil, Doutorado em Administração, e-mail: carvalhoneto@pucminas.br

3 Universidade Federal de São João Del Rei, Doutorado em Administração, e-mail: danidiniz09@yahoo.com.br

 

Recebido em: 07/12/2022 - Revisado em: 12/02/2023 - Aprovado em: 15/03/2023 - Disponível em: 01/04/2023

Resumo

Parte da literatura sobre liderança no setor de educação se encarregou de traçar perfis ideais de liderança sem levar em conta o que os professores consideram como características essenciais deste líder. Ademais, são raros os estudos que tratam especificamente das expectativas dos liderados em relação aos diretores. Tomando como ponto de partida tais lacunas, o objetivo da pesquisa foi captar a percepção de professores do ensino médio de colégios privados sobre as relações estabelecidas com os diretores, as lideranças nesse caso. Quanto ao método, foi desenvolvida pesquisa qualitativa envolvendo a realização de doze entrevistas com professores de escolas privadas de quatro estados brasileiros. Os achados empíricos apontam que o relacionamento é considerando um aspecto crítico para uma liderança eficaz no ambiente escolar, na visão unânime dos professores entrevistados. Aspectos relacionais emergiram nas respostas da maioria das questões de pesquisa, seja sobre o que é ser líder; seja em relação às habilidades requeridas ao diretor; seja quanto aos impactos do líder no desempenho dos docentes. Os achados apontam ainda que o líder, na visão dos entrevistados, é quem fornece a direção considerando as necessidades e expectativas dos diferentes liderados. Portanto, quando há uma preocupação em ouvir a perspectiva do liderado, pressupõe-se que a liderança só se concretiza na relação com o outro. Ou seja, líder e liderado não existem independentemente, mas sim em uma relação de troca, aspecto central na abordagem relacional de liderança.

Palavras-chave: liderança relacional; professores liderados; escolas privadas

 

Abstract

Part of the literature on leadership in the education sector has been in charge of tracing ideal leadership profiles without taking into account what teachers consider to be essential characteristics of this leader. Furthermore, there are few studies that deal specifically with the expectations of subordinates in relation to directors. Taking such gaps as a starting point, the objective of the research was to capture the perception of high school teachers from private schools about the relationships established with the directors, the leaders in this case. As for the method, qualitative research was carried out involving twelve interviews with teachers from private schools in four Brazilian states. The empirical findings indicate that the relationship is considered a critical aspect for effective leadership in the school environment, in the unanimous view of the interviewed teachers. Relational aspects emerged in the answers to most of the research questions, whether about what it means to be a leader; whether in relation to the skills required of the director; or in terms of the impacts of the leader on the performance of professors. The findings also point out that the leader, in the view of the interviewees, is the one who provides the direction considering the needs and expectations of the different followers. Therefore, when there is a concern to listen to the perspective of the leader, it is assumed that leadership only materializes in the relationship with the other. That is, leader and subordinate do not exist independently, but in an exchange relationship, a central aspect in the relational approach to leadership.

Keywords: relational leadership; teachers led; private schools

 

1. Introdução

 

A discussão sobre gestão e liderança no ambiente educacional geralmente é marcada por diversas barreiras, pois entende-se que a instituição escolar, pela sua missão pedagógica e educativa, não deve ser administrada como uma empresa (TRIGO; COSTA, 2008; COSTA; CASTANHEIRA, 2015). Para Takahashi e Sarsur (2012), ainda persiste uma resistência na adoção de mecanismos gerenciais e de liderança nas escolas brasileiras.

Porém, cada vez mais constata-se a necessidade de capacitar as lideranças das escolas para conduzir os times e a instituição, pois a atuação e o perfil do diretor exercem influência significativa no desempenho dos professores e da escola, como apontam diversos estudos na área (LEITHWOOD; HARRIS; HOPKINS, 2006; OLIVEIRA; CARVALHO, 2018). Para Honorato (2018), a liderança constitui-se em um dos fatores de maior impacto na qualidade dos processos educacionais. Nessa linha, Gurr (2015) aponta que um bom líder escolar gera maiores níveis de motivação e engajamento nos professores, impactando, consequentemente, a qualidade das aulas e o relacionamento docente-aluno.

Para Duarte e Oliveira (2016), a gestão dos sistemas de ensino sofreu mudanças em sua trajetória e, dentre elas, a valorização da importância de uma gestão com maior flexibilidade, descentralização das decisões e ênfase nos resultados, com o intuito de se desenvencilhar de rastros de uma gestão centralizadora e regulamentadora. Corroborando essa visão, diversos estudos apontam que a liderança escolar está mudando de uma liderança “heróica” centrada no indivíduo para uma liderança mais compartilhada (HONIG; LOUIS, 2007; GURR, 2004, 2015; OLIVEIRA; CARVALHO, 2018; SHAVA; TLOU, 2018), característica mais alinhada à noção de liderança relacional, uma das abordagens mais contemporâneas no campo da liderança (D’ÁVILA; OLIVEIRA; DINIZ; SANT’ANNA, 2020; UHL-BIEN; ARENA, 2018; MENDES; SANT’ANNA; DINIZ, 2021).

