Capacidades Dinâmicas: gestão da inovação em uma empresa de serviços de estética e emagrecimento
Dynamic Capabilities: innovation management in a beauty and weight loss services company
DOI: http://www.doi.org/10.5935/2177-4153.20240015
Luciléia Galdino Moren1, Zoraide da Fonseca Costa2,
João Francisco Morozini3 e Pedro Gonçalves Diniz Fernandes4
1 Universidade Estadual do Centro-Oeste (UNICENTRO), Brasil, Mestrado em Administração,
e-mail: lucileiamoreno29@gmail.com, ORCID: https://orcid.org/0000-0003-1470-129X
2 Universidade Estadual do Centro-Oeste (UNICENTRO)x, Brasil, Doutorado em Energia na Agricultura,
e-mail: zoraide@unicentro.br, ORCID: https://orcid.org/0000-0002-9368-5146
3 Universidade Estadual do Centro-Oeste (UNICENTRO), Brasil, Doutorado em Administração,
e-mail: jmorozini@unicentro.br, ORCID: https://orcid.org/0000-0001-8183-2746
4 Universidade Estadual do Centro-Oeste (UNICENTRO), Brasil, Mestrado em Administração,
e-mail: pediniz@yahoo.com.br, ORCID: https://orcid.org/0009-0004-9268-0230
Recebido em: 22/02/2024 - Revisado em: 22/04/2024 - Aprovado em: 29/04/2024 - Disponível em: 30/09/2024
Resumo
O presente estudo possui como objetivo geral analisar de que forma uma pequena empresa de serviços de estética e emagrecimento tem articulado seu contexto interno e seus processos para gerenciar a inovação, sob a ótica da teoria das capacidades dinâmicas. O estudo desenvolvido tem caráter descritivo e abordagem qualitativa, adotando o método do estudo de caso e utilizando entrevista a partir de um roteiro semiestruturado para a coleta de dados junto aos gestores da empresa. Para compreensão dos discursos, foram analisados e interpretados aplicando a técnica de análise de conteúdo a partir das categorias de análises das capacidades dinâmicas para gestão da inovação. Verificou-se que para criar e realizar inovações, a empresa pesquisada recorre a capacidades dinâmicas de gestão da inovação em serviços, ou seja, recursos e capacidades operacionais relacionados ao domínio da gestão funcional, que estão inseridos em suas próprias rotinas e processos. Deste modo, na empresa pesquisada, a inovação em serviços assumiu várias formas e está vinculada a diferentes partes do processo de criação de valor dessa empresa. Como contribuição prática, este estudo possibilita a melhor compreensão da gestão da inovação em serviços, podendo auxiliar os envolvidos na gestão da inovação em serviços em suas atividades.
Palavras-chaves: Capacidades dinâmicas; Gestão da inovação; Inovação em serviço.
Abstract
This study aims to analyze how a small beauty and weight loss services company has articulated its internal context and processes to manage innovation, from the perspective of the dynamic capabilities’ theory. The study adopts a descriptive and qualitative approach, employing a case study method and utilizing semi-structured interviews with the company’s managers for data collection. The collected discourses were analyzed and interpreted using content analysis techniques based on the categories of dynamic capabilities for innovation management. The findings indicate that the researched company relies on dynamic capacities for managing innovation in services, utilizing operational resources and capabilities related to functional management expertise embedded in its own routines and processes. Thus, innovation in services takes on various forms within the company and is linked to different stages of its value creation process. As a practical contribution, this study provides new insights and a better understanding of innovation management in services, which can assist stakeholders involved in service innovation management in their activities.
Keywords: Dynamic capabilities; Innovation management; Service innovation.
1 INTRODUÇÃO
Conforme o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE, 2021) o setor de serviços é caracterizado por atividades bastante heterogêneas quanto ao porte das empresas, à remuneração média e à intensidade no uso de tecnologias. Nas últimas décadas, o desempenho das atividades que compõem o setor vem se destacando pelo dinamismo e pela crescente participação na produção econômica brasileira. O setor de serviços, é, atualmente, responsável por mais da metade do PIB (Produto Interno Bruto), 45% do total de empresas, e pela geração de 75% dos empregos, sendo o maior ramo da economia do Brasil.
De acordo com os dados do DataSebrae (2023), provenientes da Receita Federal, o Brasil contava, em 2023, com mais de 22,1 milhões de empresas, sendo 49% delas, ou mais de 10,8 milhões, do setor de serviços. É importante ressaltar que 87% das empresas de serviços eram classificadas como Microempreendedor Individual e Microempresa, enquanto o restante corresponde a Empresa de Pequeno Porte e a outras categorias de porte empresarial.
Dados do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (CAGED, 2021) apontam que em fevereiro de 2021, as micro e pequenas empresas do ramo de serviços foram responsáveis por quase 58% dos empregos criados no Brasil, sendo o ramo que mais gera contratações, o que demonstra que os pequenos negócios são essenciais para o crescimento da economia e geração de empregos no país. As organizações que prestam atividades de estética e outros serviços de cuidados com a beleza representam 3% de todas as empresas de serviços no Brasil (DATASEBRAE, 2023), apresentando assim importante representatividade setorial.
Segundo a Associação Brasileira de Franchising (ABF, 2021), de 2014 a 2019, o mercado de estética no Brasil cresceu, 567%, sendo menor somente em relação aos Estados Unidos e China. Nesses 5 anos, o número de profissionais da área aumentou de 72 mil para mais de 480 mil. Conforme a ABF, somente no setor de franquias, em 2020, o ramo de saúde, beleza e bem-estar faturou R$35 bilhões. Além disso, conforme o SEBRAE (2021), com o aumento da expectativa de vida da população, as pessoas estão mais preocupadas com a qualidade de vida e com os cuidados com a saúde. Seja no controle e na prevenção de doenças, seja em atividades com fins estéticos, os brasileiros investem mais no setor. Nesse mercado, em ampla expansão, progressivamente mais concorrido e com clientes cada vez mais exigentes, é fundamental que os empreendedores desenvolvam seus serviços com excelência para gerar diferencial competitivo e inovador.
