Revista de Estudos em Organizações e Controladoria - REOC, ISSN 2763-9673, UNICENTRO, Irati-PR, v. 2, Dossiê APP, p. 51-64, dez., 2022.
Dossiê Análise de Políticas Públicas
Editores Convidados: Prof. Dr. Bruno Martins Augusto Gomes e Prof. Dr. Roberto Eduardo Bueno
CONFERÊNCIA DE POLÍTICAS PÚBLICAS: UMA ANÁLISE DA PARTICIPAÇÃO
POPULAR DIGITAL NO MUNICÍPIO DE SÃO JOSÉ – ESTADO DE SANTA
CATARINA
1
PUBLIC POLICY CONFERENCE: AN ANALYSIS OF DIGITAL POPULAR
PARTICIPATION IN THE MUNICIPALITY OF SÃO JOSÉ – STATE OF SANTA
CATARINA
LUÍSA FÓFANO CHUDZIJ
Universidade Federal do Paraná (UFPR)
E-mail: luisachudzij@hotmail.com
RESUMO
Tem-se por objeto de estudo a e-Democracia e a utilização de plataformas digitais em uma Conferência de Políticas
Públicas. Estabeleceu-se como objetivo geral examinar a utilização de plataformas digitais para a participação
popular nas políticas públicas, tecendo considerações acerca desta temática e mapeando a participação da
sociedade ocorrida por meio de plataforma digital, em razão da pandemia do COVID-19, na XIII Conferência
Municipal de Assistência Social de São José, estado de Santa Catarina, nos dias 12, 13, 16, 17 e 18 de agosto de
2021. O método empregado na construção das principais ideias textuais foi o dedutivo e, para tanto, pautou-se em
pesquisa bibliográfica e estudo de caso para alcançar o resultado final. Efetuou-se uma análise empírica da
experiência da XIII Conferência de Assistência Social de São José, a qual se valeu de plataformas digitais para sua
ocorrência. Para dar sustentação ao debate, foram apresentadas considerações sobre Inovações Democráticas,
Conferências e e-Democracia. Conclui-se que a e-Democracia pode ser um instrumento para a participação da
sociedade civil nas políticas públicas, ainda que existam alguns obstáculos e empecilhos.
Palavras-chave: Políticas Públicas; Plataformas Digitais; e-Democracia; Inovações Democráticas; Conferência.
ABSTRACT
The object of study is e-Democracy and the use of digital platforms in a Public Policy Conference. The general
objective was to examine the use of digital platforms for popular participation in public policies, making
considerations about this theme and mapping the participation of society that occurred through a digital platform,
due to the COVID-19 pandemic, at the XIII Municipal Conference of Social Assistance of São José, state of Santa
Catarina, on the 12th, 13th, 16th, 17th and 18th of August 2021. The method used in the construction of the main
textual ideas was the deductive one and, for that, it was based on bibliographical research and case study to reach
the final result. An empirical analysis of the experience of the XIII Social Assistance Conference of São José was
carried out, which used digital platforms for its occurrence. To support the debate, considerations on Democratic
Innovations, Conferences and e-Democracy were presented. It is concluded that e-Democracy can be an instrument
for the participation of civil society in public policies, although there are some obstacles and obstacles.
Keywords: Public Policy; Digital Platforms; e-Democracy; Democratic Innovations; Conference.
1
DOI: https://doi.org/10.5935/2763-9673.20220014
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Luísa Fófano Chudzij
CONFERÊNCIA DE POLÍTICAS PÚBLICAS: UMA ANÁLISE DA PARTICIPAÇÃO POPULAR DIGITAL NO MUNICÍPIO DE SÃO JOSÉ –
ESTADO DE SANTA CATARINA
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1 INTRODUÇÃO
Quando o estudo tem como enfoque as políticas públicas, verifica-se que há diferentes
abordagens conceituais utilizadas para descrevê-las, as quais serão brevemente examinadas a
seguir, contudo, esse artigo tem como respaldo conceitual a abordagem multicêntrica ou
policêntrica, isto é, pautada não apenas nos atores estatais como protagonistas das políticas
públicas, mas também, nas organizações privadas, não governamentais, multilaterais, redes,
dentre outras.