Quanto à produção científica na área educacional, o uso dos termos gestão e liderança nas publicações da área são utilizados como sinônimos e alguns autores destacam a necessidade de distinguir tais conceitos (EARLEY; WEINDLING, 2004; COSTA; CASTANHEIRA, 2015). Takahashi e Sarsur (2012) complementam que, embora a literatura sobre educação contemple algumas discussões sobre o perfil de líderes no ambiente escolar, não existem estudos que tratam especificamente das expectativas dos liderados em relação aos diretores, foco deste artigo. Assim, parte da literatura se encarrega de traçar perfis de liderança ideais sem, muitas vezes, levar em conta o que os professores consideram como características essenciais deste líder.

Tomando como ponto de partida tais lacunas, o objetivo central da pesquisa foi captar a percepção de professores do ensino médio de colégios privados sobre as relações estabelecidas com os diretores, as lideranças nesse caso. Foram analisadas, particularmente, as seguintes dimensões: i) a percepção dos professores sobre o que é ser líder; ii) as habilidades requeridas para o exercício da liderança; iii) os impactos do perfil do líder no desempenho dos professores.

 

2. Referencial Teórico

 

A revisão teórica deste artigo está subdividida em dois grandes temas, iniciando-se com uma discussão sobre os conceitos e os fundamentos da abordagem relacional de liderança. Essa seção se encerra com uma discussão sobre o papel e os impactos da liderança no ambiente escolar.

 

 

2.1. Liderança Relacional

 

Uma das abordagens mais contemporâneas no campo da liderança é a relacional. Um dos principais fundamentos dessa linha é a de que a liderança é um fenômeno que não se dá somente na pessoa do líder, mas trata-se de um processo de interação social de influência mútua entre líderes, liderados e outros atores inseridos em contextos organizacionais e societais (UHL-BIEN, 2006; OSPINA; KERSH; QUICK, 2014; D’ÁVILA et al., 2020). O exercício da liderança relacional, portanto, se dá através de relações multilaterais, líder-liderado, liderado-liderado, líder-organização, líder-sociedade etc. (UHL-BIEN; ARENA, 2018; MENDES; SANT’ANNA; DINIZ, 2021).

Apesar de a abordagem comportamental de liderança considerar aspectos comportamentais e relacionais entre líder-liderado e a abordagem contingencial considerar fatores situações e contextuais, nenhuma abordagem anterior colocou como centro da discussão as relações multilaterais. É a escola relacional que toma como objeto central de investigação as relações multilaterais que constituem o exercício da liderança, indo além da diádica entre líder-seguidor (TURANO; CAVAZOTTE, 2016) e considerando as ambiências organizacionais /societais influentes na dinâmica da liderança (AKRAM et al. 2016; MENDES; SANT’ANNA; DINIZ, 2021). A liderança relacional, portanto, supera abordagens de liderança centradas no indivíduo, em seus traços e competências, as quais desconsideram as múltiplas conexões sociais estabelecidas entre os indivíduos, as organizações e a sociedade (UHL-BIEN; ARENA, 2018; MENDES; SANT’ANNA; DINIZ, 2021).

Em termos históricos, uma das precursoras dessa abordagem é Mary Uhl-Bien, para quem a liderança relacional é um processo de influência social que emana das conexões entre o indivíduo, a organização e o contexto no qual se inserem. Para Uhl-Bien (2003), a liderança relacional se baseia em quatro fundamentos: i) liderança não é uma posição formal e, portanto, pode ocorrer em diferentes direções (UHL-BIEN, 2006; UHL-BIEN; CARSTEN, 2018); ii) a liderança ocorre quando indivíduos usam sua influência para gerar mudança; iii) a liderança gera mudanças por meio de relações eficazes; iv) a eficácia da liderança é aprimorada pela capacidade de o indivíduo construir e sustentar relações efetivas com os outros. Sobre o primeiro ponto, Gittell (2011) sugere que a liderança relacional percebe o exercício da liderança como um fenômeno descentralizado e coletivo, desvinculado de posições hierárquicas.

Os líderes e liderados são considerados “seres relacionais” que se constituem como tal em um contexto relacional dinâmico em contínuo desenvolvimento e modificação (FAIRHURST; UHL-BIEN, 2012; UHL-BIEN; CARSTEN, 2018; D’ÁVILA et al., 2020). Logo, a problemática central está em entender os processos relacionais nos quais a liderança emerge e é exercida (SANT’ANNA; PADILHA; TREVISOL; FILIPPIM; BENCKE, 2017).

Por relações, Uhl-Bien (2006) entende as conexões comunicativas e sujeitas a múltiplos significados. A organização, por sua vez, é entendida como uma rede de pessoas e relações complexas e contínuas que se modificam ao longo do tempo e do espaço. Portanto, a tônica desloca-se do indivíduo para a dinâmica do coletivo, partindo da premissa que a liderança é emergente e inseparável do contexto em que é exercida (SANT’ANNA et al., 2017).