Dessa maneira a economia moderna é cada vez mais impulsionada pela prestação de serviços. Com isso, a capacidade de inovar em serviços é um diferencial para as organizações do setor, permitindo o desenvolvimento de ofertas mais atrativas e alinhadas às necessidades dos clientes, criando assim valor adicional e sustentando sua posição competitiva. A inovação de serviços e suas capacidades dinâmicas associadas são uma preocupação fundamental para muitas empresas atualmente. Alguns pesquisadores os citam como principais impulsionadores de alto desempenho consistente ao longo do tempo (Kindström; Kowalkowski; Sandberg, 2013).
Entender a importância de inovar não é suficiente para o aumento da produtividade, desempenho e competitividade de uma empresa. É imprescindível compreender que a inovação não deve ser tratada como um acontecimento isolado, mas como um processo que necessita ser gerenciado (Tidd; Bessant; Pavitt, 2005, 2008).
A gestão da inovação, segundo Tidd, Bessant e Pavitt (2008), pode ser compreendida como planejamento, organização e coordenação dos principais fatores para o desenvolvimento e a obtenção de resultados. Neste sentido, torna-se relevante, o desenvolvimento de metodologias que possibilitem que os gestores compreendam a importância da inovação, de seu gerenciamento, e que deem suporte para a implantação da gestão da inovação no contexto organizacional. Conforme Pavitt (2005), os processos de inovação diferem, entre outros aspectos, conforme o porte da empresa e os setores de atuação. Assim, a gestão desse processo deve considerar essas diferenças entre firmas e setores econômicos.
O processo de inovação em serviço é menos tangível e mais entrelaçado com as capacidades incorporadas aos processos e à rotina em toda organização, tornando relevante a combinação entre a perspectiva da inovação em serviço e das capacidades dinâmicas das empresas. As capacidades dinâmicas de inovação em serviços contribuem para uma estrutura global integrada no nível da empresa para a gestão estratégica da inovação em serviços (Den Hertog, 2010). Conforme essa corrente sobre estratégia, para uma empresa obter vantagem competitiva, além de possuir um conjunto valioso de recursos, é necessário ampliar e sustentar suas aptidões aplicando suas capacidades dinâmicas para constantemente adaptar suas rotinas e reconfigurar seus recursos (Den Hertog; Van Der AA; De Jong, 2010).
Empresas menores possuem certas vantagens, como maior agilidade na resposta às demandas do mercado, maior flexibilidade, um relacionamento mais próximo com o consumidor, melhor comunicação interna e um estilo de gestão mais dinâmico e empreendedor. Porém apresentam sérias desvantagens tais como falta de recursos financeiros, gestão inadequada, falta de qualificação dos trabalhadores, fragilidade na aquisição de informações externas e no estabelecimento de conexões, o que aumenta a necessidade de compreender o mercado no qual está inserida, saber direcionar seus esforços de inovação, compreenderem seu processo de inovação e, por meio disso, impulsionar seu desempenho e gerar vantagem competitiva (Christensen, 2012). Assim, pretende responder a seguinte pergunta de pesquisa: de que forma uma empresa de serviços de estética e emagrecimento tem articulado seu contexto interno e seus processos para gerenciar a inovação?
Essa conjuntura motivou o presente estudo, o qual analisa como uma pequena empresa de serviços de estética e emagrecimento tem articulado seu contexto interno e seus processos para gerenciar a inovação, sob a ótica da teoria das capacidades dinâmicas.
O artigo está organizado em seis capítulos. O capítulo 1 contextualiza e define o problema de pesquisa e objetivo geral. O capítulo 2 apresenta a fundamentação teórica sobre capacidades dinâmicas para a gestão da inovação em serviços. O capítulo 3 descreve a abordagem e os procedimentos metodológicos adotados. O capítulo 4 apresenta os resultados das análises dos dados em relação ao problema de pesquisa e objetivo geral. O capítulo 5 contém as considerações finais e a contribuição do estudo. Por fim, são apresentadas as referências utilizadas.
2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA
A Visão das Capacidades Dinâmicas (VCD) é uma abordagem que ficou conhecida através do trabalho de Teece, Pisano e Shuen (1997) e está relacionada com a capacidade das organizações de oferecerem respostas por meio de habilidades como adaptação, criação, integração e reconfiguração de competências organizacionais internas e externas para enfrentar ambientes em rápida mudança.
As capacidades dinâmicas de inovação são fundamentais para uma organização inovar de forma contínua e sustentável. Isso envolve explorar e desenvolver novas ideias, tecnologias, produtos ou processos, bem como implantá-los com sucesso no mercado. Essas capacidades garantem uma vantagem competitiva ao longo do tempo, pois a inovação é essencial para diferenciar-se e criar valor.
No contexto dos serviços, as capacidades dinâmicas de inovação referem-se à habilidade de uma organização inovar em seus processos e ofertas. Os serviços são intangíveis e envolvem interações diretas com os clientes, tornando a inovação em serviços um desafio único. Essas capacidades englobam desde a identificação de novas necessidades e demandas dos clientes até a criação e implementação de novos modelos de negócio, processos operacionais e estratégias de entrega.
As capacidades dinâmicas de gestão da inovação em serviços referem-se às capacidades dinâmicas ou recursos específicos (competências, processos e rotinas organizacionais) que a empresa possui ou está desenvolvendo, para gerenciar o processo de inovação nos serviços, em outras palavras, são as capacidades de gerenciamento de ordem superior necessárias para que empresas inovem serviços de forma sustentável. Com base no trabalho de Penrose (1959) e posteriormente de Nelson e Winter (1982), essas capacidades dinâmicas podem condicionar o comportamento futuro da empresa (path dependency) e devem estar alinhadas à estratégia da empresa, à história da empresa e à dinâmica dos mercados para que ela possa gerenciar os processos de inovação em serviço.