Assim, a proposta deste estudo é examinar a utilização de plataformas digitais para a
participação popular nas políticas públicas, tecendo considerações acerca desta temática e
mapeando a participação da sociedade ocorrida por meio de plataforma digital, em razão da
pandemia do COVID-19, na XIII Conferência Municipal de Assistência Social de São José,
estado de Santa Catarina, nos dias 12, 13, 16, 17 e 18 de agosto de 2021.
A escolha do tema foi motivada pelo fato de que o campo da participação popular nas
políticas públicas é um elemento fundamental de todo o processo de tomada de decisões e, em
razão disso, surge a necessidade de examinar a utilização de espaços digitais para essa
participação. Isso porque, com o avanço das tecnologias, é possível pensar em novos
mecanismos para a participação da sociedade nos debates e até mesmo na tomada de decisões.
Além disso, com a pandemia do COVID-19 e, em especial, em decorrência das medidas
sanitárias impostas, percebeu-se o quanto as plataformas digitais são essenciais e podem ser
utilizadas para diminuir fronteiras interpessoais e aprofundar as relações e os debates.
Para alcançar o objetivo proposto, este artigo selecionou a XIII Conferência Municipal
de Assistência Social de São José/SC como objeto de análise, com vistas a mapear a
participação da sociedade via plataforma digital e verificar os efeitos da e-Democracia para a
participação. Optou-se por esta Conferência em razão de ter ocorrido de maneira remota com a
utilização de plataformas virtuais, mas, principalmente, por ter relatório final com dados e
resultados divulgados. Esta pesquisa irá verificar, por exemplo, a maneira como se
desenvolveram as dinâmicas de participação popular por meio digital na plataforma utilizada
para a realização da Conferência, bem como, os resultados apresentados.
Para empreender tal análise, o estudo apresenta, inicialmente, aportes conceituais sobre
Instituições Participativas de políticas públicas, com destaque para as chamadas Conferências
de Políticas Públicas. Posteriormente, passa a realizar uma tratativa acerca da e-Democracia e
seus efeitos no aspecto da participação. Por fim, mapeia as dinâmicas de participação popular
digital na plataforma utilizada na XIII Conferência Municipal de Assistência Social de São
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José/SC e seus resultados, com vistas a compreender a e-Democracia e seus efeitos sobre a
participação, o que corresponde ao objetivo do presente trabalho.
2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA
Conceituar o termo políticas públicas demanda um exame pormenorizado de diversos
entendimentos, uma vez que o conceito pode apresentar variações. Em uma primeira análise, o
conceito exsurgiria da modificação da atuação estatal, com o advento do Estado de Bem-Estar
social. Isso porque, com essa mudança de modelo de Estado, o government by policies teria
substituído o government by law (COMPARATO, 1989, p. 74), isto é, o governo passou a ser
não apenas legalista, mas um governo de políticas.
Maria Paula Dallari Bucci – que apresenta variadas obras em relação à temática –
compreende as políticas públicas como “[…] programas de ação governamental visando
coordenar os meios à disposição do Estado e as atividades privadas, para a realização de
objetivos socialmente relevantes e politicamente determinados” (BUCCI, 2002, p. 241), ou “[…]
programas de ação governamental voltados à concretização de direitos” (BUCCI, 2001, p. 13).
De acordo com Leonardo Secchi, “[…] uma política pública é uma diretriz elaborada para
enfrentar um problema público. […] possui dois elementos fundamentais: intencionalidade
pública e resposta a um problema público […]” (SECCHI, 2016, p. 2).
Diante dessas considerações, percebe-se que, nas últimas décadas, o Brasil vinha
experimentando uma expansão e pluralização das modalidades de participação política,
especialmente aquelas relacionadas às políticas públicas.
2
Destaca-se que a Constituição
Federal de 1988 foi inovadora ao promover transformações nas formas de interação entre
Estado e sociedade civil.