Os papéis de líder e liderado devem ser “relacionalmente” reconhecidos e legitimados pela outra parte (Sant’Anna, Nelson e Carvalho Neto, 2015), o que apoia a visão de que líder e liderado não podem existir independentemente, mas que devem ser construídos relacionalmente por meio de um processo complexo de interação que vai além da relação diádica líder-liderado (UHL-BIEN; CARSTEN, 2018; ENDRES; WEIBLER, 2017). Nessa linha, o líder relacional geralmente se preocupa mais em desenvolver relacionamento com as pessoas do que em desenvolver mecanismos formais de gestão (SANT’ANNA; NELSON; CARVALHO NETO, 2015; SILVA; FILIPPIM; SANT’ANNA, 2020).

Assumir uma orientação relacional significa, então, reconhecer que os fenômenos organizacionais existem em relações interdependentes e significados intersubjetivos. Nessa perspectiva, conhecer é sempre um processo de relacionamento; relacionar-se é um processo construtivo e contínuo de construção de significado (UHL-BIEN, 2006; FAIRHURST; UHL-BIEN 2012; OLIVEIRA et al., 2015; UHL-BIEN; CARSTEN, 2018).

Diante das definições sobre Liderança relacional, como se caracteriza este tipo de líder? Para Gittell (2011), o líder relacional possui os seguintes atributos: i) uma mente intuitiva capaz de perceber as forças complexas que influenciam a construção de significados coletivos; ii) um pensamento analítico para compreender problemas complexos; iii) habilidade para lidar com ambientes dinâmicos e incertos.

Para Akram et al. (2016), líderes que desenvolvem um comportamento relacional com os subordinados, ou seja, sendo inclusivos, capacitando, cuidando e respeitando o outro, ensinam os liderados a terem empatia com os outros e a construir relacionamentos eficazes. Para além de atributos pessoais, o líder relacional deve ter visão sistêmica; capacidade de construir relacionamentos interpessoais; habilidade de comunicação e escuta.

Após observarem profissionais ocupando posições estratégicas em diferentes organizações, Sant’Anna, Nelson e Carvalho Neto (2015) apontam que a capacidade de construir laços sociais efetivos com as pessoas é uma característica central nesse estilo de liderança, aspecto corroborado por outros estudos (GITTELL, 2011; AKRAM et al. 2016; D’ÁVILA et al., 2020). Sendo o líder o agente no centro de três dimensões (indivíduo-organização-sociedade), a dimensão individual pode ser entendida como a capacidade do líder de inspirar e mobilizar as competências dos indivíduos em suas relações. Já a dimensão organizacional está relacionada à capacidade do líder de estimular a criação de um contexto organizacional propício ao surgimento de equipes de alta performance. Por fim, a dimensão societal está associada à capacidade do líder de navegar em diferentes ambientes com diferentes stakeholders (SANT’ANNA; NELSON; CARVALHO NETO, 2015).

Outros atributos associados ao líder relacional foram reunidos no Quadro 1.

 

Quadro 1: Atributos da Liderança Relacional

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Fonte: Adaptado de Sant’Anna et al. (2015).

 

2.2. Educação e liderança

 

Uma escola é uma organização complexa composta por diferentes indivíduos (professores, diretores, funcionários, alunos, pais, comunidade), pelas suas interações e pelos processos de negociação social que constroem o próprio ambiente escolar (DAY, 2007). É reconhecida como unidade social com funções técnica, pedagógica e administrativa (LIBÂNEO, 2004).

A discussão sobre o papel do líder no ambiente escolar é feita em vários estudos na área. Para Libâneo (2004), o diretor é o responsável pela condução da escola, tem a visão do conjunto, articula e integra vários setores e pessoas. Para Takahashi e Sarsur (2012) é de fundamental importância o papel da liderança na definição de diretrizes e estratégias de ação, aspecto também evidenciado em outros estudos (LEITHWOOD; HALLINGER, 2002; HONIG; LOUIS, 2007; COSTA; CASTANHEIRA, 2015).

Honig e Louis (2007) e Takahashi e Sarsur (2012) afirmam que o papel do diretor é fundamental para assegurar a unidade, bem como a implementação do programa institucional e o desempenho escolar é influenciado, em maior ou menor grau, pelo desempenho da direção. Já Brito e Costa (2010) destacam que o diretor tem um papel importante na criação de um clima favorável nas escolas. Em suas pesquisas, realizadas com professores, os relatos dos docentes sugerem a influência do perfil do gestor neste clima positivo na unidade educativa.

Oliveira e Carvalho (2018) acrescentam que os líderes escolares podem criar ambientes que promovam a melhoria do ensino e da aprendizagem, envolvendo os professores e a comunidade escolar no processo decisório, criando uma cultura de colaboração e confiança onde as fontes de liderança sejam distribuídas por toda a comunidade escolar.

Quanto ao impacto que o papel do diretor tem no desempenho escolar, para autores como Leithwood e Hallinger (2002), Leithwood, Harris e Hopkins (2006), Gurr (2015), Oliveira e Carvalho (2018) e Shava e Tlou (2018), líderes escolares eficazes exercem uma influência indireta, mas poderosa no desempenho da escola e dos alunos.