Capacidades dinâmicas de inovação em serviços são aquelas difíceis de transferir e imitar que as organizações possuem para desenvolver, (re)formar, (des)integrar e (re)configurar recursos e capacidades operacionais existentes e novos (Teece, 2009). Elas são necessárias para oferecer aos clientes uma nova experiência ou solução de serviço e comercializá-los com sucesso de maneira sustentável, portanto, adaptar-se rapidamente ao ambiente em mudança. Isso significa combinar recursos e capacidades operacionais existentes e criar recursos e capacidades operacionais para obter vantagem competitiva temporária e oferecer um novo serviço. Essas capacidades contêm alguns elementos genéricos que também podem ser usados em outras configurações e provavelmente precisarão de alguma personalização, portanto não são completamente inimitáveis nem totalmente transferíveis (Den Hertog, 2010).
A estratégia da empresa, a dinâmica do mercado e o histórico da empresa influenciarão o subconjunto específico de capacidades dinâmicas usadas para gerenciar a inovação em serviços e o ritmo em que certas capacidades dinâmicas se tornam obsoletas. Para inovar efetivamente, novas experiências de serviço, novos conceitos de serviço e/ou novas formas de entrega devem estar alinhadas com a estratégia da empresa. A dinâmica do mercado ou a turbulência afetarão a taxa na qual as empresas precisam adaptar suas capacidades (Den Hertog, 2010).
Portanto, diferentes tipos de empresas, de diferentes tamanhos, em diferentes setores, que adotam diferentes estratégias provavelmente administrarão uma combinação específica de capacidades dinâmicas de inovação em serviços relevante para seu tipo de empresa, seu tamanho, seu tipo de setor e está alinhada com as estratégias específicas definidas (Den Hertog; Van Der AA; De Jong, 2010).
Den Hertog (2010) identificou seis capacidades dinâmicas para gerenciar a inovação em serviços, as quais contribuem para uma estrutura global integrada no nível da empresa para o gerenciamento estratégico da inovação em serviços. Essa estrutura visa auxiliar as empresas e organizações de serviços a refletir sistematicamente sobre o gerenciamento da inovação em serviços de forma mais sustentável.
2.1 Capacidade dinâmica A: Assinalar as necessidades dos usuários e as opções tecnológicas
Teece (2007) nomeou a capacidade de detectar e identificar oportunidades, ameaças, mudanças e sinais relevantes do ambiente como to sense. Esta capacidade é ainda mais essencial no setor de serviços, pois raramente as inovações em serviços são criadas em laboratórios de pesquisa e desenvolvimento (P&D) (Sundbo; Gallouj, 2000). Elas surgem comumente como resposta a uma necessidade percebida e não atendida de clientes reais e potenciais, e desta forma, é fundamental para os inovadores perceberem tendências dominantes, necessidades não atendidas e opções tecnológicas promissoras para novas configurações de serviços (Sundbo; Gallouj, 2000).
Segundo Alam e Perry (2002) a maioria das empresas inovadoras dependem de seus clientes (reais e potenciais) para coprodução e codesenvolvimento de novas propostas de serviços. Assim, é necessário desenvolver a capacidade de entender os usuários com empatia e perceber suas necessidades com bastante antecedência. Algumas ferramentas podem ser utilizadas para identificar as necessidades do usuário e informar o ato real de inovação em serviços, como, por exemplo, a experimentação conjunta, diálogos, prototipagem, sistemas de gerenciamento de contas, painéis de usuários, perfis de clientes, análise detalhada de como os serviços atuais são usados, análise de tendências em grupos de clientes.
Outro elemento desta capacidade dinâmica é a aptidão de sinalizar novas opções tecnológicas. Essas proporcionam oportunidades para inovar e adaptar o portfólio de serviços, bem como novas formas de interagir com os clientes, produção sob demanda, enriquecimento de diálogos de atendimento ou oferta de oportunidades de atendimento personalizado, e novas opções de autoatendimento (Teece, 2007).
Embora não haja uma ordem específica em um processo de inovação em serviços, a capacidade de assinalar as necessidades dos usuários e opções tecnológicas (capacidade dinâmica A) deve ser vista como uma atividade permanente, pois normalmente os resultados desta capacidade fornecem dados para a capacidade de conceituar (capacidade dinâmica B), bem como a capacidade de coproduzir e orquestrar (capacidade dinâmica D). Tanto os recursos de necessidade do usuário quanto os de opções tecnológicas afetam a capacidade de ganhar escala e estender (capacidade dinâmica E) e a capacidade de agregar e desagregar (capacidade dinâmica C), pois podem destacar a necessidade de mais serviços empacotados ou mais desagregados (Den Hertog, 2010).
2.2 Capacidade dinâmica B: Conceituar
A capacidade dinâmica de conceituar se refere a projetar, prototipar ou testar inovações, o que pode ser rotulado como design de serviço. O caráter de processo compartilhado de alta interação entre prestador e tomador faz com que esta conceituação de serviço para categorias de serviços significativas e não padronizadas se torne um processo contínuo entre prestadores de serviços e clientes e nem sempre ocorra um início e um fim lógicos para o processo de conceituação e design de serviço (Alam; Perry, 2002; Magnussen; Matthing; Kristenson, 2003).
A inovação em serviços não pode ser pesquisada, desenvolvida e testada em protótipos como os bens físicos. Isso porque a sua natureza predominantemente conceitual dificulta um cliente avaliar o que será experimentado e o que será entregue (Parasuraman; Zeithaml; Berry, 1985) uma vez que se trata de um processo altamente interativo ou compartilhado (Alam; Perry, 2002).