Isso porque, “[…] desde a Constituição de 1988, o Brasil assiste à multiplicação de
experiências participativas” (MARTELLI; TONELLA; COELHO, 2021, p. 263). Nesse
sentido, percebe-se que diversos são os espaços institucionalizados que buscam fomentar a
cultura da participação popular nas políticas públicas, como, por exemplo, os orçamentos
participativos, fóruns locais e regionais, conselhos gestores de políticas públicas, conferências
de políticas públicas, dentre outros. Inclusive, com o avanço da internet e com o surgimento e
fortalecimento das mídias sociais, é possível pensar em novos mecanismos para facilitar a
mobilização social. Logo, instituições participativas permitiriam o exercício de uma
2
“Entretanto, o giro político conservador experimentado pelo Brasil nos últimos anos e selado com o resultado
das eleições de 2018 interpela fortemente essa agenda de pesquisa a agregar novas preocupações. Afinal, se desde
1990 presenciamos um processo contínuo de expansão territorial e setorial das IPs, hoje elas enfrentam atos
governamentais que buscam extinguir e limitar sua presença nas políticas públicas” (ALMEIDA et al., 2021, p.
66).
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Democracia mais participativa, por meio da ampliação da participação da sociedade civil nas
decisões políticas.
Essas formas de participação política são consideradas, por Graham Smith, como
“inovações democráticas”. O autor explicita que estas inovações democráticas são as
instituições que foram criadas para majorar e aprofundar a participação do cidadão no processo
de tomada de decisões políticas, representando um afastamento da arquitetura institucional
tradicional (SMITH, 2009, p. 5).
Logo, as inovações democráticas objetivam redesenhar a divisão tradicional do trabalho
político dentro dos sistemas representativos, por meio da possibilidade dos cidadãos poderem
influenciar no processo de decisões políticas (SMITH, 2009, p. 7). Ressalta-se que, para Smith,
qualquer inovação democrática, independentemente da teoria democrática na qual se
fundamenta, deve produzir atributos, os quais são denominados pelo autor como bens
democráticos. São eles: inclusão, controle popular, julgamento ponderado e transparência.
O primeiro atributo da inclusão “[…] se refere à capacidade do desenho em fornecer
igualdade política aos participantes, manifestando-se em pelo menos duas instâncias: presença
e voz” (PESSALI; GOMES, 2020, p. 13). O segundo bem democrático, controle popular, “[…]
tenta captar o quanto o desenho permite aos participantes ter influência sobre os processos
decisórios, tanto dentro da própria instituição quantos nas instâncias externas das políticas
públicas sobre a qual atua” (PESSALI; GOMES, 2020, p. 13).
O terceiro atributo se refere ao julgamento ponderado que significa a “[…] capacidade
da instituição em promover a compreensão dos participantes a respeito tanto das questões
técnicas do campo decisório da instituição quanto das perspectivas ou posições dos demais
participantes” (PESSALI; GOMES, 2020, p. 13). Por fim, o quarto bem democrático é a
transparência, a qual indica a abertura e visibilidade do funcionamento da instituição, seja pelo
viés da transparência interna ou externa (PESSALI; GOMES, 2020, p. 13).
Diante do exposto e tendo como respaldo teórico-metodológico os estudos de Graham
Smith, faz-se necessário compreender o que seria a inovação democrática denominada
“Conferência”. A Conferência é um dos exemplos de “[…] instituições participativas que têm
potencial para funcionarem como espaço de interlocução e negociação entre atores estatais e
sociais […]” (MARTELLI; TONELLA; COELHO, 2021, p. 293).
As Conferências podem ser conceituadas como “[…] um processo de diálogo e
manifestação de opiniões para definição de uma agenda pública, marcado pela mobilização
social e participação plural, viabilizado por mecanismos de representação” (SOUZA et al., 2013,
p. 32). É necessário salientar que as Conferências possuem um potencial democratizante, uma
vez que ampliam a relação entre sociedade e governo (por meio, inclusive, da influência na
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formação da agenda política); estabelecem novas arenas de discussão; além de estimular ações
coordenadas entre diferentes membros da Federação (AVRITZER; SOUZA, 2013, p. 18).
Dessa maneira, as Conferências seriam espaços públicos institucionalizados em um
contexto de ampliação da participação social na gestão pública e na formação da agenda em
políticas públicas. A despeito das particularidades conceituais entre os autores, de modo geral,
“[…] as conferências constituiriam um processo de diálogo e manifestação de opiniões para
definição de uma agenda pública, marcado pela mobilização social e participação plural, e
viabilizado por mecanismos de representação” (SOUZA et al., 2013, p. 32).