Em suas pesquisas, Leithwood e Hallinger (2002), Leithwood, Harris e Hopkins (2006), Gurr (2015) e Oliveira e Carvalho (2018) concluíram que os líderes das escolas melhoram o ensino e a aprendizagem de forma indireta por meio de sua influência na motivação, no comprometimento e nas condições de trabalho das pessoas. Os estudos revelam ainda que a liderança escolar tem uma influência mais positiva quando ela é exercida de forma distribuída ao invés de centralizada na figura do diretor.

Em estudo realizado por Sammons, Hillman e Mortimore (1995), cujo foco foi estabelecer as características que melhor descrevem escolas bem-sucedidas, identificou-se que há, pelo menos, onze características e a primeira delas foi uma “liderança profissional”.

Gurr (2015) aponta que os líderes escolares bem-sucedidos são centrados nas pessoas, mantém relações e envolvimento ativo com os indivíduos, buscando alcançar um consenso sobre a direção da escola. Ademais, são sensíveis ao contexto, ajustando suas respostas ao contexto e à cultura da unidade escolar.

Autores como Leithwood e Hallinger (2002), Leithwood, Harris e Hopkins (2006), Honig e Louis (2007) e Costa e Castanheira (2015) afirmam que liderança é um fenômeno disperso presente em diversos níveis e setores da escola e não propriamente um atributo do gestor que ocupa a posição de direção. Porém, ainda assim, os diretores são figuras centrais na liderança escolar, apesar de todo o interesse na liderança compartilhada e distribuída (BUSH, 2019).

 

3. Metodologia da pesquisa

 

O propósito central da pesquisa foi captar a percepção dos professores de colégios privados sobre as relações estabelecidas com os diretores, as lideranças nesse caso. Nesse sentido, o método qualitativo de pesquisa se mostrou o mais adequado ao privilegiar a perspectiva dos liderados sobre os processos relacionais, capturando a voz dos professores sobre relações de natureza complexa e subjetiva (YILMAZ, 2013). Ademais, o objetivo do estudo é condizente com uma pesquisa mais aprofundada e contextual e a abordagem qualitativa é mais efetiva para estudos deste tipo (YILMAZ, 2013).

O caso delimitado não foi uma organização ou indivíduo, mas sim as relações estabelecidas entre líderes (diretores de escola) e liderados (professores). Para Yin (2005), as evidências de um estudo de caso podem advir de diversas fontes, sendo uma delas a entrevista semiestruturada, técnica adotada na pesquisa de campo realizada. A entrevista semiestruturada permite a interação do pesquisador com o entrevistado, permitindo ao participante discorrer sobre o tema sem se prender de forma rígida à indagação, contribuindo para a emergência de aspectos não planejados (MINAYO, 2010).

O roteiro de entrevista foi elaborado considerando a intenção de captar a voz dos liderados (os professores) sobre o fenômeno da liderança. O instrumento foi composto por três blocos de perguntas, contemplando dados sobre: i) perfil dos docentes (sexo, idade, tempo de docência); ii) a percepção dos professores sobre o que é ser líder e as habilidades requeridas para o exercício da liderança; iii) o impacto do perfil de um líder no desempenho dos professores.

As entrevistas foram realizadas com doze professores de escolas privadas de quatro estados brasileiros (Minas Gerais, Bahia, Rio de Janeiro e Distrito Federal). Sendo um dos pesquisadores diretor(a) de escola, foi utilizada a sua rede relacional para a seleção dos primeiros entrevistados, que foram indicando outros potenciais participantes.

Os principais critérios de seleção dos entrevistados foram: ser docente de escola da rede privada e não de instituição pública; ter curso superior; estar há mais de um ano no Colégio e não exercer cargos de gestão; lecionar diferentes disciplinas, para captar profissionais com diferentes visões. Os professores entrevistados, com idades entre 35 e 66 anos, lecionam disciplinas de Artes, Biologia, Educação física, Filosofa, Física, Geografia, Inglês, Língua Portuguesa, Matemática e Química. O quadro 2 contempla outros dados dos sujeitos entrevistados.

 

Quadro 2: Perfil dos professores entrevistados

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Fonte: Dados da pesquisa.

A duração média das entrevistas foi de 45 minutos e todos os áudios foram gravados e transcritos para facilitar a etapa de tratamento e análise dos relatos. Para a análise dos dados, foi adotada a técnica de análise de conteúdo (BARDIN, 2004). As falas dos professores entrevistados foram sendo lidas, interpretadas, recortadas e agrupadas, à luz das seguintes categorias previamente definidas: i) percepção dos professores sobre o que é ser líder; ii) habilidades requeridas para a liderança; iii) o impacto do perfil de um líder no desempenho dos professores.

 

 

4. Descrição e análise dos dados

 

A percepção dos liderados sobre o que é ser líder se mostrou convergente. A maioria dos entrevistados conceituou o líder como àquele indivíduo que, a partir de objetivos e metas definidas, conduz e mobiliza um grupo de pessoas em direção aos resultados pretendidos. Então, para os professores, o diretor da escola fornece a direção, mas considera as opiniões e as necessidades dos diferentes liderados. Portanto, essa influência que o líder exerce não é feita de forma unilateral, nem arbitrária, mas sim considerando as necessidades dos professores e os interesses coletivos, achado convergente com o estudo de Gurr (2015) que aponta que os diretores bem-sucedidos buscam alcançar um consenso sobre os rumos da escola. Os relatos que seguem ilustram tal discussão.