Essas inovações são, primeiramente, novas ideias intangíveis ou combinações de ideias existentes, às vezes em combinação com objetos físicos, que juntas constituem uma nova proposta de valor para um cliente. Conceituar, projetar, prototipar ou testar esses tipos de inovações é uma capacidade específica que, portanto, é menos tangível e codificada. O caráter de processo compartilhado faz com que essa conceituação de serviço para categorias importantes de serviços não padronizados se torne um processo contínuo entre o provedor de serviços e o cliente. Isso pode envolver a capacidade de combinar elementos de serviço novos e existentes em uma configuração de serviço integrada experimentada como nova no mercado (Den Hertog; Van Der AA; De Jong, 2010).
A conceituação e design de uma inovação em serviços pode envolver a decisão de como a nova oferta de serviço se relaciona com a estratégia da empresa, público-alvo, intensidade e formas de interação com o cliente, organização do sistema de entrega, parceiros necessários para realizar o serviço, preço, modelo de receita a ser usado, e assim por diante (Den Hertog et al., 2006).
A capacidade de conceituar (capacidade dinâmica B) é normalmente alimentada pela capacidade de assinalar as necessidades dos usuários e opções tecnológicas (capacidade dinâmica A) e alimenta todos os outros recursos restantes. A conceituação real afeta quem e como os outros atores estão envolvidos na oferta de serviço, portanto, a capacidade de coproduzir e orquestrar (capacidade dinâmica D). E, também, determina se será criada uma experiência de serviço mais integrada, exigindo recursos de agregação, ou uma experiência de serviço mais especializada, exigindo recursos de desagregação (capacidade dinâmica C) e impacta significativamente a escalabilidade e expansão do conceito de serviço em questão (capacidade dinâmica E) (Den Hertog, 2010).
2.3 Capacidade dinâmica C: Agregar/desagregar
Uma das principais características das inovações em serviços é que geralmente são novas configurações de elementos existentes fornecidos em um novo contexto (Van Der AA; Elfring, 2002). A capacidade dinâmica de agregar, desagregar, enriquecer e combinar atividades de serviço em novas propostas de valor de serviço é a capacidade de projetar novas experiências e soluções de serviço, agrupando ou desmembrando elementos de serviço, enriquecendo e personalizando ofertas de serviço existentes de novas maneiras e combinando várias atividades de serviço em ofertas de serviço integradas, que a princípio podem não estar claramente relacionadas (Normann, 2002).
Considerando que clientes diferentes requerem diferentes tipos de experiências ou soluções de serviço, é importante segmentar cuidadosamente os clientes e suas necessidades. Deste modo, os fornecedores de serviços podem desenvolvê-los para atender às necessidades específicas dos clientes e, assim, criar experiências e soluções personalizadas, sejam integradas ou especializadas (Den Hertog, 2010).
O serviço integrado combina serviços com um caráter one stop shopping (serviço completo), incluindo a possibilidade de personalizar a sua oferta. O serviço especializado desagrega os serviços e os reduz ao essencial, com alta especialização (Den Hertog, 2010).
A capacidade de agregar e desagregar (capacidade dinâmica C) está diretamente relacionada à capacidade de conceituar (capacidade dinâmica B), visto que pensar em termos de pacotes de serviços depende na maioria da capacidade de conceituar experiências e soluções de serviço. Além disso, essa capacidade está vinculada à capacidade de coprodução se os serviços agrupados exigirem vários provedores de serviços que precisam ser administrados (capacidade dinâmica D). A capacidade de agregar também está ligada à capacidade de escalonamento, pois o empacotamento pode envolver a ampliação de uma marca de serviço forte em mercados de serviços mais ou menos relacionados (capacidade dinâmica E) (Den Hertog, 2010).
2.4 Capacidade dinâmica D: Coproduzir e orquestrar
O autor seminal Teece (2007) descreveu que a terceira dimensão das capacidades dinâmicas to manage threats / to transform mantém a competitividade através do aprimoramento, combinação, orquestração, proteção e, quando necessário, da reconfiguração dos ativos. No setor de serviços, Lütjen et al. (2019) defendem que o sucesso das inovações está interligado com as capacidades das empresas de coordenar, orquestrar e colaborar com um conjunto de atores externos.
Coproduzir e orquestrar é a capacidade de gerenciar e atuar em sistemas abertos de inovação em serviços. Ela representa a capacidade de coproduzir e coprojetar com parceiros confiáveis e posteriormente gerenciar essas parcerias ou alianças de maneira eficaz, de modo a gerar um serviço de valor agregado (Den Hertog; Van Der AA; De Jong, 2010).
Devido à natureza da inovação em serviços ser altamente combinatória, conforme explorado no tópico anterior, muitas propostas de serviços são combinações de elementos de serviço, e às vezes também de bens, de outros prestadores que juntos atendem a uma necessidade. Isso implica que o provedor de serviços principal deve coprojetar e coproduzir uma inovação em serviços com outros fornecedores e gerenciar essa aliança (Ramirez, 1999).
A participação em alianças e redes é uma capacidade dinâmica chave para a empresa conseguir colocar um novo conceito ou configuração de serviço no mercado. Portanto, os inovadores de serviço precisam formar parcerias, bem como gerenciar essas várias coalizões com diferentes conjuntos de parceiros e, assim, investir em um conjunto de parceiros potenciais que podem ser necessários para criar experiências e soluções de serviço (Teece, 2007).
Normalmente, o desenvolvimento de relações de confiança ao longo do tempo e a criação de coalizões de serviços em constante mudança é uma capacidade que impacta diretamente as capacidades dinâmicas de agregar e desagregar (capacidade dinâmica C) e de ganhar escala e estender (capacidade dinâmica E). A capacidade de agregar e desagregar implica adicionar ou retirar parceiros em um sistema de serviço. Para a capacidade de ganhar escala e estender, construir um novo sistema de valores e selecionar parceiros de negócios para uma inovação em serviços é nitidamente necessário para um novo serviço ser implementado e difundido em uma escala mais ampla. Também o ato de coproduzir e organizar parceiros de negócios pode resultar em ideias para novos tipos de serviços, que afeta a sinalização (capacidade dinâmica A), bem como a capacidade de conceituar (capacidade dinâmica B) (Den Hertog, 2010).