O Decreto Federal nº 8.243, de 23 de maio de 2014 (revogado pelo Decreto nº 9.759, de
2019), instituía a Política Nacional de Participação Social (PNPS) e o Sistema Nacional de
Participação Social (SNPS) e também conceituava, no artigo 2º, inciso IV, a inovação
democrática “Conferência”. Ainda que este decreto tenha sido revogado, essencial destacar o
conceito por ele apresentado:
Instância periódica de debate, de formulação e de avaliação sobre temas específicos e
de interesse público, com a participação de representantes do governo e da sociedade
civil, podendo contemplar etapas estaduais, distrital, municipais ou regionais, para
propor diretrizes e ações acerca do tema tratado (BRASIL, 2014).
Diante dos conceitos atinentes à Conferência, é importante salientar a maneira como
estas são organizadas. Por meio das leis e regulamentos internos são determinados os seus
objetivos, eixos temáticos a serem debatidos, as etapas e datas de realização, número e
composição de representantes da sociedade civil e do Estado, bem como, a dinâmica
deliberativa quanto a formulação e encaminhamento das propostas (FARIA; SILVA; LINS,
2012, p. 262).
Sendo assim, há elementos que caracterizam as Conferências: a) podem ser tidas como
uma etapa da formação da agenda e da formulação das políticas públicas em uma determinada
área temática; b) pertencem a um processo participativo; c) reúnem sujeitos políticos diferentes;
d) conectam-se com outros mecanismos de participação; e) podem ter modalidade de interação
a distância (Conferências Virtuais) ou serem realizadas de forma espontânea (Conferências
Livres).
No que se refere à possibilidade de realização de Conferências Virtuais, faz-se
necessário lançar breves apontamentos sobre o conceito de e-Democracia, haja vista a intrínseca
correlação entre as temáticas.
Com o avanço da internet e, consequentemente, com o surgimento e fortalecimento das
mídias sociais, é possível pensar em novos mecanismos para facilitar a mobilização social.
Segundo Bitencourt (2019, p. 70) “[…] as mídias sociais são grandes incentivadoras de
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mobilização popular, já que conseguem atingir diferentes grupos espalhados em um mesmo
país ou no mundo, o que facilita a coordenação das ações [...]”.
Assim, “[…] a internet é a plataforma sobre a qual se desenvolve a democracia virtual”
(KOZIKOSKI JÚNIOR, 2015, p. 104). Logo, é possível pensar numa nova forma de
Democracia, a chamada e-Democracia ou Democracia Virtual. Semelhantemente ao que ocorre
com o conceito de Democracia, não é unânime o entendimento na doutrina sobre o que seria a
e-Democracia, até mesmo porque é possível encontrar diferentes termos na literatura para
denominar o mesmo fenômeno: cyberpolítica, cyberdemocracia, e-governo, dentre outros
(KNEUER, 2016, p. 668).
De acordo com Sontag Júnior, Gomes e Pessali (2019, p. 02) “[…] a e-democracia
caracteriza-se pelas oportunidades de participação dos cidadãos nas políticas públicas por meio
das tecnologias da informação e comunicação (TICs)”. Dessa maneira, as mudanças e avanços
tecnológicos que vêm ocorrendo ao longo dos últimos anos estão permitindo que novos espaços
sejam criados e que cidadãos de variados locais do globo possam se interconectar a fim de
promover discussões e trocas de informações e opiniões, ampliando o campo do debate público,
inclusive.
Para Smith (2009), a e-Democracia seria uma inovação democrática tal qual as demais
instituições como Conferências ou Orçamentos Participativos, uma vez que todas são
instituições que foram criadas para majorar e aprofundar a participação do cidadão no processo
de tomada de decisões políticas. Salienta-se que, segundo Kneuer (2016), a e-Democracia não
seria um tipo de democracia diferente e/ou futura, isto é, para a autora, está se caracterizaria
pelo uso das TICs por atores políticos dentro dos processos políticos e de governança no
contexto da democracia representativa atual.
Todavia, é importante destacar que as mídias digitais podem também apresentar
aspectos negativos. Isso porque, ainda que haja o avanço da tecnologia e o fortalecimento das
mídias sociais, não é possível ignorar que há problemas que podem “[…] comprometer o
desenvolvimento de um modelo democrático fulcrado no virtual” (KOZIKOSKI JÚNIOR,
2015, p. 104). Citem-se como exemplos as chamadas fakes news, os spams, os hackers, a
ciberguerra, dentre outros.