Líder é uma pessoa que vai escutar o grupo, que vai observar as necessidades, vai saber o caminho que vai ser melhor para todos seguirem, em equipe. Que vai ajudar todos a terem a sua melhor performance (Entrevistado 2).

O diretor, o coordenador, eles são figuras de respeito, mas eles também são figuras que me motivam, que me mostram o caminho, assim eles vão juntos construindo, uma construção compartilhada, como se eu também participasse (Entrevistado 07).

Essa definição dada pelo entrevistado tem relação com a abordagem relacional de liderança (UHL-BIEN; CARSTEN, 2018; ENDRES; WEIBLER, 2017), pois quando há uma preocupação em compreender a perspectiva do outro para a definição do caminho, pressupõe-se que o exercício de liderar só se concretiza na relação com o outro. Portanto, essa influência que o líder exerce não é feita de forma unilateral, nem arbitrária, mas sim considerando as necessidades dos professores e os interesses coletivos.

A questão da participação dos professores foi recorrentemente citada nas entrevistas como algo fundamental no exercício da liderança. Ainda que o diretor da escola seja o condutor do grupo, os entrevistados concordaram que as estratégias para o alcance dos resultados devem ser definidas de forma colaborativa. E que a aceitação do diretor da escola pelos professores é alcançada por meio dessa relação de cooperação (GURR, 2015), conforme apontam os dados.

Embora exista a participação dos liderados, a maioria dos entrevistados acrescentou que, após esse processo de escuta, a decisão deve ser tomada pelo diretor da escola, ainda que isso contrarie a posição dos professores. Ou seja, “(...) quem escolhe o melhor caminho é ele” (Entrevistado 07). Alguns entrevistados apontam que o líder deve ter segurança e um posicionamento firme no processo decisório.

O relato do Entrevistado 7 indica que mesmo que o líder defina o caminho, só o fato dele buscar a participação das pessoas torna a sua decisão legítima: “Mas no fundo a gente sabe que a escolha cabe muito a eles, mas eu sinto que eu estou participando” (Entrevistado 07). Esses dados corroboram aspectos do conceito de liderança relacional em que a liderança pode ser caracterizada pelo interesse e preocupação com as pessoas e com os relacionamentos (UHL-BIEN, 2006; MENDES; SANT’ANNA; DINIZ, 2021).

Ressalta-se ainda que os professores expuseram a necessidade de legimitação do diretor por parte dos professores para que ele seja considerado líder e isso se dá no processo relacional. Tal achado está alinhado aos estudos de Sant’Anna, Nelson e Carvalho Neto (2015) e de Mendes, Sant’Anna e Diniz (2021), que pontuam que, no espaço de uma relação de liderança, o indivíduo deve necessariamente ser legitimado pelo liderado para que a influência de fato ocorra. E corrobora ainda a noção de que os papéis de líder e liderado devem ser socialmente reconhecidos e validados pela outra parte (SANT’ANNA; NELSON; CARVALHO NETO, 2015).

Comparando os achados com a literatura na área de educação, observam-se algumas diferenças. Alguns estudos consideram gestor e líder como sinônimos (EARLEY; WEINDLING, 2004; COSTA; CASTANHEIRA, 2015) e os dados, por outro lado, evidenciam que os entrevistados têm clareza sobre a diferença entre esses termos. Os professores relataram que já foram conduzidos por alguns “gestores” ao longo de suas trajetórias e que eles adotavam comportamentos opostos ao da liderança. Os docentes relataram posturas de gestores que impõem as suas escolhas; que não realizam uma comunicação efetiva com o grupo; que não buscam estabelecer relações próximas; que tratam os professores de forma desrespeitosa, com falas rudes; que priorizam processos administrativos e números em detrimento das pessoas.

Sobre esse último ponto, Silva, Filippim e Sant’Anna (2020) pontuam que o líder efetivo geralmente gasta menos energia em processos administrativos formais, direcionando mais tempo na construção de relacionamentos com as pessoas. Os efeitos da atuação de um gestor nos moldes relatados acima foram discutidos pelos entrevistados. Os professores relataram falta de: motivação, direção para o trabalho e identificação com a escola, achado alinhado aos estudos que abordam o impacto da atuação do líder no desempenho das pessoas e da instituição (LEITHWOOD; HALLINGER, 2002; OLIVEIRA; CARVALHO, 2018; SHAVA; TLOU, 2018). Alguns até mencionaram o desejo de saírem do emprego motivado pelo relacionamento ruim com o diretor, como informa o Entrevistado 04:

Era aquilo e pronto acabou, mas ele não justifica o porquê que você tinha que usar aquela metodologia de ensino. Ele era totalmente impositivo e totalmente fechado a novas ideias e isso para mim marcou bastante ... foi até um dos motivos da minha saída de lá, e quando você argumentava você acabava sendo é prejudicado, aquelas coisas antigas mesmo. (...) Aquela imposição por medo (Entrevistado 04).