2.5 Capacidade dinâmica E: Ganhar escala e estender
Especialmente para operações de serviços padronizados ou semipadronizados em grande escala, a capacidade dinâmica para dimensionar e ampliar as inovações em serviço é fundamental (Winter; Szulanski, 2001). A parte desta capacidade dinâmica referente ao escalonamento está associada à observação de que inovações em serviços são relativamente difíceis de serem introduzidas em grande escala de maneira uniforme devido ao seu caráter intangível e componente humano que é difícil de padronizar, além da dependência cultural e do caráter distribuído dos serviços (Lyons; Chatman; Joyce, 2007).
A escala, neste caso, se refere à difusão. Para um novo conceito de serviço ser difundido é necessário que ele seja codificado e os elementos essenciais compartilhados com outras partes da empresa. Isso pode levar a um processo de fertilização cruzada, especialmente em empresas maiores, onde práticas e conceitos inovadores são compartilhados, codificados e implementados em toda a empresa (Den Hertog; Van Der AA; De Jong, 2010).
Uma estratégia de escalonamento requer conhecimento das características do modelo de negócios que precisam ser replicadas, o método pelo qual essas características são replicadas e o tipo de ambiente onde os estabelecimentos com tais características podem operar com sucesso. O escalonamento necessita de um sistema de entrega de serviço reconhecível e consistente em termos de operações de serviço, bem como uma forma de diálogo e canais para interagir com o cliente e os sistemas de tecnologia da informação e comunicação necessários para isso (Den Hertog, 2010). O escalonamento envolve exploração, pois os estágios iniciais da replicação oferecem muitas oportunidades de aprendizagem, adaptação e ajuste do modelo de negócios de sucesso (Winter; Szulanski, 2001).
A capacidade de extensão, ou ampliação, pode estar relacionada à natureza intangível dos serviços. No mercado de serviços, a comunicação e a marca são fundamentais para a criação de uma oferta de serviço reconhecível. Construir uma marca de serviço que os clientes reais e potenciais valorizem e associem a um determinado conjunto de serviços e qualidade requer investimentos e uma estratégia consistente com a estratégia geral da empresa e com a perspectiva dos clientes reais e potenciais. Uma vez estabelecida a marca, ela pode ser realmente valiosa para entrar em novos mercados de serviços e lançar conceitos de serviço inovadores usando a marca existente para expandir a oferta (Krishnan; Hartline, 2001).
Expandir requer o gerenciamento cauteloso do design de novos conceitos de serviço que os clientes associam a certos atributos da marca, e o tipo de interação com o cliente que melhor se adapte à oferta do serviço. A expansão da marca pode envolver a oferta de uma versão mais simples ou mais complexa do conceito de serviço original usando um canal diferente para interagir com o cliente (Den Hertog, 2010).
A capacidade dinâmica de ganhar escala e estender (capacidade dinâmica E) está relacionada às capacidades dinâmicas, coproduzir e orquestrar (capacidade dinâmica D), bem como aprender e adaptar (capacidade dinâmica F). A primeira, em especial a capacidade de orquestrar, desempenha o papel de garantir que a oferta de serviço seja implementada com os parceiros de negócios de maneira semelhante. Já capacidade de estender contém um elemento de geração de ideias, já que a oferta de serviço original é misturada ou estendida a mercados de serviços relacionados, portanto se relaciona com as capacidades dinâmicas conceituar (capacidade dinâmica B) e agregar (capacidade dinâmica C) (Den Hertog, 2010).
2.6 Capacidade dinâmica F: Aprender e adaptar
Sem aprendizado a organização não conseguirá reconfigurar seus recursos e competências de maneira eficaz. Desta forma não será capaz de se adaptar frente às mudanças do ambiente, o que resultará em perda, ou ao menos na estagnação, de sua vantagem competitiva. Há de se ressaltar ainda que conforme Salunke, Weerawardena e McColl-Kennedy (2019) a geração de conhecimento por si só não é suficiente, pois deve ser integrada para oferecer soluções de serviços inovadores que atendam às necessidades dos clientes.
A capacidade dinâmica aprender e adaptar se relaciona com a capacidade de aprender a partir da própria gestão da inovação e, subsequentemente, melhorar e adaptar o processo geral de inovação e as capacidades dinâmicas a partir dos esforços de inovação em serviços bem-sucedidos, e com os fracassados (Den Hertog; Van Der AA; De Jong, 2010).
Essa capacidade dinâmica em conjunto com a de ganhar escala e estender desempenha o papel de codificar o tipo de experiência de serviço que ocorre, avaliando quais elementos de um novo conceito de serviço podem ser codificados e posteriormente ampliados, e qual elemento da oferta de serviço normalmente precisa ser adaptado ao mercado local (Den Hertog, 2010).
A capacidade de aprendizado e adaptação (capacidade dinâmica F) afeta todas as cinco capacidades dinâmicas anteriores, por refletir no processo de inovação em serviços na totalidade. Esta pode ser entendida como uma capacidade dinâmica de ordem superior para refletir no processo de inovação em serviços no conjunto, portanto, está ligada a todas as dimensões de desempenho de inovação em serviços (Den Hertog, 2010).
Há semelhanças nas características-chave dessas seis capacidades dinâmicas de inovação em serviços e elas exibem características comuns associadas a processos eficazes em toda a empresa, mas existem peculiaridades nos detalhes. Isso significa que uma empresa inovadora dominante em serviços pode desenvolver essas capacidades dinâmicas ao longo do tempo, mas terá que adaptar e especificar uma combinação particular de capacidades dinâmicas nas quais deseja se destacar e alinhá-las com a estratégia da empresa (Den Hertog, 2010).
