O NOVO MARCO DO SANEAMENTO BÁSICO E AS EMPRESAS ESTATAIS1
THE NEW BASIC SANITATION FRAMEWORK AND STATE COMPANIES
RAMOS JOÃO SACAIA FERNANDO
Universidade Federal do Paraná (UFPR)
E-mail: ramos.sacaia@ufpr.br
RESUMO
Objetiva-se com artigo discutir as questões inerentes ao Saneamento Básico no Brasil, a qual
serve como ponte fundamental que direciona e delimita às garantias das infraestruturas públicas e
privadas a nível nacional a partir da Lei Federal nº11.445/2007 e da Lei Federal nº 14.026/2020,
os quais se caracterizam como instrumento normativo inerente às questões do saneamento. Trata-
se numa metodologia qualitativa, analisando referenciais bibliográficas e documentos. A discussão
teve como base o processo histórico de industrialização no Brasil e o processo de implementação
das obrigações descritas na normativa que regulamenta e delimitam as ações do saneamento
básico no Brasil, bem como, a apreciação (posicionamento) entre os Estados, Municípios e o
Governo Federal. Os resultados indicaram que se espera, até março de 2033, que 99% da
população tenha água potável e que 90% da população tenha coleta e tratamento de esgoto, os
quais compões o tripé do Saneamento Básico no contexto brasileiro.
Palavras-chave: Saneamento, Política, Governo, Industrialização, Serviços Públicos.
ABSTRACT
The aim of this article is to discuss the issues inherent to Basic Sanitation in Brazil, which serves
as a fundamental bridge that directs and delimits the guarantees of public and private
infrastructures at the national level based on Federal Law nº 11,445/2007 and Federal Law nº
14,026/2020, which are characterized as a normative instrument inherent to sanitation issues. This
is a qualitative methodology, analyzing bibliographical references and documents. The discussion
was based on the historical process of industrialization in Brazil and the process of implementing
the obligations described in the rules that regulate and delimit basic sanitation actions in Brazil, as
well as the appreciation (positioning) between the States, Municipalities and the Federal
Government. The results indicated that it is expected, by March 2033, that 99% of the population
will have drinking water and 90% of the population will have sewage collection and treatment,
which make up the tripod of Basic Sanitation in the brazilian context.
Keywords: Sanitation, Politics, Government, Industrialization, Public Services.
1 DOI: https://doi.org/10.5935/2763-9673.20230006
Revista de Estudos em Organizações e Controladoria-REOC, ISSN 2763-9673, UNICENTRO, Irati-PR, v. 3, n. 2, p. 07-31,
jul./dez., 2023.
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1. INTRODUÇÃO
Neste artigo, apresentam-se e discutem-se as medidas regulatórias
transitórias adotadas pelo governo brasileiro em resposta à emergência causada
pelo COVID-19 e inferindo o novo marco do saneamento básico, onde estes, são
produtos da declaração de estado (constituem respostas diretas à declaração do
estado de emergência, evidenciando a dinâmica interconectada entre a crise
sanitária e as mudanças regulatórias no setor de saneamento básico no
Brasil). Essas medidas, úteis em um momento tanto no período de pandemia
quanto pós, podem ser vistas como uma oportunidade para analisar a política de
subsídios, em relação aos Serviços Públicos Domiciliares (SPD) de água potável
e saneamento básico no contexto brasileiro.
Essa política, em vigor no país, favorece, especificamente, os usuários de
menor renda. No Brasil, as políticas de apoio aos serviços públicos domiciliares
(SPD) variam dependendo das especificidades do setor e dos serviços. Em geral,
estes subsídios são implementados para garantir a disponibilidade de serviços
essenciais, como água, eletricidade, abastecimento básico de água e gás,
especialmente para a população pobre. O governo em diferentes níveis (federal,
estadual e municipal) é responsável por programas sociais que fornecem apoio
direto ou indireto às pessoas pobres, incluindo taxas sociais ou descontos nas
contas de água, eletricidade e gás que moderam os encargos financeiros.