Em relação às habilidades requeridas para que o diretor seja um líder, o atributo mais recorrentemente citado nos relatos foi a sua capacidade de ouvir o outro e de estabelecer um diálogo aberto com os professores (AKRAM et al., 2016). A maioria dos entrevistados comentou sobre a necessidade de serem ouvidos de maneira sincera e interessada pelo líder e sobre a importância dessa escuta para construção das estratégias da escola, como se pode observar na seguinte fala:

Tem muito diretor que eu já tive que jamais ouviu o grupo dele, a gente reunia, discutia, tinha ideias muitos boas, mas chegava no diretor ele já tinha tudo do jeito dele. Então, a gente perdia o estímulo de criar alguma coisa, então eu acho essa uma característica fundamental é não ser uma pessoa autoritária. O diretor que está sempre ouvindo todo mundo ele aprende também, é importante ele entender que não é dono da verdade (Entrevistado 01).

Alguns entrevistados ressaltaram que a necessidade da escuta não está necessariamente relacionada à mudança de decisão por parte do líder. Ou seja, mais uma vez os dados apontam que, na perspectiva de alguns entrevistados, a decisão é efetivamente tomada pelo diretor e não pelo grupo. Porém, é fundamental que ele considere a opinião dos professores, mesmo que elas não sejam acatadas. Portanto, o fato de serem ouvidos de forma interessada e aberta é um aspecto crítico no exercício da liderança: “você se sentir ouvido, mesmo que a sua reivindicação não seja atendida, mostrar que tem um acolhimento dessa reivindicação”.

Ademais, a maioria dos professores relatou que as decisões que o diretor toma considerando a visão dos professores geralmente é “mais acertada”, corroborando Uhl-Bien (2006), para quem a liderança se dá quando líderes e seus seguidores conseguem desenvolver relações eficazes (parcerias) que resultem em mútua influência.

Na visão dos entrevistados, esse diálogo deve ser estabelecido não só com os professores, mas também com os demais funcionários da escola. Tal achado vai ao encontro aos pressupostos da liderança relacional e de suas relações multilaterais, que não se resumem a líder-liderado, mas também a pares e a outros atores dentro das organizações (UHL-BIEN, 2006; UHL-BIEN; OSPINA, 2012; D’ÁVILA et al., 2020).

A habilidade de escutar o outro está relacionada a outro ponto bastante mencionado nos relatos dos entrevistados: a flexibilidade. Como a escola é um ambiente caracterizado pela diversidade e formado por diferentes grupos com interesses variados (a direção, os professores, os funcionários administrativos, os alunos, os pais etc.), o diretor deve ter “jogo de cintura” para receber/considerar opiniões diversas e se adaptar às diferentes demandas: “Eu acho que na educação você tem que ter muita flexibilidade, ter que aprender muito a ouvir” (Entrevistado 4). Tal achado tangencia a discussão feita por Duarte e Oliveira (2016), que pontuam que a gestão dos sistemas de ensino sofreu mudanças em sua trajetória e, dentre elas, a valorização da importância de uma gestão com maior flexibilidade.

A segunda habilidade mais mencionada pelos professores entrevistados foi a empatia (AKRAM et al., 2016), que tem estreita relação com a liderança relacional, ou seja, com a capacidade de se colocar no lugar do outro, o que ajuda muito a desenvolver a escuta e, consequentemente, uma comunicação de várias vias (UHL-BIEN, 2006; SANT’ANNA et al., 2015; SILVA; FILIPPIM; SANT’ANNA, 2020). Alguns entrevistados fizeram questão de mencionar que essa habilidade não foi citada por questões de “modismo”, mas pela real necessidade da liderança se colocar no lugar do outro e de ter uma visão mais humana no ambiente escolar: (...) a gente teve uma liderança mais humana, uma liderança que tratava a gente no mesmo nível, dava poder, dava espaço (Entrevistado 08).

Alguns relatos mencionam a importância da empatia, como se pode depreender na seguinte fala: “Empatia: o líder que se coloca no lugar do professor; ele tem bastante chance de me manter na escola.” (Entrevistado 02).

O professor lida com uma diversidade de situações em sala de aula e fora dela relacionadas às demandas inerentes à docência; à diversidade de perfis de alunos; às exigências da instituição e da coordenação; aos trabalhos complementares da profissão que são desenvolvidos em suas casas, como planejamento, estudos complementares, lançamentos de notas/frequências, atualizações em recursos tecnológicos etc. Portanto, ter um líder capaz de se colocar no lugar deles (o exercício da empatia), que busca compreender as suas vivências e necessidades e que oferece suporte ao trabalho docente contribui para maiores níveis de engajamento do time:

Muitos gestores não sabem mesmo o que está acontecendo dentro da sala de aula. Então quando um gestor me chama e pergunta “como está a sua turma? Quais têm sido os seus desafios no primeiro ano?” Ele está me ganhando (Entrevistado 02).

Essa percepção dos entrevistados coincide com estudos de Leithwood e Hallinger (2002), que afirmam que, quando os professores são empoderados e ouvidos, eles se comprometem mais com a escola, o que sugere a necessidade de uma liderança mais relacional na educação.