Ademais, como bem pontuou Kozikoski Júnior (2015, p. 129), há um problema
estrutural no Brasil que também pode inviabilizar a utilização de um modelo de democracia
virtual: o elevado número de pessoas que ainda vivem sem condições mínimas de sobrevivência
e, por óbvio, sem acesso à internet. Para além deste aspecto, há também a questão do nível de
engajamento e participação daqueles cidadãos que têm acesso à rede mundial de computadores.
Por isso, é essencial ter cautela na utilização de mídias digitais, a fim de evitar que a
Democracia seja desvirtuada e acabe apenas representando os interesses de determinada classe
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ou grupo de pessoas. É importante que sujeitos com convicções diversas se conectem e
debatam, evitando assim a retroalimentação das mesmas opiniões. Logo, percebe-se que, com
o desenvolvimento das Tecnologias de Informação e Comunicação, a sociedade experimentou
e vem experimentando diversas modificações, seja no modo de encarar a realidade ou na
maneira de se comportar no debate público. As fronteiras interpessoais cada vez mais vêm se
estreitando. Há um fenômeno de criação de uma arena nova de diálogo.
E essas transformações ocorridas na sociedade em razão da ascensão das novas
tecnologias e da popularização de redes sociais também refletem nas discussões políticas. A
internet pode proporcionar, assim, uma participação mais ativa da população, uma vez que o
sujeito poderia deixar de ser mero telespectador, como ocorre nas mídias televisivas ou
impressas, e passar a ser protagonista. Seja como for, a e-Democracia se coloca como um
instrumento de ampliação da participação da sociedade na tomada de decisões políticas e, no
contexto das políticas públicas, a participação popular é item imprescindível em todo o processo
de políticas públicas.
Após a apresentação da metodologia, o presente artigo passará a estudar o caso da XIII
Conferência Municipal de Assistência Social de São José, estado de Santa Catarina, que ocorreu
no ano de 2021 de maneira remota, a fim de mapear a participação da sociedade via plataforma
digital, verificando os efeitos da e-Democracia para as políticas públicas.
3 METODOLOGIA
O método empregado na construção das principais ideias textuais foi o dedutivo e, para
tanto, pautou-se em pesquisa bibliográfica e estudo de caso para alcançar o resultado final.
Assim, a pesquisa se valeu de uma abordagem qualitativa do problema, uma vez que estudou
os aspectos subjetivos de fenômenos sociais, cujo tema não pode ser quantificado em equações
ou estatísticas.
Segundo Minayo (2000), quando se trata de uma pesquisa social, a qual objetiva analisar
mais especificamente a realidade do ambiente pesquisado, o aprofundamento da pesquisa não
pode se basear apenas nos aspectos quantitativos. É de suma importância reconhecer a sua
subjetividade, o que não é possível quando se utilizam apenas instrumentos padronizados, os
quais são característicos de pesquisas quantitativas.
De acordo com Strauss e Corbin (2008), no contexto de uma pesquisa qualitativa, é
essencial estabelecer etapas para realizar o planejamento investigativo. Dessa maneira, esta
pesquisa foi dividida nos seguintes estágios: exploratória e análise ou tratamento do material.
A fase exploratória, segundo Minayo (2000), refere-se ao planejamento e ao processo
de investigação da pesquisa. Nesse estudo, essa fase foi composta pelo levantamento
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bibliográfico de autores relacionados ao objeto de estudo, com a finalidade de construir o
referencial teórico. Além disso, houve uma fase de pesquisa documental, por meio da qual,
primeiramente, verificou-se quais Conferências de políticas públicas ocorreram de maneira
virtual durante a pandemia do COVID-19 (entre 2020 e 2022) para, então, examinar quais delas
divulgaram o Relatório Final, com dados acerca da participação da sociedade civil.
Na segunda fase da pesquisa, análise dos dados ou tratamento do material, foi
examinado o Relatório Final da Conferência de políticas públicas selecionado, com vistas a
mapear a participação da sociedade ocorrida por meio de plataforma digital e verificar os efeitos
da e-Democracia para a participação. Diante desses critérios de seleção foi analisada a XIII
Conferência Municipal de Assistência Social de São José, estado de Santa Catarina, que ocorreu
no ano de 2021 de maneira remota.