Os Órgãos reguladores como a Agência Nacional de Energia Elétrica
(ANEEL) e a Agência Nacional de Águas (ANA) desempenham um papel
fundamental na definição de políticas de subsídios e na regulação dos serviços
públicos domésticos, estabelecendo critérios e monitorando a qualidade dos
serviços. Além disso, o governo pode implementar programas universais para
garantir o acesso a serviços básicos em áreas historicamente negligenciadas,
muitas vezes acompanhados de subsídios para promover o investimento nessas
áreas. Em alguns casos, são criadas Parcerias Público-Privadas (PPP) para
fornecer subsídios ou incentivos fiscais para atrair o sector privado e garantir a
viabilidade econômica. Os reguladores realizam verificações regulares dos preços
da eletricidade e ajustam as tarifas dos serviços públicos com base nos custos
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operacionais, nos investimentos necessários e na necessidade de apoiar
determinados grupos. É importante notar que as políticas de apoio podem mudar
ao longo do tempo devido há mudanças econômicas ou sociais ou a eventos
como crises ou crises sanitárias (como a pandemia de COVID-19).
Com isso em mente, o objetivo deste artigo é analisar as medidas
transitórias que o governo nacional tomou em relação ao SPD, especificamente,
as de água potável e saneamento básico. Para isso, é necessário fazer uma
revisão geral desde o Plano Nacional de Saneamento (Planasa), instrumento
regulamentador da década de 1970 até 2022. Esta visão histórica fornecerá uma
compreensão mais profunda do desenvolvimento das políticas e práticas de
saneamento básico do Brasil e fornece contexto para as medidas de transição
adotadas para necessidades emergenciais, especialmente serviços críticos de
água e saneamento. Olhando para as raízes e o desenvolvimento histórico destas
iniciativas regulatórias, será possível identificar padrões, desafios enfrentados ao
longo do tempo e o impacto destas medidas na estrutura e qualidade dos serviços
oferecidos à população.
Importa realçar que não se aprofundam as motivações e a
constitucionalidade da medida, que, em algumas ocasiões em que foi invocada,
foi declarada inexequível por aspectos formais pela Câmara dos Deputados
(BRASIL, 2021). Onde se nota que, uma subcomissão de deputados vai
acompanhar a regulamentação e a implementação do novo marco legal do
saneamento básico da Lei n.11.445,2007 e da Lei 14.026/20, em vigor desde
julho do ano passado. Ambas as leis trazem um conjunto de normas gerais com a
meta de garantir que 99% da população tenha acesso à água potável e 90%
disponha de coleta e tratamento de esgoto até 2033 (AGÊNCIA CÂMARA DE
NOTÍCIAS, BRASIL, 2021).
No entanto, o alcance de cada disposição e, de forma preditiva, fazemos
propostas a serem incluídas quando o “novo normal” for assumido, como se
acredita que venha ocorrer após a crise global de COVID-19.
Diante da problemática em questão, o leitor terá maior noção quanto as
mudanças nas sete leis que regiam o setor de saneamento básico no Brasil. Em
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seguida, é feita uma reflexão sobre os setores afetados pelas medidas
emergenciais, bem como, os desafios para o setor rural e os usuários do setor
industrial e comercial. Tendo como foco, as empresas estatais, devido a sua
atuação maior nas questões de água e saneamento básico a nível nacional.
A pesquisa em questão será conduzida de maneira detalhada, adotando
uma abordagem descritiva que envolverá a realização de um levantamento de
dados, com uma explanação clara dos motivos para a coleta desses dados. Em
relação à natureza do estudo, será empregado o método qualitativo, visando
investigar a inter-relação entre a realidade e o objeto de estudo. O objetivo é obter
diversas interpretações por meio de uma análise indutiva por parte do
pesquisador, buscando uma compreensão aprofundada dos fenômenos em
relação a água e saneamento básico no Brasil entre 1970 até 2022.
A pesquisa qualitativa, neste contexto, permitirá não apenas a
identificação de padrões e tendências, mas também uma compreensão mais
profunda das complexidades envolvidas em um problema específico. Será
realizada uma minuciosa observação durante o levantamento de dados, com a
devida justificativa para cada conjunto de informações coletadas. Este processo
descritivo não apenas evidenciará a complexidade inerente ao problema em
análise, mas também será crucial para compreender e classificar os processos
dinâmicos vivenciados nos grupos estudados.