Além da capacidade de ouvir e de ter empatia, os dados apontam que a comunicação é outra habilidade requerida ao diretor (AKRAM et al., 2016), aspecto citado por todos os entrevistados. A capacidade de se comunicar de forma clara, transparente (evitando ruídos) e compartilhando diretrizes é um atributo importante em boas lideranças, conforme ilustra o relato abaixo. Aliás, clareza e transparência foram duas expressões recorrentemente citadas pelos entrevistados como atributos relevantes para o exercício da liderança.

Eu acho que a boa liderança se comunica. E isso é muito incomum. Nas escolas, é comum o diretor te chamar em num canto [...] e falar pelo corredor. Não merecia ser uma instrução, merecia ouvir minha opinião para eu poder debater. Não é feito nada disso, hoje em dia tem o WhatsApp, não é? Pior do que o corredor é o WhatsApp, tem que ficar atento ao grupo da escola, porque uma coisa muito importante pode ter sido ser “cuspida” ali, se você não é um cara atento ao grupo você se perde (Entrevistado 02).

Esse entendimento dos entrevistados é identificado na abordagem relacional, que considera que a liderança ganha legitimidade e produz resultados por meio de processos relacionais (OSPINA; KERSH; QUICK, 2014), e certamente a comunicação é um destes processos, uma comunicação que vá além da mão dupla líder-liderado, como elucidado pelo Entrevistado 02. Os professores relataram também que a transparência e a clareza do líder em sua gestão fazem com que eles conheçam a realidade do colégio, seus objetivos e metas e se alinhem às expectativas da instituição, além de criar certa consistência entre as pessoas.

Em relação às habilidades requeridas ao líder no ambiente escolar, outro aspecto bastante citado nas entrevistas feitas foi o conhecimento administrativo e pedagógico. Os professores relataram que é importante que o diretor tenha capacidade de gestão administrativa, permitindo ao professor ter tranquilidade e segurança para se dedicar às questões acadêmicas, conforme ilustra o relata o Entrevistado 08: é um cara que se preocupa em resolver as outras questões para que a gente possa simplesmente pensar na questão de sala de aula.

Além do conhecimento administrativo, os entrevistados mencionaram a importância do conhecimento pedagógico, ou seja, que o diretor seja capaz de orientar a equipe docente em relação à linha pedagógica da escola (conforme ilustra o relato da Entrevistada 11), e que proporcione formação e aprimoramento contínuos sobre metodologias de ensino-aprendizagem. Normalmente o diretor possui graduação em pedagogia, sendo ele um profissional generalista e os professores de ensino médio são especialistas graduados na área em que lecionam.

Nós não somos pedagogos, né, e a linguagem pedagógica para a gente às vezes, muitas vezes, é incompreensível, então o meu líder imediato é um pedagogo né, que me acompanha, [...] a questão da aprendizagem, a gente precisa desse acompanhamento porque atualmente são diversos tipos de transtornos, distúrbios, que comprometem a aprendizagem e nós não somos habilitados para trabalhar com essas questões (Entrevistada 11).

Comparando tais achados com a literatura sobre liderança relacional, constata-se que o conhecimento técnico, seja ele administrativo ou pedagógico, não está diretamente ligado à abordagem relacional da liderança, que prioriza a análise das relações e não dos atributos individuais do líder. A importância deste conhecimento técnico, que não foi encontrada na literatura específica sobre liderança relacional, foi identificada no estudo de Rezende (2016) como a característica considerada mais essencial no processo de liderança na perspectiva dos liderados, que no estudo citado eram funcionários do chão de fábrica.

Quanto aos efeitos que o perfil do líder gera no desempenho dos professores, foi unânime a percepção de que uma boa liderança “(..) muda muito a nossa perspectiva de trabalho” (Entrevistado 08), gerando maiores níveis de motivação e engajamento. Os professores sentem-se mais motivados a executar um trabalho com excelência, o que impacta na qualidade das aulas e no relacionamento docente-aluno, achado convergente com as pesquisas de Leithwood, Harris e Hopkins (2006), Gurr (2015) e Oliveira e Carvalho (2018). Ademais, uma boa liderança estimula os liderados a proporem projetos, inovações e participarem de forma mais ativa na construção de atividades escolares, conforme se pode observar nas seguintes falas:

[...] estava muito nesse cenário de liderança negativa, a gente acabava ficando desmotivado, era simplesmente ordem, e de repente mudou a liderança completamente. Sabe quando você tem o brilho nos olhos novamente, isso é querer fazer... nossa é, eu nunca tive essa possibilidade de falar, de fazer, de participar, eu simplesmente cumpria ordem (Entrevistado 08).

A gente ficava com a sensação de que a gente ia para fazer na escola acontecer, inclusive essa foi a escola que eu sempre priorizei, esses eventos chatos que tem de escola sabe? Eu não faltava a nenhum porquê... inclusive eu sempre tinha alguma coisa que eu tinha criado (Entrevistado 02).