Deve-se ressaltar, por fim, que a metodologia qualitativa também pressupõe uma análise
de conteúdo. Isso porque, “[…] o termo significa mais do que um procedimento técnico. Faz
parte de uma histórica busca teórica e prática no campo das investigações” (MINAYO, 2000,
p. 36). Logo, a análise de conteúdo é essencial, uma vez que examina a relevância dos dados
coletados, por meio de sua interpretação e análise com vistas ao objeto da pesquisa.
4 ANÁLISE E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS
Conforme explicitado, a utilização de tecnologias digitais tem o potencial de aumentar
as oportunidades de participação da sociedade em questões públicas mediante portais e
aplicativos da internet. Nesse sentido, o município de São José, estado de Santa Catarina, seguiu
os aconselhamentos do Conselho Nacional de Assistência Social (CNAS), que orientou os
municípios em relação à possibilidade de realização das Conferências em formato diferenciado
do presencial, diante da crise sanitária decorrente da pandemia do COVID-19.
As singularidades trazidas com a pandemia acarretaram a necessidade de utilização das
tecnologias para diversos ramos da vida, seja no trabalho, na convivência social e, até mesmo,
no contexto de Conferências de políticas públicas. Sendo assim, no contexto das políticas
públicas, os conselhos gestores precisaram buscar ferramentas que respeitassem as medidas
sanitárias impostas para a contenção do coronavírus e, ao mesmo tempo, garantissem a validade
de todo o processo de debate em torno das políticas públicas.
Assim, o Conselho Municipal de Assistência Social de São José/SC convocou, em 11
de maio de 2021, a XIII Conferência Municipal de Assistência Social com vistas à realização
do mais significativo evento na área de controle social do município. A Conferência foi
realizada com o suporte de plataformas digitais e de forma on-line, mas sem se abster do
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compromisso com o debate democrático, ainda que dificuldades e adversidades existissem no
formato em questão.
A XIII Conferência, assim, ocorreu durante cinco dias – 12, 13, 16, 17 e 18 de agosto
de 2021 –, no horário das 14h às 16h, em formato integralmente virtual, disponibilizado aos
participantes por meio da plataforma ZOOM em parceria com a Associação de Municípios da
Grande Florianópolis (GRANFPOLIS). Contudo, em momento ulterior, foram realizadas Pré-
Conferências Municipais “[…] com a finalidade de impulsionar a discussão acerca do tema
central e dos cinco eixos temáticos indicados pelo Conselho Nacional de Assistência Social
para o ciclo conferencial de 2021” (CMAS, 2021, p. 10). Nesse sentido, o tema central foi:
“Assistência Social: Direito do Povo e Dever do Estado, com financiamento público, para
enfrentar as desigualdades e garantir proteção social”, tendo sido identificados 5 eixos
temáticos:
Eixo 1 – A proteção social não-contributiva e o princípio da equidade como paradigma
para a gestão dos direitos socioassistenciais no enfrentamento das desigualdades.
Eixo 2 – Financiamento e orçamento como instrumento para uma gestão de
compromissos e corresponsabilidades dos entes federativos para a garantia dos
direitos socioassistenciais.
Eixo 3 – Controle social: o lugar da sociedade civil no SUAS e a importância da
participação dos usuários.
Eixo 4 – Gestão e acesso às seguranças socioassistenciais e a articulação entre serviços,
benefícios e transferência de renda como garantias de direitos socioassistenciais e
proteção social.
Eixo 5 – Atuação do SUAS em Situações de Calamidade Pública e Emergências
(CMAS, 2021, p. 10).
Analisando os dados referentes à participação da população na Conferência, verificou-
se que “[...] 232 inscrições foram recebidas por meio de formulários da plataforma Google,
também disponibilizados online” (CMAS, 2021, p. 26). Em relação aos segmentos participantes,
destaca-se que 23 inscritos foram usuários; 136 trabalhadores; 28 faziam parte do segmento
entidades; 14 foram governamentais; e 31 eram pertencentes à categoria
convidados/observadores/outros (CMAS, 2021, p. 27).
No primeiro dia da Conferência, 12 de agosto de 2021, foi realizada a abertura do evento.
Após, houve a apresentação, discussão e aprovação do Regimento Interno da XIII Conferência.