O estudo tem fundamentos no método qualitativo inferindo sobre dados
bibliográficos e documentais a partir dos seguintes autores Silveira (2018; 2020),
Ximenes e Silveira (2019), Cury e Ferreira (2009) e Paxe (2017), baseia-se no
objetivo de explicar o alcance das medidas regulatórias em água potável e
saneamento, emitidas pelo governo brasileiro no âmbito da emergência
econômica, social e ecológica, derivada da pandemia de COVID-19. É uma
metodologia explicativa documental que se baseia nas disposições
regulamentares emitidas pelo Governo Brasileiro em 2020, para enfrentar e
responder aos desafios neste tempo nas esferas social e institucional do Brasil.
Este artigo está estruturado da seguinte forma: a parte introdutória, onde
se apresenta os objetivos deste artigo, assim como se discute a importância da
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política de subsídios para os serviços públicos domiciliares (SPD) de água potável
e saneamento básico no contexto brasileiro. No segundo capítulo, destaca-se o
processo de industrialização no Brasil e seu impacto no setor de saneamento
básico e o crescimento da industrialização e do setor de serviços na década de
1950, onde as principais cidades brasileiras viram um desenvolvimento urbano
sem precedentes e um crescimento populacional considerável. Em seguida,
aborda-se o acesso ao Saneamento Básico a partir da Lei Federal nº 11.445/2007
e da Lei Federal nº 14.026/2020, bem como o marco regulatório do Planasa, o
Projeto nacional de abastecimento de água e a agenda do governo brasileiro.
Culminando com a discussão a respeito das medidas regulatórias transitórias
adotadas pelo governo brasileiro em resposta à emergência causada pelo
COVID-19.
2. INDUSTRIALIZAÇÃO NO BRASIL E O SANEAMENTO BÁSICO
A centralização político-administrativa introduzida pelo regime autoritário
em 1930 viabilizou um período de grande industrialização no Brasil, que o Estado
direcionou para a produção de bens de capital. Nas décadas seguintes, grupos
estatais brasileiros uniram forças com o capital internacional, direcionando o
desenvolvimento industrial do Brasil para a produção de bens duráveis e o setor
de serviços. Com isso, a economia tornou-se cada vez mais dependente do
capital estrangeiro, o que se traduziu na importação de tecnologia (máquinas e
equipamentos) pelas empresas brasileiras e na remessa dos lucros auferidos
pelas empresas estrangeiras para seus países de origem. Essa nova organização
do capital no Brasil fez com que crescessem as influências estrangeiras em sua
política doméstica, especialmente no contexto da Guerra Fria (SKIDMORE,
1988).2
2 A introdução da centralização político-administrativa pelo regime autoritário em 1930 abriu
caminho para um notável processo de industrialização no Brasil, orientado pelo Estado para a
produção de bens de capital. Ao longo das décadas subsequentes, grupos estatais brasileiros
aliaram-se ao capital internacional, direcionando o desenvolvimento industrial do país para os
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Com o crescimento da industrialização e do setor de serviços na década
de 1950, as principais cidades brasileiras vivenciaram um desenvolvimento
urbano sem precedentes e um crescimento populacional considerável. No
entanto, "[...] não foram realizados os investimentos necessários em infraestrutura
para acompanhar esse crescimento. Em meados da década de 1950, quase 80%
dos municípios brasileiros ainda não dispunham de abastecimento regular de
água" (COSTA, 1994, p. 59). Muitos não tinham capacidade para implantar essa
infraestrutura ou mesmo para operá-la uma vez instalada, o que significou a
intervenção das respectivas autoridades estaduais ou federais dos serviços em
uma multiplicidade de configurações locais e regionais marcadas por ampla
fragmentação institucional e arranjos de financiamento confusos.
Os serviços sob gestão estadual abasteciam 37% da população com
água, embora 54% estivesse sob hegemonia municipal. Havia mais 17
entes federados responsáveis pela operação e gestão dos sistemas de
água e esgoto em diferentes municípios, que, sem os recursos técnicos
e financeiros necessários, não conseguiam administrar ou manter esses
serviços básicos para a população local (COSTA, 1998, p. 59-60).