3 METODOLOGIA
Esta pesquisa se classifica quanto à abordagem do problema como qualitativa. Justifica-se a escolha desta abordagem pelo fato dela incluir um conjunto de técnicas interpretativas que buscam descrever, decodificar, traduzir e dessa forma apreender o significado, e não a frequência, de certos fenômenos ocorrendo de forma mais ou menos natural no mundo social (Cooper; Schindler, 2011).
Devido aos objetivos propostos, esta pesquisa se classifica quanto aos fins como descritiva, por cogitar esclarecer a complexidade de determinado contexto com todas as particularidades envolvidas, ou seja, toda a configuração, estrutura, atividade e relacionamentos dos fenômenos pesquisados são expostos de maneira representada (Godoy, 1995).
A unidade de análise é uma pequena empresa de serviços de estética e emagrecimento considerada referência em sua área de atuação, cujo critério de escolha foi a temática da pesquisa e a acessibilidade.
Com o objetivo de analisar de que forma essa empresa de serviços de estética e emagrecimento tem articulado seu contexto interno e seus processos para gerenciar a inovação, foi aplicado um roteiro de entrevista semiestruturada em profundidade aos gestores desta empresa. Portanto, o corpus da pesquisa são duas entrevistas individuais, do tipo semiestruturada, realizadas com a proprietária e a gerente da organização pesquisada.
Para assegurar o sigilo, as respondentes foram identificadas como PE (proprietária da empresa pesquisada) e GE (gerente da empresa pesquisada). As entrevistas foram realizadas em abril de 2022 com duração média de sessenta minutos cada, realizadas presencialmente, gravadas em áudio e posteriormente transcritas na íntegra.
O roteiro de entrevista foi definido pela teoria abordada e visou identificar as capacidades dinâmicas utilizadas para criar e realizar as inovações. Para tanto, fragmentou-se a pesquisa em seis categorias de análise, as quais constituem seus constructos objetos de estudo, sendo apresentadas no Quadro 1.
Para compreensão dos discursos, eles foram analisados utilizando a técnica de análise de conteúdo, que segundo Bardin (2016), consiste em um conjunto de técnicas de análise da comunicação cujo objetivo é obter indicadores que possibilitem a inferência dos conhecimentos relacionados às condições de recepção ou produção destas mensagens.
Quadro 1 - Categorias de análise – constructos
Fonte: Elaborado pelos autores (2022)
Na etapa de tratamento dos resultados obtidos e interpretação, os dados foram tratados de maneira a serem significativos e válidos, para servirem de base para inferências e interpretações para responder o objetivo proposto.
4 RESULTADOS E DISCUSSÕES
4.1 Perfil da empresa pesquisada
A empresa pesquisada foi estabelecida em 2015 no município de Guarapuava-PR por uma fisioterapeuta que durante sua busca por um tratamento para o próprio sobrepeso, adquirido após problemas de saúde, conheceu e aplicou o método de emagrecimento X, inédito na região. O resultado desse sistema surpreendeu e ocasionou o interesse dos pacientes que ela atendia na clínica onde era funcionária. Esses fatos, aliados à constatação da necessidade de se encontrar em um único lugar tratamento de altíssima qualidade para emagrecimento saudável, rápido e sustentável, voltado para pessoas com sobrepeso ou obesas, impulsionou a profissional a abrir sua própria clínica, a qual é a única habilitada em aplicar esse método na região (PE, 2022).
Esta empresa adota um modelo integrativo e personalizado de atendimento e conta com uma equipe de profissionais composta por uma fisioterapeuta dermatofuncional especializada em obesidade e emagrecimento, uma nutricionista, quatro esteticistas, além de uma gerente, uma técnica financeira e uma recepcionista. Os serviços oferecidos são o método de emagrecimento X, métodos próprios para redução de gordura, flacidez e celulite, massagens e depilação a laser (GE, 2022).
O método de emagrecimento X é uma franquia de nível nacional que possui mais de 150 clínicas no Brasil e já tratou mais de 150 mil pacientes. A empresária relatou que os procedimentos do método não podem ser alterados, portando a franquia fornece os produtos, treinamento e suporte exclusivos do método. Porém, não é exigida exclusividade, o que a permite oferecer serviços de forma desvinculada e independente.
Assim, essa clínica disponibiliza métodos próprios, criados pela proprietária, para redução de gordura, flacidez e celulite; massagens e depilação a laser. Esses métodos próprios combinam diversos procedimentos estéticos e suplementação alimentar desenvolvida pela proprietária. A linha para suplementação alimentar desenvolvida pela proprietária é composta por nove produtos nutracêuticos fornecidos por uma fábrica especializada, garantindo a qualidade dos produtos, os quais são certificados pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (GE, 2022).
4.2 Capacidade Dinâmica para Gestão da Inovação em Serviços
Capacidade dinâmica A: Assinalar as necessidades dos usuários e as opções tecnológicas
De acordo com Sundbo e Gallouj (2000) a maioria das inovações em serviços surge como resposta a uma necessidade percebida não atendida de clientes reais e potenciais, sendo que raramente as inovações em serviços se originam de pesquisas desenvolvidas em laboratório de P&D de empresas. Essa situação foi identificada na empresa pesquisada, visto que a proprietária relatou que não possui departamento específico para inovação e que ela desenvolve os novos serviços.
Cada tratamento que eu trago para Guarapuava é a junção de vários cursos onde eu vou fazendo, vou testando, até eu conseguir chegar a um resultado final. Hoje eu posso falar que 98% dos meus tratamentos são únicos e são criações minhas. São totalmente personalizados e desenvolvidos para cada paciente. [...]. O protocolo “BC” é criado por mim. A suplementação é desenvolvida por mim. Foi desenvolvido e aprimorado após anos de estudos em bases científicas, análises de resultados e muita prática clínica. [...]. Então o paciente me procura, faz uma avaliação, na avaliação eu vejo o que que ele vai precisar no tratamento. Então eu traço o caminho dele aqui dentro da clínica de acordo com a avaliação. Então dependendo do paciente eu coloco suplementação, dependendo eu não coloco, o que depende muito de cada paciente (PE, 2022).