É importante ressaltar como a percepção dos professores sobre o diretor é moldada pela relação estabelecida entre eles. Ou seja, o professor percebe o líder, o diretor da escola nesse caso, não por atributos individuais, mas por aspectos relacionais. Portanto, o processo relacional, um dos principais fundamentos da liderança relacional é retratado nas entrevistas como um elemento central na definição do que é um bom líder no contexto escolar. Como salientado por Uhl-Bien e Carsten (2018), não é possível compreender plenamente a liderança sem incluir o papel dos liderados no processo de liderança, pois as pessoas não agem independentemente como indivíduos isolados, mas em relação aos outros e inseridos no contexto (ENDRES; WEIBLER, 2017).

Os relatos dos Entrevistados 08 e 09 ilustram como qualidade do relacionamento estabelecido entre diretor-professor impacta no comprometimento do corpo docente:

Quando a pessoa te trata com respeito, quando a pessoa te trata bem, quando a pessoa te dá é... poder para fazer, poder para decidir, só acaba criando admiração. Quando você tem um tratamento legal, você acaba admirando a pessoa, você percebe que ela estava numa posição superior porque ela tem um cargo de liderança, mas que ela não usa disso para te diminuir, para te tratar mal, para te humilha. Eu tenho um comprometimento com o líder, porque você não quer decepcionar esse líder, não quer pisar na bola, porque ele te dá todas as possibilidades para você exercer um trabalho (Entrevistado 08).

[...] agora você tem uma pessoa que sabe conversar, sabe cobrar, nossa você vai fazer de tudo para nunca decepcionar, você sempre tentar fazer a coisa da melhor forma possível (Entrevistada 09).

Nessa linha, diversas pesquisas têm enfatizado a relevância da relação entre o diretor da escola e os professores para melhoria do desempenho da instituição (OLIVEIRA; CARVALHO, 2018), corroborando a importância de investigar como os professores percebem e se relacionam com a liderança, o diretor nesse caso.

 

5. Considerações finais

 

Analisando os achados obtidos acerca das relações estabelecidas na díade professor-docente no contexto de escolas privadas de educação básica, observou-se que o relacionamento é aspecto central para uma liderança eficaz no ambiente escolar, na visão dos professores entrevistados. Aspectos relacionais emergiram nas respostas da grande maioria das questões de pesquisa, seja sobre o que é ser líder; seja em relação às habilidades requeridas ao diretor; seja quanto aos impactos do perfil do líder no desempenho dos docentes.

Os dados parecem indicar, também, que a dimensão relacional exerce influência significativa no nível de legitimidade do diretor enquanto líder. Ou seja, dependendo da qualidade do relacionamento entre diretor-professor, os professores podem ou não considerar o diretor um “bom” líder.

Os achados apontam ainda que o líder, na visão dos entrevistados, é quem fornece a direção considerando as necessidades e expectativas dos diferentes liderados. Portanto, quando há um interesse em ouvir e captar a perspectiva do outro para a construção do caminho, pressupõe-se que a liderança só se concretiza na relação com o outro. Ou seja, líder e liderado não existem independentemente, mas sim em uma relação de troca, aspecto central na abordagem relacional de liderança.

Todavia, um aspecto que foi enfatizado pelos entrevistados é que, embora o líder envolva os professores na construção das ideias, a decisão compete ao diretor, mesmo que isso contrarie a posição dos docentes. Então, emerge a seguinte indagação: o processo decisório é efetivamente coletivo ou individual?

Em relação às habilidades requeridas para que o diretor seja um líder, quatro características foram identificadas nos achados de pesquisa. Uma delas foi a capacidade de ouvir o outro e de estabelecer um diálogo aberto com os professores. Tal achado corrobora fundamentos da abordagem relacional que indica que a liderança é caracterizada pela preocupação com as pessoas e com os relacionamentos. Outra habilidade seria a flexibilidade na gestão da escola pela natureza complexa de uma instituição acadêmica que abarca indivíduos com interesses e perfis diversos. A empatia, que tem estreita relação com a liderança relacional, ou seja, com a capacidade de se colocar no lugar do outro o que ajuda muito a desenvolver a escuta e, consequentemente, uma comunicação de várias vias.

Por fim, outras duas habilidades relevantes identificadas nos dados empíricos foram: a capacidade de se comunicar de forma clara e transparente, compartilhando diretrizes; e o conhecimento administrativo e pedagógico do diretor.

Quanto aos efeitos que o perfil do líder gera no desempenho dos professores, foi unânime a percepção de que uma boa liderança gera maiores níveis de motivação e engajamento, impactando, de forma indireta, o desempenho da instituição.

Quanto às suas contribuições, esse estudo é relevante ao fornecer a visão dos liderados sobre o fenômeno da liderança, conforme a recomendação de Versiani, Caeiro e Carvalho Neto (2017), que revelam a importância de trazer a perspectiva do liderado como objeto de pesquisa, para que suas impressões preencham a lacuna entre o ideal discursivo do líder e a prática relatada sob a perspectiva dos liderados. Na literatura sobre educação, especificamente, são raríssimos os estudos que trouxeram as expectativas dos liderados em relação aos diretores. Por fim, outra contribuição deste estudo está em inserir a discussão da abordagem relacional de liderança, uma das mais contemporâneas do campo, no ambiente escolar, ainda caracterizado por um estilo de gestão tradicional e centralizador.

 

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