Diante de uma iminente crise de saneamento nas principais cidades
brasileiras, o acesso à água encanada e aos serviços de esgotamento sanitário
tornou-se um tema quente na agenda pública na década de 1960, tal como
afirmam (HELLER, 2022; THEODORO, 2019).
setores de bens duráveis e serviços. Nesse cenário, a economia brasileira tornou-se
progressivamente dependente do capital estrangeiro, caracterizada pela importação de tecnologia,
como máquinas e equipamentos, por empresas nacionais e pela repatriação dos lucros das
empresas estrangeiras para suas nações de origem. Essa reorganização do capital no Brasil
resultou no aumento das influências estrangeiras na política doméstica, notadamente no contexto
da Guerra Fria (SKIDMORE, 1988).
Durante esse período, as análises de Skidmore e outros estudiosos destacam como a dinâmica da
Guerra Fria desempenhou um papel significativo nas relações internacionais do Brasil. A
intensificação das influências estrangeiras na política interna, particularmente oriundas dos
Estados Unidos, pode ser interpretada à luz das complexidades geopolíticas desse período,
conforme observado por Skidmore (1988) e outros pesquisadores. Assim, o processo de
industrialização no Brasil transcendeu sua dimensão econômica, revelando-se intricadamente
conectado às dinâmicas geopolíticas da Guerra Fria e moldando a interação política e econômica
do país durante essa época.
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Nesse momento, o Brasil passava por um momento crítico internamente,
pois as reformas estruturais propostas pelo presidente João Goulart contrariavam
os interesses centrais dos grupos empresariais estrangeiros envolvidos na
economia do país. Estes, em conjunto com setores conservadores da sociedade
brasileira, abriram caminho para um novo golpe militar, derrubando Goulart em
1964 e provocando o início de uma ditadura militar que duraria mais de duas
décadas indo até meados da década de 1980.
Com a ascensão do regime militar e a repressão política a ele associada,
o Ministério da Saúde viu-se despojado de sua capacidade de galvanizar respaldo
político para as prioridades que pretendia estabelecer para o setor ou de articular
suas próprias ações com as medidas de saneamento público. A adoção gradativa
de uma concepção baseada na natureza individual da doença abriu caminho para
que a saúde fosse priorizada na saúde pública, enquanto o saneamento foi
relegado ao setor de construção e habitação, tradicionalmente ligado à
construção civil. Com essa dissociação, poderiam ser consideradas formas mais
autônomas de prestação e gestão dos serviços de saneamento, com base em sua
sustentabilidade econômico-financeira. Esse processo culminou na criação do
Plano Nacional de Saneamento, que, a partir de 1971, tornou-se a principal
política pública para o setor, tal como afirmam Silveira, Heller e Rezende (2013).
Durante o governo autoritário, as políticas públicas foram delineadas para
limitar a tomada de decisões a comunidades centralizadas de especialistas no
funcionalismo estadual, por meio do insulamento burocrático (NUNES et al.,
2010). Nesse modelo decisório, o isolamento das camadas superiores da
administração pública e do pessoal das agências visava proteger os técnicos do
núcleo estatal contra interferências políticas. Contudo, essa elite técnica, apesar
de sua suposta neutralidade, muitas vezes tinha interesses comerciais e
participava de conselhos de grandes corporações. Essa associação de interesses
resultou na formação de círculos de poder burocrático e empresarial que
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promoviam seus próprios interesses por meio do Estado, como destacado por
Dreyfuss (1981).
A presença de servidores públicos com interesses empresariais entre os
anos de 1964 a 1985 no aparato político e burocrático do Estado contribuiu muito
para permitir a criação e o desenvolvimento de um complexo estatal financeiro e
industrial integrado de produção e controle industrial. Esses executivos estaduais
garantiram às multinacionais e seus parceiros de negócios o acesso aos canais
decisórios e políticos de seu interesse, influenciando a opinião pública. Eles
utilizaram a lógica empresarial privada para enfrentar os problemas
socioeconômicos nacionais, enfatizando a importância da gestão científica, da
administração pública normativa e da formalização e padronização de funções. Ao
utilizar o planejamento como recurso estatal administrado por tecnocratas
supostamente livres de quaisquer determinações ou interesses de classe
(DREYFUSS, 1981).