No dia 13 de agosto de 2021, foi realizada uma exposição sobre a realidade do Sistema Único
de Assistência Social de São José/SC.
Nos dias 16 e 17 de agosto de 2021 foram realizados debates quanto aos cinco eixos
temáticos da Conferência, simultaneamente em salas específicas para essa finalidade,
totalizando 5 grupos de discussão. No último dia do evento, 18 de agosto de 2021, ocorreu a
Plenária Final, a qual foi aberta a todos os participantes do evento, com caráter eminentemente
deliberativo e com a finalidade de deliberar as propostas sistematizadas pelos grupos temáticos,
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bem como eleger os Delegados para participar da 13ª Conferência Estadual de Assistência
Social (CMAS, 2021, p. 30). Diversas foram as deliberações e resultados de cada eixo temático
da Conferência, como, por exemplo, a necessidade de implantação do “cartão cidadania”
(cartão social) e a constituição do serviço de proteção em situações de calamidades públicas e
de emergências.
Importante salientar que houve também um processo de avaliação do evento por
intermédio de formulários específicos (GoogleForms) em ambiente virtual para que os
Conselheiros Municipais e os participantes pudessem avaliar a XIII Conferência. A aludida
avaliação visou apreciar, por meio dos critérios: ótimo, muito bom, regular, ruim e péssimo, os
seguintes aspectos:
- Mobilização e Preparação: Atividades previamente realizadas para obter uma
participação maior, mais representativa e mais qualificada na Conferência Municipal;
- Local e infraestrutura: Espaço físico ou virtual e logística da organização da
Conferência Municipal;
- Acessibilidade: Adequação do espaço físico ou virtual, tecnologias assistivas,
intérprete de libras, equipe de apoio e demais condições para a participação das
pessoas com deficiência;
- Programação: Atividades e horários previstos para a Conferência Municipal;
- Participação: Envolvimento ativo dos delegados e demais presentes nas atividades
realizadas, debates e na tomada de decisões da Conferência Municipal (CMAS, 2021,
p. 38).
O Relatório Final da XIII Conferência indicou que “[…] 104 participantes e 18
conselheiros municipais preencheram e enviaram os formulários à Comissão Organizadora”
(2021, p. 38). Partindo dessas participações, foi possível depreender diversos dados referentes
à Conferência. Em relação aos dados atinentes à participação e utilização das plataformas
digitais, é importante destacar alguns números. Inicialmente, no que se refere à mobilização e
participação, 85% dos participantes consideraram “ótimo” ou “bom” o processo de iniciativas
previamente realizadas pelo Conselho Municipal para obter maior engajamento no evento,
sendo que apenas 1% considerou o processo “ruim” (CMAS, 2021, p. 39).
Referente ao local e infraestrutura, há indicação de que a Conferência ocorreu
integralmente digital e sem óbices, com espaço virtual resguardado e estável. Inclusive, 84%
dos participantes avaliaram o local e infraestrutura como “muito bom” ou “ótimo” (CMAS,
2021, p. 40).
No que tange à qualidade de transmissão da Conferência, importante destacar que “[…]
a qualidade da transmissão da XIII Conferência Municipal foi largamente reconhecida por cerca
de 78% dos participantes, projetando a possibilidade dessas estratégias para outras ações no
âmbito do controle social” (CMAS, 2021, p. 40).
Em relação à acessibilidade física, arquitetônica e tecnológica, verifica-se a necessidade
de “[…] investimento em tecnologias assistivas, intérpretes de libras, equipe de apoio e demais
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condições para a participação das pessoas com deficiência” (CMAS, 2021, p. 40). Concernente
aos dados referentes à participação, “[…] a avaliação aponta para um movimento percebido
como ótimo e muito bom por 85% dos participantes, o que surpreende tendo em vista a grande
novidade que foi a realização da Conferência de forma online integralmente” (CMAS, 2021, p.
42).
Dessa maneira, é possível depreender que, de maneira geral, a Conferência apresentou
dados positivos em relação à participação, mesmo esta tendo ocorrido de maneira virtual. Além
disso, o próprio relatório da XIII Conferência concluiu que:
[...] o debate realizado no processo de mobilização e na 13ª. Conferência Municipal
de São José dilatou a análise fazendo com que gestores, usuários/as, trabalhadores/as,
entidades, e todos os envolvidos na área, posicionassem o foco nos promissores
projetos de justiça social e nos necessários traçados de futuro aonde se garanta o
direito socioassistencial, divisando o acerto de rumos, considerando os novos desafios
do presente, dentre os tantos que já existem para consolidar o SUAS em São José, no
estado de Santa Catarina e no Brasil (CMAS, 2021, p. 44).