Esse discurso indica a capacidade de a proprietária entender os clientes com empatia e perceber suas necessidades, ou seja, a capacidade de assinalar as necessidades dos usuários, e demonstra a relação dos clientes para coprodução e codesenvolvimento de novas propostas de serviços. Esses aspectos são descritos por Alam e Perry (2002) como necessários às empresas inovadoras.
Em relação às opções tecnológicas, a proprietária explanou que com “a tecnologia, a modernidade, novos tratamentos vão surgindo e a gente precisa se atualizar. Sempre tem estudos novos, pesquisas novas, cursos novos, então a gente tem que estar inovando e indo atrás para trazer algo novo e melhorar cada dia mais” (PE, 2022). Sobre esse assunto a gerente adicionou:
Ficamos atentas às inovações do mercado sobre máquinas, equipamentos e cursos de atualizações. [...]. As tecnologias intensificam o resultado, nosso foco é resultado, essa é a melhor estratégia para atrair clientes. [...]. Quando a gente fala de estética a gente tem que estar inovando sempre. [...]. A gente tem que estar bem atualizada no mercado. Então em relação a compra de aparelhos pra trazer mais resultado. (GE, 2022).
Deste modo, infere-se a aptidão de sinalizar novas opções tecnológicas que proporcionam oportunidades para inovar e adaptar o portfólio de serviços, conforme descrito em Teece (2007). Ainda, de acordo com Sundbo e Gallouj (2000) é fundamental para os inovadores perceberem tendências dominantes, necessidades não atendidas e opções tecnológicas promissoras para novas configurações de serviços.
Capacidade dinâmica B: Conceituar
Nos discursos apresentados no item anterior é possível identificar também a capacidade dinâmica de conceituar, a qual se refere a projetar, prototipar ou testar inovações, o que pode ser rotulado como design de serviço (Alam; Perry, 2002; Magnussen; Matthing; Kristenson, 2003). Percebe-se que na empresa pesquisada ocorre um processo contínuo de inovação em serviços, impulsionada tanto pela dinâmica do mercado quanto pela alta interação entre prestador e tomador devido ao caráter compartilhado, conforme apresentam os mesmos autores.
Além disso, constata-se que as inovações em serviço são combinações de ideias existentes associadas a objetos físicos, que juntas constituem uma nova proposta de valor para um cliente (Den Hertog; Van Der AA; De Jong, 2010):
A gente não vende o nome do aparelho, por exemplo, a gente não vende o carbox, a gente vende um protocolo com nosso nome, ou seja, é algo original. [...]. Vendemos resultado e outras clínicas vendem os aparelhos em si. Ou seja, vendemos também o intangível. [...]. Então a gente gosta de personalizar esse método, a proprietária cria as técnicas próprias dela pra gente fazer algo do nosso jeitinho, pra ser personalizado e o cliente achar somente aqui na clínica (GE, 2022).
A gerente explicou que um protocolo se refere a um dos métodos criados pela proprietária para redução de gordura, flacidez e celulite, os quais combinam diversos procedimentos estéticos e suplementação alimentar, também desenvolvida pela empresária (GE, 2022). Ou seja, os procedimentos estéticos existem individualmente no mercado, porém, o modo como eles são combinados entre si e com a suplementação alimentar, são específicos da empresa pesquisada.
Den Hertog, Van Der Aa e De Jong (2010) fundamentam que conceituar, projetar, prototipar ou testar inovações é uma capacidade específica que, portanto, é menos tangível e codificada. Isso pode envolver a capacidade de combinar elementos de serviço novos e existentes em uma configuração de serviço integrada experimentada como nova no mercado, conjuntura vivenciada pela empresa pesquisada.
Capacidade dinâmica C: Agregar/desagregar
Normann (2002) salienta que a capacidade dinâmica de agregar, desagregar, enriquecer e combinar atividades de serviço em novas propostas de valor de serviço é a capacidade de projetar novas experiências e soluções de serviço, agrupando ou desmembrando elementos de serviço, enriquecendo e personalizando ofertas de serviço existentes de novas maneiras e combinando várias atividades de serviço em ofertas de serviço integradas. Essa capacidade é identificada na empresa pesquisada conforme apontado na análise da capacidade de conceituar (capacidade dinâmica B). Van Der Aa e Elfring (2002) ratifica que uma das principais características das inovações em serviços é que geralmente são novas configurações de elementos existentes fornecidos em um novo contexto.
A partir dos discursos apresentados nos itens anteriores percebe-se que a empresa pesquisada desenvolve serviços que criam experiências e soluções de serviço personalizadas, sejam integradas ou especializadas, para atender as necessidades específicas dos clientes, considerando que clientes diferentes requerem diferentes tipos de experiências ou soluções de serviço, o que corrobora com o estudo de Den Hertog (2010), tendo sido ressaltado pela proprietária:
A gente vende o serviço, por exemplo o cliente que compra só um pacote de modeladora ou um tratamento específico. Tem os pacotes, por exemplo o emagrecimento X, o paciente tem adesão da nutri, suplementação, estética, que são os produtos que compõe o pacote. E vendo só os produtos para quem quer comprar só os produtos (PE, 2022).
Conforme Den Hertog (2010), o serviço integrado planeja atender uma ampla variedade de necessidades complementares dos usuários, agregando diversos serviços. O serviço especializado visa desagregar os serviços e reduzi-los ao essencial, criando uma alta especialização de serviços, realmente elaborados sob medida. Ambos requerem a capacidade de conceituar bem desenvolvida, sendo que a estratégia de agrupamento também requer as capacidades de coproduzir e orquestrar altamente desenvolvidas, por demandar participação ativa de parceiros de negócios em um sistema de valor de serviço mais amplo, ocasionando uma mudança no modelo de receita.