A adoção de uma lógica empresarial para os recursos humanos e físicos
do país foi um dos pilares do regime pós-1964, e o Plano Nacional de
Saneamento3 foi a expressão concreta disso no setor de saneamento. Os
especialistas por trás dela sonharam com a criação de 27 empresas estatais de
propriedade mista público-privada, o que pressupunha o estabelecimento formal
3Plano Nacional de Saneamento Básico, foi elaborado em 1971, durante o governo militar. O
plano estabeleceu metas e diretrizes para a universalização dos serviços de saneamento básico
no país, e foi influenciado por uma combinação de correntes teóricas, incluindo o planejamento
estratégico, o planejamento participativo e o planejamento integrado. No entanto, entrou em
funcionamento em 1972, e foi responsável por um aumento significativo na cobertura dos serviços
de saneamento básico no Brasil. Em 1970, apenas 20% da população brasileira tinha acesso à
água tratada e apenas 10% tinha acesso ao esgotamento sanitário. Em 1990, esses números
aumentaram para 60% e 20%, respectivamente. Outrossim, plano também foi criticado por ser
excessivamente burocrático e por não prever a participação da sociedade civil no processo de
implementação. Além disso, o plano não conseguiu atingir a universalização dos serviços de
saneamento básico, que ainda é um desafio no Brasil. Em 2007, foi aprovada a Lei nº 11.445, que
instituiu a Política Nacional de Saneamento Básico. Essa lei estabeleceu novas metas para a
universalização dos serviços de saneamento básico, e previu a participação da sociedade civil no
processo de implementação. Em 2013, foi elaborado o novo Plano Nacional de Saneamento
Básico 2014-2033), que está em vigor atualmente. O Planasa 2014-2033 estabelece metas mais
ambiciosas para a universalização dos serviços de saneamento básico, e prevê a utilização de
novas tecnologias e modelos de gestão para o setor.
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de empresas comerciais com fins lucrativos. A ideia do plano era que as
empresas fossem autossuficientes, utilizando as receitas que auferiam para
financiar suas atividades, assim como descrevem os autores (as), Pacheco
(1993), Cardoso (20003), Silva (2009) e Motta (2012).
Dado que nem todos os municípios do Brasil eram economicamente
viáveis em termos de lucro, os servidores que elaboraram o Plano Nacional de
Saneamento formularam uma estrutura de financiamento baseada em um
mecanismo tarifário denominado “subsídios cruzados”. Usando esse mecanismo,
grupos de consumidores mais ricos subsidiariam a expansão de serviços para
grupos de consumidores mais pobres cobrando-lhes tarifas diferenciadas. Esse
modelo de financiamento estava, portanto, vinculado à cessão dos serviços
municipais de saneamento aos seus respectivos estados. Para viabilizar isso, a
União vinculou o acesso aos recursos federais para o setor à cessão, pelas
autoridades locais, do direito de exploração desses serviços às empresas
estaduais de saneamento. Apenas os municípios com alguma independência
fiscal conseguiram resistir à pressão do governo central (MOTTA, 2012).
"Embora o Plano Nacional de Saneamento tenha incentivado a
autossuficiência econômica e a racionalidade administrativa, uma análise da
política tarifária da época indica que as empresas estatais nunca foram
financeiramente viáveis" (COSTA, 1998, p. 61). Centralizadas e vinculadas às
normas executivas federais, as empresas estatais ficaram presas entre as tarifas
“sociais” (e não as mínimas, como concebidas pelo mecanismo de subsídio
cruzado), "mantidas em níveis extremamente baixos pelas autoridades estaduais,
e o repetido congelamento do serviço urbano como parte da estratégia do
governo federal para conter a inflação" (COSTA, 1998, p. 62).
Segundo Costa (1998), a União compensou este desequilíbrio orçamental
concedendo empréstimos e subvenções a estas empresas, permitindo-lhes
continuar as suas atividades. Mesmo assim, o Plano Nacional de Saneamento
trouxe uma melhoria substancial na cobertura do serviço no país: entre as
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décadas de 1970 e 1990, conforme Pacheco (1993), o número de domicílios
urbanos com acesso à água encanada no Brasil passou de 20,3 milhões em 1970
para 39,8 milhões em 1990. Isso representa um aumento de 92,2%.
Com a regulamentação dos serviços imposta pelo Plano Nacional de
Saneamento, as empresas estatais assumiram os altos investimentos e custos
fixos de instalação de redes de limpeza urbana, contratação e capacitação de
trabalhadores para o setor, operação e monitoramento de