Em suma, examinando a dinâmica da XIII Conferência de Assistência Social de São
José/SC foi possível perceber que a utilização das plataformas digitais, de maneira geral, não
impactou negativamente a ocorrência do evento, pelo contrário, foi um instrumento que
proporcionou a participação da sociedade nas decisões sobre políticas públicas em um contexto
marcado por uma crise sanitária que impossibilitou os encontros presenciais entre as pessoas.
Contudo, é sabido que a e-Democracia necessita de um maior aperfeiçoamento para que possa
cada vez mais superar obstáculos, como, por exemplo, a inclusão digital.
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
A teoria das Inovações Democráticas de Graham Smith foi elencada como fio condutor
teórico e metodológico para a compreensão e análise da XIII Conferência de Assistência Social
de São José, estado de Santa Catarina. Selecionou-se tal modelo de análise tendo em vista que
sua construção teórica prevê que as instituições foram criadas para majorar e aprofundar a
participação do cidadão no processo de tomada de decisões políticas, representando um
afastamento da arquitetura institucional tradicional e, como o objeto de exame deste artigo é
uma conferência de políticas públicas, é importante compreender os fundamentos teóricos de
instituições participativas.
Ao retomar o objetivo geral da presente pesquisa – o qual se refere à investigação da
utilização de plataformas digitais para a participação popular nas políticas públicas – é possível
aferir que os mecanismos digitais podem auxiliar na participação da sociedade nas políticas
públicas.
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Contudo, não se ignora que, em alguns casos, a utilização de mecanismos digitais pode
implicar em problemas caso sirva de instrumento de mobilização alternativa para específicos
grupos, que se tornam mais capazes de agir do que outros e acabam obtendo o poder. Além de
que, pode também, propiciar a mobilização por mudanças em prol do bem-comum, sendo
empregada como um instrumento de manipulação. Ademais, sabe-se que a e-Democracia,
especialmente no Brasil, ainda é prematura e carece de amadurecimento. Até mesmo porque
apenas um pouco mais da metade da população tem acesso à internet no país, o que é essencial
para que a participação, por intermédio de mecanismos digitais, ocorra.
No caso da utilização de plataformas digitais para a participação da sociedade civil em
uma conferência de políticas públicas é possível ocorrer circunstâncias, por exemplo, em que
pessoas com necessidades especiais tenham a sua participação prejudicada ante ao fato de ser
na modalidade virtual. Sendo assim, diante das especificidades da utilização de plataformas
digitais – especialmente àquelas relacionadas à forma de acesso e manifestação, bem como à
utilização de um novo formato de conferência em um ambiente desconhecido para a maior parte
dos sujeitos participantes – é de extrema necessidade elaborar estratégias para que a
acessibilidade e o engajamento nas discussões apresentem bons resultados.
No caso em apreço, referente à experiência da XIII Conferência de Assistência Social
de São José/SC, ainda que o relatório final não tenha indicado, concluiu-se que, em relação à
acessibilidade, é preciso que haja investimentos em tecnologias assistivas, além de intérpretes
de libras, equipe de apoio, dentre outras medidas inclusivas.
Ainda, é importante destacar que a presente pesquisa se deparou com algumas
dificuldades, especialmente no tocante ao acesso aos relatórios finais da Conferência, porém,
espera-se que no futuro próximo o acesso às informações seja facilitado e seja possível
examinar a dinâmica de mais conferências de políticas públicas.
De todo modo, a e-Democracia pode ser um instrumento de auxílio na participação da
população quando o assunto é políticas públicas e a experiência da Conferência do Município
de São José/SC demonstrou que é possível se valer do meio virtual. Todavia, é importante
prosseguir com estudos nessa área temática, especialmente comparando os resultados e a
participação da sociedade em Conferências presenciais e virtuais. Somente assim será possível
ter parâmetros mais concretos no que diz respeito à participação da sociedade civil.
REFERÊNCIAS
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