Capacidade dinâmica D: Coproduzir e orquestrar
Em relação a esta capacidade dinâmica, a gerente da empresa estudada explicou que “a gente não tem parceiras por opção nossa. Não que seja uma estratégia ruim, mas é uma opção que a gente não gosta” (GE, 2022), e a proprietária complementou que “não temos parcerias com fornecedores, concorrentes e universidade” (PE, 2022).
Portanto, a empresa pesquisada não atua em sistemas abertos de inovação em serviços e não foram constatados indicativos que permitissem caracterizar a capacidade dinâmica coproduzir e orquestrar com parceiros confiáveis, para posteriormente gerenciar essas parcerias ou alianças temporárias de maneira eficaz, gerando um serviço de valor agregado (Den Hertog; Van Der AA; De Jong, 2010).
Capacidade dinâmica E: Ganhar escala e estender
Não foram identificadas evidências que permitissem caracterizar a capacidade dinâmica de ganhar escala. Porém, considerando as características da empresa pesquisada, pode-se pressupor que a capacidade de escalonamento não compõe a combinação específica de suas capacidades dinâmicas de inovação em serviços.
Capacidade dinâmica F: Aprender e adaptar
Sobre aprendizado e adaptação, a gerente explicou que “ao longo dos anos de clínica” elas conseguiram elaborar um modelo de gerenciamento padrão embasado nos erros e acertos da empresa, o que acarretou a redução da quantidade de serviços oferecidos (GE, 2022):
Em relação aos nossos serviços, hoje a gente tem uma lista de serviços bem menor, bem mais resumido do que há três anos atrás, por exemplo. Porque a gente quer ser referência. [...] porque não tem como ser boa em tudo. [...]. Então por isso que o nosso foco hoje, principalmente, é emagrecimento e gordura. [...]. Então hoje a gente não faz procedimentos faciais como botox e preenchimento, porque isso desfocava muito o nosso cliente (GE, 2022).
Deste modo a empresa manteve alguns e criou outros serviços que, segundo a gestora, atendem as necessidades e entregam melhores resultados aos pacientes. Ela ressaltou que a oferta de um novo serviço sempre está alinhada com a estratégia adotada pela empresa, ou seja, deve promover o máximo de resultado por meio de protocolos personalizados e desenvolvidos para cada paciente (GE, 2022).
Portanto, depreende-se que ocorreu aprendizado a partir da própria gestão da inovação em serviços e, subsequentemente, houve melhora e adaptação do processo geral de inovação em serviços e das capacidades dinâmicas a partir dos esforços de inovação em serviços bem-sucedidos, e com os fracassados, corroborando o postulado por Den Hertog, Van Der Aa e De Jong (2010).
Deste modo, e de acordo com Den Hertog (2010), constata-se que a capacidade de aprendizado e adaptação (capacidade dinâmica F) afeta todas as cinco capacidades dinâmicas anteriores, por refletir no processo de inovação em serviços em sua totalidade.
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
O objetivo geral desta pesquisa foi analisar de que forma uma pequena empresa de serviços de estética e emagrecimento tem articulado seu contexto interno e seus processos para gerenciar a inovação, sob a ótica da teoria das capacidades dinâmicas. A partir dos dados coletados, verificou-se que a realização de inovações em serviços demandou capacidades dinâmicas de gestão da inovação em serviços, ou seja, recursos específicos incorporados aos processos, às competências e à rotina em toda a empresa. Assim, para criar e realizar inovações, a empresa pesquisada recorre às seguintes capacidades dinâmicas: assinalar as necessidades dos usuários e as opções tecnológicas, conceituar, agregar/desagregar, estender, aprender e adaptar. Ressalta-se que esse subconjunto de capacidades dinâmicas é específico para essa empresa, por estar alinhado com suas estratégias, sendo influenciado pelas mudanças do mercado e pelo histórico da empresa.
Por meio dos resultados infere-se que uma nova experiência de serviço ou solução de serviço na empresa pesquisada consiste em um novo serviço, um novo portfólio de serviços e um novo processo de serviço, os quais individualmente ou em conjunto definem uma nova forma de criar valor para o cliente. Consequentemente, a inovação em serviços assumiu várias formas e está vinculada a diferentes partes do processo de criação de valor da empresa pesquisada.
Como contribuição prática para as organizações, este estudo possibilita a melhor compreensão da gestão da inovação em serviços, podendo auxiliar os envolvidos na gestão da inovação em serviços a refletir sobre a combinação específica de recursos e capacidades de inovação em serviços necessários para inovar serviços de forma sustentável, a mapear e analisar inovações em serviço e criar sistematicamente novas experiências e soluções de serviço, gerenciar o resultado do processo de inovação em serviços, avaliar a gestão de inovação em serviços e o desempenho do processo de inovação em serviços de uma empresa.
Os resultados desta pesquisa devem ser analisados considerando as limitações inerentes à sua obtenção. Primeiramente, ressalta-se que foi estudada uma única empresa, portanto a amostra é não probabilística e não possui intenção de generalizar o resultado, por conseguinte não foram extraídos padrões que possam representar a totalidade das organizações. Como demonstrado no estudo, os sistemas de gestão da inovação são complexos e influenciados por diversos componentes, tornando evidente que um único caso, embora tenha trazido percepções relevantes, não representa a síntese de toda a complexidade e influências possíveis entre os componentes investigados. Além disso, precisa ser considerado que o principal instrumento utilizado para a coleta de dados foi a entrevista, o qual possui limitação intrínseca, tanto em função da percepção do respondente sobre o tema quanto da percepção do pesquisador sobre o que está sendo descrito.
Recomenda-se como oportunidades de pesquisas futuras, a extensão deste estudo para um maior número de organizações, de modo a permitir buscar padrões de adoção e de desafios da gestão da inovação em serviços.
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